Amazônia na COP28 em meio à crise climática: o que a região pode esperar da Conferência
17 de novembro de 2023

João Cunha – Especial para Revista Cenarium Amazônia
MANAUS (AM) – Este foi o ano em que o Rio Negro minguou. Um dos símbolos maiores da abundância e magnitude da Amazônia, o rio secou a olhos vistos, desde a Colômbia em direção ao Norte do Brasil; na altura do Porto de Manaus, o nível d´água atingiu patamares abaixo de 14 metros, os menores já registrados em 121 anos. Enquanto isso, o Solimões, outro gigante fluvial amazônico e “irmão” no encontro das águas do Negro, chegou a desaparecer em trechos da Bacia Amazônica, dando lugar a uma paisagem desértica.
Em pouco menos de três meses, a estiagem escalou para uma calamidade socioambiental, causando a mortalidade de peixes e botos e já atinge mais de 500 mil pessoas no Amazonas e estados vizinhos, com isolamento, paralisia nos negócios locais e dificuldade de acesso a serviços de saúde, educação, água e comida.

“A gente teve que desmarcar reservas e devolver dinheiro. Eu nunca tinha visto uma seca tão forte assim”, lamenta Adriana de Siqueira, gerente da Pousada Vista do Rio Negro. O empreendimento promove o turismo de base comunitária na região, mas, devido à seca, deve permanecer fechado até o final do ano.
A seca extrema e histórica na Amazônia Brasileira, potencializada pelo fenômeno do El Niño e pelo aquecimento do Oceano Atlântico, avança junto com o desmatamento desgovernado e as queimadas que, nos últimos tempos, têm coberto de fumaça o céu de lugares como a capital amazonense. No último dia 12 de outubro, Manaus foi a terceira pior cidade em qualidade do ar do mundo, de acordo com o monitoramento da World Air Quality Index (WAQI).
“Pela segunda vez, nosso povo sufoca. Dessa vez, não pela falta de oxigênio, mas por estar inalando uma fumaça que degrada a vida da população. A floresta está pegando fogo e as pessoas sofrem com as consequências dessa catástrofe”, afirmam criadores de conteúdo do Amazonas em umvídeo-manifesto lançado no início do mês.

A crise climática não é mais um cenário de médio a curto prazo no futuro do planeta, nem vive somente nas previsões de estudiosos e especialistas. Ela é uma realidade que já chegou e está entre nós, demandando urgência, atenção e esforços coletivos, e impondo a questão: o que (ainda) pode ser feito para frear ou reverter esse panorama de ebulição global?
A Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas (COP) é um dos principais fóruns de diálogo e tomada de decisões sobre os rumos da política ambiental e climática em nível internacional. A próxima edição da conferência, a COP28, começa no dia 30 de novembro em Dubai e se apresenta como mais uma oportunidade de entendimento e compromisso entre países, governos e empresas no ajuste de suas condutas, metas e modos de consumo e produção, diante de um desafio comum: a emergência climática, que ameaça a viabilidade da vida humana no planeta.

Entenda, a seguir, o que é a COP28, por que a Amazônia vai estar no centro das discussões e qual é a importância da Conferência do Clima para a região amazônica e seus povos.
O que é a COP?
A Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas é mais conhecida como COP. Essa é a sigla para Conferência das Partes (em inglês, Conference of the Parties); e as “partes” são os 198 países que integram a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (no termo original United Nations Framework Convention on Climate Change – UNFCCC).
As conferências são espaços de reuniões entre essas nações para firmar compromissos, trocar experiências e criar soluções para o clima em uma esfera global. As COPs também são espaços para incidência de movimentos socioambientais e a comunidade científica apresentar suas demandas, questões e propostas para frear o avanço das mudanças climáticas.
Criação
Realizadas desde 1995, as conferências do clima já tiveram 27 edições, com um histórico de marcos relevantes na política ambiental internacional, como o Protocolo de Kyoto (1997), que estabeleceu metas de redução para gases de efeito estufa para os países desenvolvidos, e o Acordo de Paris (2015), quando, pela primeira vez, quase todos os países do mundo envolveram-se em um esforço para reduzir as emissões de carbono e conter os efeitos do aquecimento global.

