Alimentação e hábitos dos povos da floresta contribuem para longevidade acima da média

Agricultor em Maués, no interior do Amazonas. (Ricardo Oliveira/ Cenarium)
Marcela Leiros – Da Cenarium

MANAUS – A alimentação baseada em produtos naturais, aliada à regulação do sono e prática de exercícios físicos como longas caminhadas, é um dos fatores que contribuem, consideravelmente, para a longevidade dos povos da floresta. Na Amazônia, os idosos, que vivem afastados dos grandes centros urbanos, longe do estresse e mais próximos de recursos da natureza, apresentam melhor qualidade de vida e chegam mais facilmente a uma idade avançada acima da média nacional.

A expectativa de vida ao nascer no Brasil, em 2019, era de 76,6 anos, segundo dados da Tábua da Mortalidade, divulgados em 2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A estimativa é 0,3 ano superior a de 2018, divulgada na pesquisa de 2018, de 76,3 anos. Mas, em algumas localidades da região, os idosos têm superado essa expectativa.

Em Maués (a 257 quilômetros de Manaus), que é conhecida como “Terra do Guaraná”, 1% da população da cidade tem mais de 80 anos, segundo o especialista em geriatria e geontologia Euler Ribeiro. Desenvolvedor do estudo “Idoso da Floresta: indicadores de longevidade e fragilidade”, a pesquisa foi realizada de 2007 a 2011 e comparou 3 mil idosos de Maués e Manaus.

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“Em Maués 1% da população está com 80 anos e mais, confirmado pelas minhas pesquisas, graças à fuga do estresse, sono mais que noutros lugares, pois não tem luz nas comunidades, dormem cedo e acordam cedo, mas dormem 10 horas por noite. Fazem muito exercício caminhando na floresta e remando e a dieta com muitos peixes, frutos da florestas e tubérculos”, destacou o médico.

O doutor em geriatria e geontologia Euler Ribeiro (Reprodução/Arquivo Pessoal)

O nutrólogo Jorge Massulo ainda contribuiu com a explicação sobre a longevidade da população. “A população longeva é mais cordata, menos estressada, mais ativa, pratica exercício físico, é alegre, mantém o peso ideal, tem uma alimentação saudável, come mais peixes, consome frutas variadas, suplementa a dieta com vitaminas e minerais, procura o médico regularmente, e, principalmente, tem paz de espírito”, destaca.

O guaraná vigora a energia, a mobilidade e a manutenção da cognição (Ricardo Oliveira/Cenarium)

Alimentação

A alimentação é um dos principais fatores que elevam a longevidade na região. No caso de Maués, o consumo de guaraná é citado por especialistas e pesquisadores de nutrição que podem impactar diretamente na qualidade de todos os habitantes. “O uso de guaraná pelos habitantes de Maués tem um percentual muito alto, espanta a energia, a mobilidade e a manutenção da cognição, mesmo em pessoas acima de 80 anos. Provavelmente esse hábito, muito antigo (pessoas declaram uso desde os 3 anos de idade), possa contribuir com a longevidade”, salientou à CENARIUM o médico nutrólogo Jorge Massulo.

Na Amazônia como um todo, o grande consumo de peixes – com baixo peso molecular – e frutas e oleaginosas, principalmente pelas populações ribeirinhas, também influencia na qualidade de vida. “O peixe é melhor do que carne porque as proteínas são de baixo peso molecular e tudo que se come é absorvido, a gordura não satura. O jaraqui, por exemplo, tem mais Ômega 3 que o salmão. Duas castanhas equivalem, em proteínas, a 150 gramas de carne bovina. O açaí tem mais óleos oligoleicos que o azeite de oliva, proteínas e vitaminas”, pontua Massulo.

Nutrólogo Jorge Massulo falou da relação dos hábitos da população de Maués com a longevidade. (Reprodução/ Arquivo Pessoal)

Qualidade de vida

A longevidade vai além dos idosos de Maués e “atinge” também povos de outras localidades do Amazonas. O aposentado Antônio Medeiros, de 90 anos, mora desde o nascimento na zona rural de Manaquiri (a 165 quilômetros de Manaus). O acesso à casa do idoso é possível apenas utilizando embarcações.

Por lá, na comunidade do Lago do Limão, a energia elétrica só chegou nos últimos anos e o idoso tem o hábito quase secular de dormir por volta das 19h e acordar às 4h.

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“Ele sempre trabalhou como agricultor e se alimentou com pescados e frutas da região. Cedo estava no trabalho e depois do almoço tinha como hábito tirar um cochilo de 40 minutos antes de pegar novamente no trabalho. Costuma comer de tudo, come peixe, verdura e frutas”, contou a filha de Antônio, Socorro Medeiros, à CENARIUM.

Em dezembro de 2020, o idoso testou positivo para Covid-19 e ficou internado em uma unidade de saúde em Manaquiri por cerca de seis dias, mas logo recebeu alta e voltou para casa. “A sua rotina de médico sempre foi regular e sem alterações, mesmo nos últimos anos tendo colocado marca-passo, a receita que o médico passava era de que deveria tomar dois litros de água por dia”, acrescentou Socorro.

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