Amazônia registra pela 1ª vez variante pálida do mosquito da dengue
Por: Fred Santana
12 de outubro de 2025
MANAUS (AM) – Pela primeira vez, cientistas identificaram na Amazônia a forma pálida do mosquito transmissor de doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela, o Aedes aegypti var. queenslandensis. Até então, havia apenas um registro da variante no Brasil, em Taubaté (SP), em 2020. No cenário internacional, ela é associada a ambientes urbanos de clima quente e seco, como os encontrados na Austrália e no Mediterrâneo.
A descoberta foi feita em Macapá por uma equipe do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá (IEPA), em colaboração com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), a Secretaria Municipal de Vigilância em Saúde (SMVS) e o Laboratório de Saúde Pública do Amapá (Lacen/AP). O registro foi publicado na Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical.
As coletas ocorreram entre 19 e 24 de dezembro de 2024, quando os pesquisadores instalaram armadilhas em um fragmento florestal urbano da capital amapaense. No período, foram capturados 191 exemplares da variedade pálida do mosquito, confirmando sua presença na região.

O pesquisador José Ferreira Saraiva, autor principal do estudo, disse à CENARIUM que o mosquito se diferencia pelo padrão de escamas claras no abdômen, contrastando com a forma escura mais comum no Brasil. Segundo o pesquisador, até agora não há evidências de que a variedade transmita doenças com maior eficiência, ou seja, mais resistente a inseticidas.
Apesar disso, o registro em território amazônico gera atenção porque a variante tem características que a tornam mais resiliente em períodos quentes e secos, ampliando a possibilidade de expansão geográfica e sazonalidade.

De acordo com Saraiva, a presença do fenótipo pálido em Macapá acende um alerta para a saúde pública porque amplia a diversidade genética das populações locais de Aedes aegypti. “Como essa variedade se intercruza livremente com a forma típica, pode modificar a resiliência populacional a condições mais extremas às quais a população anterior não resistia tão bem, como altas temperaturas e baixa umidade em um contexto de mudanças climáticas”, afirma.
Ele ressalta ainda que, embora não existam evidências de maior competência vetorial ou resistência comprovada a inseticidas, é necessário avaliar sistematicamente a suscetibilidade aos produtos usados localmente e os possíveis impactos nas estratégias de controle.
“Além disso, por apresentar fenótipo mais pálido do que o habitual, há risco de subdetecção em campo, por isso, é fundamental divulgar orientações e treinar agentes de endemias para a identificação correta, garantindo diagnósticos entomológicos mais precisos e respostas rápidas”, completa.
Os cientistas levantam a hipótese de que a entrada da variedade pálida em Macapá possa estar associada ao porto de Santana, localizado a apenas 9,5 quilômetros da área de coleta. O local já havia registrado, em 2019, a entrada de outro vetor, o Aedes albopictus, hoje disseminado em toda a capital amapaense. Esse histórico reforça a importância de fortalecer a vigilância em portos, aeroportos e outros pontos estratégicos.
Para Saraiva, essa vigilância precisa ser aprimorada com ações integradas. “É recomendável implantar vigilância entomológica em portos e aeroportos, combinando monitoramento contínuo com armadilhas sensíveis ao Aedes, inspeções regulares em áreas alfandegárias e de carga e a aplicação integrada de identificação morfológica e análises moleculares, capazes de reconhecer variantes já na chegada”, afirma.
Combate a criadouros
A pesquisa também destaca a necessidade de manter a participação ativa da população. A eliminação de criadouros segue sendo o método mais eficaz para o controle do mosquito, com a recomendação de eliminar água parada ao menos uma vez por semana, além do uso de telas em portas e janelas, repelentes e roupas protetoras.

Como próximos passos, os pesquisadores preveem a realização de coletas trimestrais em Macapá e no porto de Santana, com análises genéticas para compreender a origem da variedade e como ela se integra à população já existente. O objetivo é gerar dados para apoiar o modelamento de sua presença e eventual expansão, além de orientar ajustes nas estratégias de vigilância e controle.