Anuário aponta que apenas três Estados têm planos para mudança climática
Por: Ana Cláudia Leocadio
30 de janeiro de 2025
BRASÍLIA (DF) – Apenas três Estados possuem políticas e planos para as mudanças climáticas, segundo aponta o “Anuário Estadual de Mudanças Climáticas”, divulgado na tarde desta quinta-feira, 30, em Brasília. No total, foram avaliados seis tipos de instrumentos formais para atender às necessidades de uma sólida política na área. Apenas Espírito Santo, Paraná e Distrito Federal conseguiram aprovar em suas estruturas administrativas.
Elaborado há mais de um ano, o Anuário é uma realização do Centro Brasil no Clima (CBC) e do Instituto Clima e Sociedade (ICS), com apoio do Itaúsa. São 284 páginas com informações detalhadas sobre cada unidade da federação sobre como os Estados estão atuando diante das mudanças climáticas.
Sobre a existência ou não de planos e políticas para a mudança do clima, os pesquisadores elencaram a necessidade de ter seis documentos: Política Estadual de Mudança Climática; Plano ou Estratégia Estadual de Mudanças Climáticas; Plano de Contingência de Defesa Civil; Inventário Estadual de Emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE); Plano de Mitigação das Emissões e o Plano de Adaptação às Mudanças Climáticas.

A pior situação é a do Estado do Rio Grande do Norte, que ainda está em fase de elaboração do seu Plano Estadual de Mudança Climática e não possui nenhum dos outros instrumentos.
Dos nove Estados da Amazônia Legal, Maranhão, Amapá e Roraima também apresentam um cenário preocupante. Tanto o governo maranhense quanto o roraimense informaram ter somente a Política Estadual de Mudança Climática. Já o governo amapaense informou possuir apenas o Plano de Contingência de Defesa Civil. Rondônia possui, além da Política de Mudança do Clima, o Plano de Defesa Civil.
O Estado com melhor desempenho é o Acre, que possui os cinco instrumentos e está em fase de elaboração ou revisão do seu Plano Estadual e/ou Estratégia de Mudança do Clima. O Amazonas conseguiu cumprir quatro dos requisitos pesquisados, faltando seu Inventário Estadual de Emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) e o Plano de Adaptação às Mudanças Climáticas.
O estudo traz um panorama atual em cada Estado e apresenta uma série de programas pelos quais eles podem ser inseridos no trabalho de mitigação de mudanças climáticas e como avançar.
Conforme o documento, apenas os Estados do Maranhão, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul recebem apoio do governo federal para quatro tipos de programas elencados, por exemplo.
O levantamento também quis saber a situação das unidades da federação em relação aos fundos ambientais, climáticos e de recursos hídricos nos Estados e Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS Verde. Apenas Mato Grosso do Sul e Rondônia possuem os quatro apresentados.
“Estados avançam em criar fundos específicos para mudanças climáticas desvinculando-os dos fundos estaduais de meio ambiente. Alguns fundos de mudanças climáticas promovem uma abordagem inovadora, como o Fundo Cidades do Espírito Santo, voltado para projetos de adaptação local e o FINACLIMA (SP) para projetos do setor privado”, informa o Anuário.

Nove Estados são elegíveis para a política de Redução de Emissões de Desmatamento e Degradação Florestal (REDD+), que inclui a implementação de políticas de conservação e a capacidade de demonstrar reduções mensuráveis de desmatamento e degradação florestal. Dos elegíveis, sete integram a Amazônia Legal.
O Anuário também indica o Mato Grosso e Pará como os maiores emissores de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera, o que está ligado às emissões de mudanças do uso da terra. Já São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, têm altas emissões relacionadas às fontes energéticas, enquanto Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, são baseadas em agropecuárias.
Um dado que chamou atenção é o Acre, que apesar de taxas menores de emissões comparadas a 19 Estados, apresentou uma alta intensidade de carbono por conta do desmatamento, que não tem gerado riqueza e acaba contribuindo para o baixo Produto Interno Bruto (PIB) do Estado. “A intensidade carbono de Roraima passou a ser negativa em 2022, influenciada pela redução do desmatamento no Estado”, esclarece o estudo.
Além da apresentação das informações contidas no documento, foram realizados painéis com representantes dos governos federal e estadual, tribunais de contas e representantes da sociedade civil. Os palestrantes ressaltaram a importância da qualidade da informação trazida pelo Anuário, que vai poder orientar melhor os gestores estaduais a como se voltar para a urgência da mitigação das mudanças climáticas, que hoje causam muitos problemas em todo o planeta.
