Aliados de Bolsonaro querem atrasar instalação de CPI da Covid até decisão do STF

A existência de crime sanitário é uma das vertentes de investigação desse grupo majoritário da CPI (Adriano Machado/Reuters)

Com informações da Folhapress

BRASÍLIA – Senadores de partidos aliados ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) articulam para atrasar a instalação da CPI da Covid. A ideia é adiar as indicações dos membros do colegiado, postergando o início das investigações. Com isso, partidos da base dariam tempo para que o Palácio do Planalto tente convencer a maioria dos ministros do Supremo a não impor a abertura da CPI, cujo objetivo será apurar as ações do governo no enfrentamento do coronavírus.

“Eu, como líder do bloco Vanguarda [DEM,PL e PSC], vou defender que as indicações sejam feitas só depois da decisão do plenário. A instalação da CPI não pode ser na próxima semana, se o plenário do Supremo ainda não se manifestou”, disse o senador Wellington Fagundes (PL-MT).

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Outros partidos alinhados a Bolsonaro se declararam a favor da estratégia. Eles querem evitar o que dizem ser uma politização da CPI, que tem o poder de desgastar a imagem do governo. A expectativa é que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), faça a leitura do requerimento de abertura da CPI na terça-feira, 13, como informou o jornal Folha de S.Paulo.

O ato mostrará que a Casa está cumprindo a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que mandou na quinta-feira, 8, Pacheco instalar a comissão de inquérito. Barroso submeteu sua decisão para a análise da corte. O caso será julgado na próxima sessão virtual do Supremo, que começa em 16 de abril e vai até o dia 26 do mesmo mês. Nesse período, os magistrados deverão incluir seus votos no sistema.

Se a articulação de governistas funcionar, a CPI da Covid não deve ser efetivamente criada antes do julgamento do caso pelo plenário do STF. Governistas usariam brechas no regimento interno para postergar a CPI. Após ler o requerimento, os líderes são comunicados para a indicação de integrantes. A comissão é composta por 11 titulares e 7 suplentes. As normas não estabelecem prazo-limite para que blocos e partidos indiquem representantes.

A quantidade de membros é definida de acordo com o tamanho dos blocos partidários – e não dos partidos isoladamente. A comissão é oficialmente instalada quando tiver a maioria absoluta dos membros titulares – 6 membros. Sem prazo para as nomeações, as siglas podem usar essa lacuna e protelar a instalação.

Para destravar a investigação, partidos de oposição a Bolsonaro podem recorrer ao STF. Isso já foi adotado, por exemplo, em 2005, durante a CPI dos Bingos, quando partidos evitavam fazer as indicações. Não é a primeira vez que o STF determina a instalação de CPIs a pedido da oposição. Em 2005, o Supremo mandou instaurar a dos Bingos, em 2007, a do Apagão Aéreo, e, em 2014, a da Petrobras. Ao menos dois ministros do STF discordaram da decisão de Barroso.

Primeiramente, por ter sido monocrática – a expectativa era de que o magistrado levasse o caso direto ao plenário. Segundo, por avaliarem que o momento não é o ideal para abrir CPI e provocar conflitos entre Poderes. Apesar da resistência, há jurisprudência pacificada no Supremo para decisões como a de Barroso.

Em outra frente, o Palácio do Planalto também deu início a uma operação de efeito mais imediato contra a decisão de Barroso, mas que é considerada mais difícil por gerar desgaste político a congressistas. Interlocutores de Bolsonaro tentam convencer senadores a retirarem assinaturas do pedido de criação da CPI. Assim, o requerimento passaria a ter menos de 27 apoiadores – o mínimo exigido.

O documento hoje tem 32 nomes, entre oposicionistas e alguns que se declaram independentes ao governo. Integrantes do MDB, maior bancada do Senado, defendem a investigação. Também como parte da estratégia de barrar a CPI, o Palácio do Planalto deve alegar questões sanitárias. A Covid-19 já matou três senadores, além de funcionários dos gabinetes.

A realização de sessões virtuais – sem os encontros presenciais- inviabilizaria, por exemplo, a apreciação de documentos sigilosos, argumentam aliados. Caso a CPI seja instalada, o governo pretende mudar de estratégia. Então seria solicitado que a comissão também investigue a atuação de governadores e prefeitos no enfrentamento da pandemia, o que poderia comprometer inclusive partidos de oposição.

Com isso, a expectativa é esvaziar a atuação do colegiado, pois senadores tenderiam a proteger aliados, seja no governo federal, seja nos estaduais, seja nos municipais. O ato de Barroso, divulgado nesta quinta, inflou as tratativas para que o Senado abra uma CPI da Lava Toga, para investigar a atuação do Judiciário.

No entanto, segundo relatos de líderes e presidentes de partidos à reportagem, o cenário atualmente é que esse plano não irá prosperar. Pacheco não assumiria uma posição de enfrentamento ao Supremo. A reação do Senado que atualmente tem mais força entre governistas é o apoio a uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o alcance das decisões monocráticas do STF.

O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) ressuscitou uma proposta para que nenhum ministro do STF possa, isoladamente, suspender um ato normativo, como lei ou decreto. Isso só seria possível após apoio da maioria absoluta da corte -seis votos.

Líderes partidários contestam o quadro atual, em que um ministro pode interferir em outros Poderes. Além da determinação de Barroso em relação à CPI da Covid, eles citam a liminar, de dezembro de 2016, em que o ministro Marco Aurélio, do STF, decidiu afastar Renan Calheiros (MDB-AL) da presidência do Senado.

“Essa é uma PEC que apresentei há dois anos. Não é uma proposta por causa desse episódio [decisão sobre CPI da Covid]. Atualmente é poder demais nas mãos de uma só pessoa”, afirmou Guimarães, que protocolou o projeto nesta sexta-feira, 9.

Mesmo com pouco tempo, líderes e presidentes de partidos já declararam apoio à ideia. “Essa é uma questão que merece ser debatida e discutida”, disse o líder do PSD no Senado, Nelsinho Trad (MS). O vice-líder do governo no Senado, Carlos Viana (PSD-MG), afirmou em uma rede social ter comunicado Pacheco que irá coletar assinaturas para abrir uma investigação sobre a decisão de Barroso.

“O objetivo é o reequilíbrio institucional entre Poderes. O caminho é propor a investigação constitucional por meio de Comissão Parlamentar de Inquérito após 27 assinaturas de senadores”, escreveu Viana.

No Senado, a avaliação é que essa estratégia de retaliação ao ministro deverá ser barrada, assim como a CPI da Lava Toga. Pacheco tem perfil conciliador, argumentam lideranças partidárias.

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