Ambientalistas da Amazônia divergem sobre fala de Macron a respeito de desmatamento

Presidente francês fez pronunciamento sobre produção de soja no Brasil e desmatamento florestal (Ludovic Marin/ AFP)

Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS – A declaração do presidente da França, Emmanuel Macron, em uma publicação no Twitter na última terça-feira, 12, sobre continuar dependendo da soja do Brasil “é endossar o desmatamento da Amazônia” foi tema de divergência do segmento no País. Ambientalistas conversaram com a REVISTA CENARIUM e avaliaram a “promessa” do Chefe de Estado de desenvolver uma espécie de “soja europeia” ou equivalente como forma de reduzir a destruição da região brasileira.

Para o especialista em meio ambiente, Ricardo Ninuma, engenheiro agrimensor há quase 40 anos, a produção de soja no Brasil não afeta de modo significativo o desmatamento da Amazônia. Segundo ele, a fala do presidente da França demonstra desconhecimento quanto às ocupações das plantações de soja no Brasil, sendo que a produção na Amazônia é insignificante em relação ao Sul e Centro Oeste do País.

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“O primeiro estudo quanto a áreas ocupadas pelas plantações de soja na Amazônia, ocorreu entre 2006 e 2008. De lá para cá houve um aumento de áreas de plantio, sendo que 97,5% foi em áreas já consolidadas, ou seja, áreas onde já havia intervenção humana, quer seja por plantações, pastos ou outras formas de ocupação e 2,5% foram efetivamente desmatadas ao longo destes 14 anos. Com isso os produtores estão evitando desmatamento na Amazônia, no entanto, alguns produtores adentram a áreas indígenas e unidades de conservação”, avaliou.

Para o especialista, a soja europeia não irá gerar impactos ao Brasil, pois o custo da produtividade é considerado alto e o Brasil detém a tecnologia de melhoramento genético para grande produtividade a baixo custo, comparado à Europa.

Já o ambientalista da Associação Conservação da Vida Silvestre, Carlos Durigan, afirmou à REVISTA CENARIUM que o plantio da soja, assim como a pecuária, têm sido grande motivadora para o desmatamento na Amazônia. Para ele, a expansão do cultivo da soja no Brasil já afeta significativamente vários biomas. “Assim como a Amazônia, o Cerrado também tem sido fortemente impactado pela atividade”, afirmou.

Para o cultivo da soja em grande escala, explica o ambientalista Carlos Durigan, grandes porções de terra são demandadas e assim a expansão da atividade na Amazônia acaba por transformar áreas com vegetação natural em campos de cultivo.

“Imagino que o que se fala quando se fala em ‘soja europeia’ seria busca por cultivo em áreas já impactadas, que podem estar localizadas tanto na Europa, quanto em países asiáticos ou mesmo outros continentes. Ao ter países europeus liderando a busca por alternativas de produção da soja em regiões já impactadas ou não florestadas, onde o impacto seria menor, pode haver a preferência global pelo consumo de soja destas novas frentes de produção e assim a soja produzida no Brasil seria desvalorizada no mercado mundial”, explicou.

De acordo com Durigan, muitos produtores rurais brasileiros, principalmente de grandes empresas, estão sempre expandindo suas áreas de produção, o que, para ele, é um movimento ganancioso que tem suas consequências.

“A maioria dos produtores rurais brasileiros pagam pelo malfeito de alguns. Entendo que já existe uma cultura conservacionista entre produtores e que vem se expandindo, mas ainda muitos produtores insistem em seguir pelo lado ganancioso de lucro e qualquer custo, grilando terras ou mesmo desrespeitando leis e normas de controle de uso da terra e de agrotóxicos”, disse.

“Assim, cada dia mais o agronegócio brasileiro vai ganhando imagem negativa de que se desenvolve em bases não-sustentáveis. Temos um forte desafio de mudar esta cultura vigente e fazer com que o agronegócio brasileiro se desenvolva dentro dos princípios da sustentabilidade, e ainda que busque manutenção ou mesmo aumento de produtividade respeitando terras públicas, unidades de conservação e terras indígenas e quilombolas”, finalizou.

Macron

A fala do presidente francês foi feita durante uma visita a produtores agrícolas do País, na terça-feira, 12. Macron disse que luta para produzir soja na Europa e evitar endossar o desmatamento na Amazônia.

“Continuar a depender da soja brasileira seria o mesmo que apoiar o desmatamento da Amazônia. Somos coerentes com nossas ambições ecológicas, estamos lutando para produzir soja na Europa”, escreveu.

Macron afirmou ainda que quando o País francês importa a soja produzida a um “ritmo rápido” a partir da floresta no Brasil, a França não é coerente. “Nós precisamos da soja brasileira para viver? Então nós vamos produzir soja europeia ou equivalente”, completou.

Em nota, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) lamentou a declaração do presidente Emmanuel Macron e disse o francês tenta “justificar sua decisão de subsidiar os agricultores franceses atacando a soja brasileira”. 

“Como bem sabe Macron, a soja produzida no bioma Amazônia no Brasil é livre de desmatamento desde 2008, graças a Moratória da Soja, iniciativa internacionalmente reconhecida, que monitora, identifica e bloqueia a aquisição de soja produzida em área desmatada no bioma, garantindo risco zero do envio de soja de área desmatada (legal ou ilegal) deste bioma para mercados internacionais”, escreveu a associação.

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