A saga do petróleo na Foz do Amazonas e a COP 30


05 de junho de 2023
A saga do petróleo na Foz do Amazonas e a COP 30
Imagem ilustrativa da Foz do Rio Amazonas (Divulgação)
Ademir Ramos – Especial para Revista Cenarium**

MANAUS – A prospecção petrolífera na Amazônia brasileira remete-nos aos tempos históricos do Império. A Petrobras, criada pelo governo do presidente Getúlio Vargas, por meio da Mensagem n.°469, de 6 de dezembro de 1951, foi e tem sido a plataforma de consecução da Política Nacional do Petróleo, intensificando suas ações exploratórias por todo o território nacional, particularmente na Amazônia.

O indeferimento do processo da Petrobras de licenciamento ambiental da Atividade de Perfuração Marítima nos Blocos FZA-M-59, na Bacia da Foz do Amazonas, da lavra do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática (MMA), datado dia 17 de maio do ano em curso, causou “mal-estar político” entre o Ibama e a Petrobras com abalo sísmico nos Ministérios afins – MMA e De Minas e Energia (MME).

A ministra Marina Silva, do MMA, defendeu publicamente o Parecer Técnico do Ibama assinado por dez especialistas nas diversas áreas de pesquisa, bem como, o despacho do seu presidente Rodrigo Agostinho, com o seguinte esclarecimento:

Este licenciamento tramita no Ibama desde abril de 2014, tendo sido aberto inicialmente pela empresa BP Energy do Brasil Ltda., operadora original do bloco FZA-M-59. O EIA/Rima – Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental – foi protocolado em março de 2015 (…). Em julho de 2020, a BP informou ao Ibama que estaria transferindo os direitos exploratórios e a titularidade do processo de licenciamento ambiental da perfuração marítima no bloco para a Petrobras. Desde então, a Petrobras vem buscando atender aos requisitos técnicos estabelecidos pelo órgão ambiental como condição para emissão da licença de operação para a atividade.

Depois dos esclarecimentos necessários, o presidente do Ibama foi incisivo em afirmar que:

(..) Não se trata de um licenciamento ambiental trivial. Desde o planejamento da 11ª Rodada de Licitações da ANP (Agência Nacional de Petróleo) em 2013, o Ibama vem alertando sobre os riscos da exploração petrolífera nas bacias sedimentares marítimas da margem equatorial. Na conclusão do Parecer Técnico GTPEG n°01/2013, de 20 de fevereiro de 2013, consta sobre a bacia da Foz do Amazonas”.

Em síntese, a Petrobras estava devidamente ciente do alerta do Ibama e mais ainda dos 150 blocos ofertados na 11.ª rodada da Agência Nacional de Petróleo, em 2013, foram arrematados 45 e desde então, várias ações exploratórias, na forma de pesquisas sísmicas marítimas já foram licenciadas pelo Ibama. Feito as análises do Planejamento Contingenciado da Petrobras, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostino, constatou que:

(…) A proposta da Petrobras não condiz com os riscos da operação em contexto tão complexo e pouco conhecido. Mesmo nas melhores condições meteoceanográficas, o plano apresenta tempos de deslocamento de equipamentos e pessoal excessivos, tornando improvável o atendimento adequado a uma ocorrência com vazamento de óleo. Em outras palavras, o plano apresentado é inferior às práticas adotadas pela própria companhia em outras regiões do litoral – o que seria um contrassenso em uma nova fronteira com ativos ambientais de alta vulnerabilidade.

Em destaque, a confirmação da existência de um novo ecossistema sensível na região em litígio – o Grande Sistema Recifal da Amazônia (Great Amazon Reef System). Nessa circunstância, o presidente do Ibama não tergiversou quando atesta para os devidos fins, que: “A viabilidade ambiental da perfuração marítima na região se mostrou especialmente difícil em face de tantas incertezas”.

Na dúvida, o réu tem sempre razão. O que fez o Ibama julgar necessário o cumprimento da Portaria Interministerial MME-MMA – n.°198/2012 quanto à exigência da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), que cuida do processo de avaliação baseado em estudo multidisciplinar, com abrangência regional, como subsídio ao planejamento estratégico de políticas públicas. Isso tudo, a partir da análise do diagnóstico socioambiental de determinada área sedimentar e da identificação dos potenciais impactos socioambientais associados à atividade ou empreendimentos de exploração e produção de petróleo e gás natural, em cumprimento à responsabilidade socioambiental das empresas nos termos da Portaria referenciada acima.

“Estamos discutindo talvez a última grande fronteira de exploração desses minerais fósseis no Brasil (…). Eu não consigo compreender a possibilidade de não superarmos as questões meramente burocráticas. É sentar na mesa e dizer o que precisa ser feito e quais as pendências para superar a questão do licenciamento”

Trata-se do posicionamento do ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, em audiência no Senado, na Comissão de Infraestrutura, 24, contrário à decisão do Ibama, qualificando a obrigatoriedade da Portaria Interministerial como “questões meramente burocráticas”.

Com a mesma determinação, a Petrobras por meio de nota assegura que “do ponto de vista ambiental, nós estamos preparados para iniciar essa jornada seguindo todos os cuidados necessários para impactar o mínimo possível todas as características físicas, biológicas e sociais da Margem Equatorial”.

No dia 23 de maio, em reunião mediada pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, ficou acordado que o setor energético do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva respeitará o parecer técnico do Ibama. A decisão em pauta, que tem o aval da ministra Marina Silva, contraria os interesses da Petrobras e de políticos ligados aos governos estadual e federal como os senadores do Amapá, Davi Alcolumbre e Randolfe Rodrigues, este último, por sua vez, deixou o partido Rede rompendo com a ministra Marina Silva. Mas, como ouvimos nos corredores do Congresso Nacional, “quem segura esta onda é o Lula, que pode ou não virar a chave”.

Mas antes, no dia 25 de maio, a Petrobras voltou atrás e resolveu protocolar o recurso junto ao Ibama, foi o que informou o Instituto por meio de nota. Mais ainda, para selar o compromisso do governo com a defesa do Meio Ambiente e a Mudança Climática, o presidente Lula anunciou na sexta-feira, 26, que a próxima Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30) será realizada no Brasil, em novembro próximo, na cidade de Belém, capital do Pará, na Foz do Amazonas, reunindo dezenas dos maiores líderes do mundo, pesando favoravelmente em defesa dos povos tradicionais e originários inseridos no Meio Ambiente Amazônico como sujeitos de Direito.

(*) Ademir Ramos é professor, antropólogo e coordenador do Projeto Jaraqui e do Núcleo de Cultura Política do Amazonas vinculado ao Dpto. de Ciências Sociais da Ufam.

(*) Este conteúdo é de responsabilidade do autor.

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