13 de maio: ‘Sem afirmação de direitos’, dizem especialistas sobre Abolição da Escravatura
Por: Marcela Leiros
13 de maio de 2025
MANAUS (AM) – Apesar de tradicionalmente associada a um avanço humanitário, a Abolição da Escravatura no Brasil, em 13 de maio de 1888, não representou a real liberdade dos negros, conforme avaliam especialistas à CENARIUM. Isso porque ocorreu sem garantir direitos básicos à população negra, após mais de 300 anos de escravidão.
A abolição no Brasil ocorreu com a promulgação da Lei Áurea, ou Lei 3.353, de 13 de maio de 1888, sancionada pela princesa Isabel, que declarou extinta a escravidão em todo o território brasileiro. O País foi um dos últimos do Ocidente a abolir a escravização, conforme citou a historiadora Lilia Schwarcz, no livro “Dicionário da Escravidão e Liberdade” (2018), no qual é coautora com Flávio dos Santos Gomes.

À CENARIUM, o historiador Juarez Silva Júnior observou que a emancipação não apresentou políticas afirmativas necessárias para a população escravizada durante 350 anos. “Resultou em um ato não emancipatório, de mera abolição, sem qualquer afirmação de direitos ou reparações aos libertos. A Lei Áurea foi a lei mais curta da história brasileira, e não foi à toa“, pontuou Juarez Silva.
O estudioso acrescentou que o dia 13 de maio ainda é considerado uma data comemorativa, quando deveria ser reflexivo. “Mesmo com a popularização do 20 de novembro como ‘data negra’, muitos ainda não entenderam o porquê do esvaziamento do 13 de maio enquanto data comemorativa“, disse ele.
Para a doutora em História pela Universidade de São Paulo e professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Luciana Brito, em entrevista à Folhapress, a abolição ocorreu sem reparação, a liberdade sem renda e a migração para cidades aconteceu sem direito a casas.
“Que abolição é essa, que veio sem cidadania, sem direito à escola, sem acesso à terra e sem emprego, mas trouxe violência e criminalização das pessoas negras e de suas práticas cotidianas e culturais?”, questiona Luciana Brito.
“É claro que o 13 de maio tem um papel importante para a população negra brasileira. Foi criada uma lei oficial que acabava com a escravidão. Mas o dia seguinte deixa um legado que se arrasta até hoje para pessoas que já estão bem distantes da escravidão sob o aspecto jurídico“, diz.

Pressões externas
Apesar de tradicionalmente associada a um avanço humanitário, a Abolição da Escravatura no Brasil, em 13 de maio de 1888, foi, na prática, resultado de pressões econômicas. Por 350 anos, o Brasil teve sua economia ligada ao trabalho escravizado: exploração do Pau-Brasil, extração de ouro e pedras preciosas, cana-de-açúcar, criação de gado e plantação de café.
O professor de História Cleomar Lima, que possui 40 anos de magistério, cita duas pressões que culminaram na abolição, ambas envolvendo os ingleses. Na primeira, após a Independência do Brasil e o retorno do então príncipe regente Dom Pedro I a Portugal, a regência buscou a Inglaterra após o Banco do Brasil ter sido liquidado. Nesta ocasião, foi exigido o fim do tráfico internacional de escravizados ao País.
Depois, em decorrência da Guerra do Paraguai (1864-1870), o País buscou a Inglaterra novamente, quando recebeu novo ultimato. “Ou acaba com a escravidão, ou então não tem mais ajuda nenhuma, entendeu? Então, Dom Pedro I simulou uma doença, pediu licença do governo e colocou a mulher, a filha [Princesa Isabel], como regente. Era uma mulher, ele deu ordem para acabar com a escravidão, que ninguém iria perceber nada. E, 13 de maio de 1888, foi em um domingo, na hora que o povo ia para a missa, a princesa assinou a Lei Áurea“, explicou Cleomar Lima.
O historiador Juarez Silva Júnior acrescenta: “A abolição já vinha sendo gestada há quase quatro décadas quando ocorreu, e em grande parte por pressão econômica da Inglaterra e seus interesses de mercado. Todo um processo paulatino e cercado de resistências oligárquicas e políticas aconteceu antes do 13 de maio“.
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Exigências
Desde a Independência, em 1822, a Inglaterra vinha exigindo do governo brasileiro ações explícitas para acabar com o tráfico. Como resposta, foi aprovada, em 1831, uma lei que declarava livres os africanos desembarcados em portos brasileiros após aquele ano, mas foi desrespeitada.
Diante da desobediência do novo País independente, a Inglaterra aprovou, em 1845, a Lei Bill Aberdeen para reprimir o tráfico internacional de escravizados. O Brasil ainda resistiu por alguns anos, mas, em 1850, depois de várias ações inglesas contra navios brasileiros, foi aprovada a Lei Eusébio de Queirós, que extinguia o tráfico para o País.
Seguidas destas foram promulgadas a Lei do Ventre Livre, promulgada em 28 de setembro de 1871, que declarava livres os filhos de escravizadas nascidos a partir da sua data de aprovação, e a Lei do Sexagenário, que concedia liberdade aos escravizados com mais de 60 anos de idade no Brasil.
Todas culminaram na Lei Áurea, ou Lei 3.353, de 13 de maio de 1888, sancionada pela Princesa Isabel, que declarou extinta o escravismo em todo o território brasileiro.