A COP é nossa


Por: Alex Carvalho*

26 de fevereiro de 2025

A realização da Conferência Mundial sobre Mudanças Climáticas, a COP30, em Belém, tem sido frequentemente reduzida à preocupação sobre como acomodar 60 mil pessoas durante pouco mais de duas semanas. Para muitos, parece um desafio intransponível. Mas arrisco dizer: essa percepção só existe para quem não conhece de verdade a Amazônia. Ou melhor, para quem não conhece quem faz a Amazônia.

Estamos falando de uma região onde vivem 29 milhões de pessoas, representando uma das maiores diversidades étnicas e culturais do planeta. Aqui, convivem saberes tradicionais do extrativismo com o trabalho inovador em tecnologias. É um bioma que preserva impressionantes 88% de sua cobertura verde – um patrimônio inestimável para o Brasil e para o mundo.

O Pará, estado anfitrião da COP30, por exemplo, conta com cerca de 98% da energia gerada de fontes renováveis, sendo 97% provenientes de hidrelétricas e apenas 1,48% de origem fóssil.
No Brasil, 87% da matriz energética produzida é renovável, enquanto que a média mundial de energia renovável é de apenas 26%.

Belém foi oficializada como sede da COP30 em 2025 (Bruno Cecim/Agência Pará)

Esses números reforçam o papel do Pará como líder em sustentabilidade energética.

Nós, do setor produtivo industrial paraense, temos consciência da importância de nos inserirmos nas
discussões, demonstrar ao Brasil e ao mundo nossas boas práticas e propostas de soluções e caminhos a seguir. Reconhecemos que existem melhorias que podem e devem, pela urgência climática, ser adotadas.
Justamente por isso estamos à frente de um movimento que busca construir
uma agenda sólida e transformadora, baseada em pilares fundamentais: sociobioeconomia, transição
energética, rastreabilidade, economia circular e infraestrutura. Esse movimento, batizado de Jornada COP+, tem promovido encontros estratégicos com representantes da indústria e de diversos setores da sociedade. Desses encontros, surgem ferramentas concretas para a construção de um futuro mais sustentável, como programas, plataformas de monitoramento e pesquisas. É um legado técnico e de conhecimento que está a serviço de uma transição energética justa e do crescimento sustentável.

No entanto, o debate público sobre a COP30 tem se concentrado quase exclusivamente em um único ponto: a suposta falta de leitos para acomodar os participantes. Essa narrativa é prejudicial e desvia o foco do que realmente importa: a agenda climática. Mais do que isso, ela levanta suspeitas sobre uma tentativa deliberada de enfraquecer a primeira COP realizada no Brasil – justamente por estar sendo sediada na Amazônia.

É urgente redirecionar esse discurso e destacar os esforços em andamento para garantir a infraestrutura necessária ao evento.
Os governos Federal, Estadual e Municipal estão implementando alternativas, como o uso de navios, escolas, vilas militares e tendas climatizadas para acomodar os visitantes em Belém e em cidades circunvizinhas.
O setor hoteleiro também está ofertando novos leitos. Uma plataforma digital para gerenciar ofertas de hospedagem será lançada em breve, facilitando o planejamento e a organização logística.
O Procon já iniciou ações preventivas e educativas para garantir preços justos em hospedagens e acomodações temporárias. Haverá fiscalização rigorosa para coibir práticas abusivas, como as registradas durante os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro.

Essas medidas demonstram o compromisso das autoridades em superar os desafios logísticos. É hora de acreditar na capacidade do Pará e da Amazônia de sediar um evento dessa magnitude e de trabalhar pelo que realmente interessa: a pauta climática.

Vale lembrar que, em outras edições da COP, questões de infraestrutura também existiram, mas nunca dominaram o debate. Na COP27, realizada em Sharm El Sheikh, no Egito, por exemplo, as discussões prévias giraram em torno dos impactos das mudanças climáticas no rio Nilo. Durante o evento, faltou água e comida para todo mundo e longas filas se formaram. Durante dois dias, os participantes tiveram que tentar matar a sede com refrigerante.
E, ainda assim, o foco
permaneceu na agenda climática. Afinal, quem frequenta COP sabe que tem seus “perrengues”, como se diz.
Por que, então, a COP30 no Brasil tem sido reduzida a uma questão de hospedagem? É preciso refletir sobre isso e combater essa narrativa com informações claras e transparentes.

A realização da COP30 em Belém é também, um ato de reparação histórica. O Brasil e o mundo nos devem este momento de holofotes – para compreenderem nossos desafios e, fundamentalmente, entenderem que qualquer modelo de desenvolvimento colonialista perpetuará o desequilíbrio ambiental e socioeconômico muito presente em toda a Amazônia.
Urge ações conjuntas, soluções e avanços!
Precisamos de apoio, financiamento e atenção internacional para ações que sejam realmente capazes de transformar a realidade atual e que, realmente (de novo) atendam aos interesses da Amazônia, indo além de extensos relatórios que pouco dizem e tendo mais resultados concretos e efetivos.
É disso que queremos falar.

Vamos, definitivamente, mudar o discurso. Vai ter sim COP na Amazônia! Estamos preparados para os encontros. Podem vir!

(*)Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Pará (Fiepa). Engenheiro formado na área há 25 anos pela Universidade da Amazônia (Unama), com mestrado pela Escola Politécnica da USP na área de Infraestrutura de Transportes. Atualmente, é vice-presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), com atuação de mais de 12 anos, e vice-presidente do Conselho Temático de Infraestrutura na Confederação Nacional da Indústria (CNI). Presidiu o Sindicato da Indústria da Construção do Estado do Pará (Sinduscon) por dois mandatos consecutivos. Como vice-presidente da Fiepa, representou a entidade no Conselho de Desenvolvimento Econômico do Estado do Pará (CDE) e foi titular do Conselho Fiscal do Sesi Pará, participando ativamente de diversos fóruns de discussão e de eventos temáticos nas áreas de infraestrutura, incentivos fiscais, licenciamento ambiental e relações de trabalho, tanto na Fiepa quanto em outras entidades de classe parceiras.

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