O conselheiro do Tribunal de Contas do Amazonas (TCE-AM), Júlio Pinheiro, que atua junto ao Instituto Rui Barbosa, foi o representante do Amazonas no evento. Ele participa do Comitê Técnico de Meio Ambiente e Sustentabilidade, do Instituto Rui Barbosa. Segundo Pinheiro, o órgão é pioneiro em projetos nessa área e faz auditorias frequentes em determinados setores do Estado.
Desafios da busca pelo financiamento
Uma das responsáveis pela elaboração do Anuário de 284 páginas, Fernanda Fortes Westin, explicou que ficou demonstrado nessa pesquisa que os 26 Estados e o Distrito Federal começam a se preocupar com a questão da mudança do clima, pois muitos estão retomando o arcabouço legal, que dará suporte a implementação dos projetos, principalmente os de adaptação.
“A gente vê que, apesar de serem recentes, muitos já estão se integrando a iniciativas globais como a ‘Race to zero’, que é para tentar zerar suas emissões até 2030, 2050”, ressaltou Westin, doutora em Planejamento Energético e Ambiental (COPPE/UFRJ) e consultora sênior do Centro Brasil no Clima (CBC).
O grande desafio, aponta Westin, é a busca pelo financiamento dos projetos porque o Brasil é muito dependente de recursos financeiros internacionais. “A gente precisa avançar, especialmente, com relação ao plano de adaptação dos Estados, porque são poucos que têm um plano de adaptação e os que têm, não tem recursos para implementar o que está no plano. Então essa é outra preocupação que o anuário aponta, a necessidade de buscar recursos”, lembrou a pesquisadora.
Westin destaca que há vários fundos que financiam projetos climáticos e também experiências promissoras de criação de fundos estaduais para a mudança do clima, que podem ajudar a alcançar os objetivos.
Uma das preocupações é com as queimadas, que em 2024 bateram recorde no País, principalmente no Pantanal e na Amazônia, e que não podem continuar se repetindo.
Em relação à Amazônia, a conclusão do Anuário levantou uma preocupação com a permissão do novo Código Florestal aos Estados que possuem zoneamento ecológico econômico, de reduzir a reserva legal de preservação permanente de 80% para 50%. “A gente se preocupa o que isso pode provocar com relação ao aumento do desmatamento nessas áreas amazônicas, que tem muitas áreas de reserva legal. Como que essas políticas podem influenciar os Estados no sentido de manter essas florestas, de se descarbonizar”, avaliou.
De acordo com a pesquisadora, a partir desse primeiro diagnóstico apresentado pelo Anuário, a ideia é fazer um acompanhamento dos resultados para saber se os Estados avançaram ou retrocederam nas suas políticas e planos. Os Estados podem, inclusive, entrar em contato com as instituições para atualizar as informações.
Importância do apoio dos Estados
A ministra do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, Marina Silva, falou da importância da participação dos Estados no esforço para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e espera, agora, que tenha mais do que ações de comando e controle e possam ter mais ações na área de desenvolvimento sustentável e o financiamento dessa política.
Marina lembrou dos problemas enfrentados desde que assumiu o ministério, começando pelas restrições orçamentárias à falta de pessoal. “Quando eu saí há 16 anos, eu deixei 1.700 fiscais, quando eu voltei só tinha 700 fiscais”, afirmou.
Ainda, assim, a ministra disse que as ações encaminhadas pelo seu ministério conseguiram reduzir em 45% o desmatamento na Amazônia, 27% na Mata Atlântica, 77% no Pantanal e de 48% no Cerrado.
“Esse esforço é um esforço que terá que ser sempre conjunto com os Estados, dentro daquilo que são as suas competências. Estamos reforçando a agenda também de combate aos incêndios, porque esse é também um vetor de degradação das florestas”, declarou.
Segundo Marina, em relação a Amazônia, há uma parceria com recursos do fundo Amazônia, na qual os municípios que mais desmataram estão em um acordo de cooperação, que preveem planos de desenvolvimento sustentável e processos de regularização fundiária.
Metodologia
Cortes de análises para os Estados feitos pelo Anuário:
- Governança e Financiamento (Planos Estaduais, ABC*+)
- Agropecuária (Planos ABC e ABC+, Pastagens)
- Energia (Matriz elétrica e produção de cada estado,
incentivos locais a energias renováveis) - Mudanças do Uso da Terra (dados sobre queimadas, REDD,
PSA e reflorestamento) - Indústria (Potencial de descarbonização)
- Resíduos
- Adaptação – Vulnerabilidade, gestão de riscos
*Agricultura de Baixo Carbono (ABC)
Fonte: Anuário Estadual de Mudanças Climáticas