E o próximo encontro já tem local e data marcados: a COP28 ocorrerá entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro na Expo City, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
O que esperar da COP28?
A COP28 deve seguir a linha das últimas conferências, a de construção de caminhos para uma transição verde da economia em nível global, especialmente entre os países mais ricos e maiores responsáveis pelas emissões de gases poluentes na atmosfera. Confira três entre os pontos mais aguardados na edição de 2023 da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas:
Fundo de Perdas e Danos: A COP27 no Egito encerrou-se com um acordo para criar um Fundo de Perdas e Danos, destinado a países mais vulneráveis, afetados por enchentes, secas, elevação dos mares e outros desastres climáticos. Um comitê foi estabelecido para examinar como os arranjos desse fundo irão funcionar. Espera-se que decisões sobre o Fundo de Perdas e Danos sejam tomadas na COP28.
Revisão do Acordo de Paris: A primeira revisão do Acordo de Paris, que começou há dois anos na COP26 em Glasgow, será concluída na COP28. Esse processo avalia o progresso global no sentido de alcançar os objetivos de redução de emissões de gases de efeito estufa que foram negociados.

Novas metas climáticas nacionais: Em 2015, os governos nacionais concordaram na tentativa de limitar o aumento da temperatura média do planeta para menos de 1,5° C (Celsius). Contudo, um relatório recente das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas mostra que o mundo está em risco de ultrapassar esse limite. Na COP27, foi pedido que os governos revissem as metas nos seus planos climáticos nacionais até 2030. É esperado que os países voltem à mesa de negociações com estratégias mais ambiciosas em relação ao que foi apresentado em 2022.
Amazônia na COP28
A Amazônia tem uma posição central nas discussões da COP devido à influência que exerce na dinâmica global do clima; nela está a maior floresta tropical do mundo, com uma parte significativa ainda em bom estado de conservação. As florestas tropicais úmidas desempenham um papel fundamental na redução dos níveis mundiais de poluição.
O Brasil, país que possui a maior porção do bioma em sua extensão territorial, chega à COP28 em um novo momento da política externa, mais disposto a integrar-se às demais nações que formam a Pan-Amazônia e aberto a articular uma visão conjunta sobre as questões ambientais que dizem respeito à região.

A Cúpula da Amazônia, realizada no início de agosto em Belém do Pará, reuniu os presidentes da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e foi uma mostra dessa nova disposição e um retorno do protagonismo nas discussões globais sobre o clima. Belém também está em preparativos para sediar a 30ª edição da COP (COP30), em 2025, o que marca a primeira vez que uma cidade amazônica receberá uma Conferência do Clima.
Ao mesmo tempo, a Amazônia está sofrendo de forma desproporcional os efeitos do aquecimento global, causado em grande medida pela emissão de gases poluentes gerados em outras regiões. E quem paga esse preço, especialmente, são as populações amazônicas que já estavam em uma situação de vulnerabilidade social.
“Enxergamos a seca extrema no Amazonas como um exemplo de injustiça climática. Tudo isso que vem ocorrendo é particularmente cruel e injusto com os mais pobres. Ainda que todos sejam afetados, as populações mais vulneráveis são aquelas que recebem esse impacto de forma mais violenta”, afirma Virgilio Viana, superintendente-geral da FAS. “Os países ricos e a porção mais rica das nossas sociedades devem destinar recursos financeiros para esse esforço de adaptação e justiça climática”.
Da Amazônia, também podem surgir soluções para mitigar os impactos da crise climática, perspectivas e tecnologias que ensinam outras formas de viver em equilíbrio com a natureza, conciliando conservação ambiental e geração de renda. Essas alternativas amazônicas podem servir de exemplo e inspiração para o mundo, mas antes deve haver respeito, espaço e escuta atenta para os amazônidas na COP28.

“Nós temos uma cultura, temos uma história. Então não dá para banalizar o que nós somos. Nós somos muitos povos, somos indígenas, quilombolas, somos extrativistas, somos ribeirinhos, somos mulheres e homens das cidades, homens e mulheres da floresta e todo esse povo que gira nessa região mágica banhada de águas poderosas que estão secando pela sede de quem vem de fora. Então é preciso que nesse momento se olhe a sério, que se ouça o nosso povo. Ouça o ribeirinho, porque eles têm a solução”, afirmou, em entrevista recente, a artista e amazônida Fafá de Belém.
Parceria
A REDE CENARIUM AMAZÔNIA, grupo de comunicação presente em toda a Amazônia Legal, Fundação Amazônia Sustentável (FAS) e a Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (SDSN Amazônia) estarão juntas na cobertura da Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas em Dubai.
A diretora-executiva da REDE CENARIUM AMAZÔNIA, jornalista Paula Litaiff, avalia como positiva a parceria da Agência Cenarium com a FAS. Para ela, essa união vai possibilitar uma divulgação maior da Amazônia brasileira.
“Entendo que a parceria é salutar. Por meio dela vamos conseguir dar conta do volume de conteúdo relacionada à Amazônia brasileira. A COP28 vai ser uma oportunidade para Agência Cenarium mostrar a nossa cobertura de meio ambiente”, concluiu a diretora.

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(*) Com informações da FAS
Edição: Jefferson Ramos
Revisão: Gustavo Gilona