A luta dos Warao pela sobrevivência e o reconhecimento de sua cultura no Brasil


Por: Inory Kanamari*

18 de novembro de 2025

Ka tücüna naina. Saudações, leitor(a).

Hoje, escrevo com o coração cheio de emoções e lembranças, refletindo sobre o legado e a resistência de um povo que, para mim, representa muito mais do que uma história de luta: os Warao, um patrimônio vivo da humanidade. Tive o privilégio de acompanhar de perto a trajetória desse povo indígena que, assim como tantos outros, atravessa fronteiras em busca de dignidade e sobrevivência. Nos anos de 2019 e 2021, atuei em organizações humanitárias que prestavam apoio a refugiados venezuelanos, e foi nesse contexto que conheci os Warao. Desde então, uma conexão profunda e transformadora se formou entre nós.

A advogada Inory Kanamari e indígena do povo Warao (Arcevo Pessoal)

Os Warao são um povo único, com uma língua, cultura e história que me encantaram profundamente. Suas tradições, lutas, saberes e resiliência ecoam, para mim, como um canto ancestral que reverbera até os dias de hoje. Fui tocada por cada artesanato que produziam, por cada história contada nas rodas de conversa, por sua resistência, que me lembra a minha própria experiência como indígena brasileira, muitas vezes considerada estrangeira em minha própria terra. Eu me vi nos Warao, e a dor de sua migração tornou-se, de certa forma, a minha dor também.

Inory Kanamari e criança indígena (Arcevo Pessoal)

A crise humanitária que assolou a Venezuela forçou os Warao a abandonar suas terras no delta do rio Orinoco, um lugar imerso em cultura e natureza, para buscar refúgio no Brasil. A migração de um povo indígena é sempre uma jornada de perdas e adaptações, e com os Warao não foi diferente. Eles vieram em busca de dignidade, mas se depararam com um novo ciclo de desafios: a falta de recursos, o preconceito e, sobretudo, a xenofobia que os isolava ainda mais.

Ao chegar a Roraima, encontraram portas fechadas: sem apoio adequado e sem acolhimento que respeitasse sua cultura. O Brasil, que se vangloria de ser uma terra multicultural, não tem reconhecido o valor dos Warao nem sua contribuição à diversidade humana. Eles são mais do que migrantes; são um povo com um legado riquíssimo, que precisa ser preservado e valorizado. Suas canoas, seus saberes ancestrais, suas pinturas e seus rituais pertencem à humanidade como um todo e não podem ser reduzidos a um simples “problema de refugiados”.

Indígenas Warao (Arcevo Pessoal)

O que os Warao exigem não é apenas assistência humanitária; eles exigem respeito à sua cultura e aos seus direitos, como qualquer povo indígena do mundo. E é aqui que a questão se torna mais urgente: como o Brasil está lidando com povos indígenas estrangeiros, como os Warao? A ausência de uma política pública eficaz, que considere as especificidades culturais e históricas desse povo, é alarmante.

A resposta vai além da simples assistência material. O Brasil precisa compreender que os Warao são um patrimônio da humanidade, uma expressão viva da diversidade cultural e da resistência indígena. Eles não são apenas refugiados em busca de sobrevivência; são um povo com um legado imenso, que deve ser reconhecido e valorizado. O país tem a responsabilidade de se tornar referência mundial no respeito aos direitos dos povos indígenas, sem distinção de origem, e assumir um acolhimento digno e respeitoso.

Os Warao não representam um problema, mas uma riqueza: uma oportunidade de aprendizado para todos nós. Cada canoa que produzem, cada arte que criam, é um símbolo da resistência e da continuidade de um povo que, mesmo disperso por diferentes territórios, jamais perdeu sua essência.

Convido você, leitor(a), a refletir sobre a importância dos Warao para o Brasil e para o mundo. Eles são mais do que migrantes: são um patrimônio cultural vivo, que merece ser tratado com dignidade e respeito. O que você pensa sobre isso? Deixe sua opinião nos comentários e participe desta reflexão sobre como construir um futuro mais justo para todos os povos indígenas, em qualquer lugar do mundo.

Bapo ikoni. Até a próxima pauta.

(*)Inory Kanamari é a primeira advogada indígena do povo Kanamari e uma das vozes mais relevantes na defesa dos direitos dos povos originários. Palestrante com mais de 50 apresentações no Brasil e no exterior, já integrou comissões da OAB-AM e do Conselho Federal da OAB, e atualmente é membra consultora da OAB-RJ (2025-2027). Atuou como consultora no projeto do CNJ que traduziu a Constituição Federal para a língua Nheengatu e foi professora convidada da Escola de Verão da Universidade Metropolitana de Toronto, no Canadá, em parceria com a Participedia.

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