Ao atacar ministro do STF por linguagem neutra, Bolsonaro confunde RO com SC

Jair Bolsonaro (PL) atacou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, por ter suspendido uma lei que proibia o uso e o debate sobre a linguagem neutra (Guilherme Oliveira/Cenarium)

Iury Lima – Da Revista Cenarium

VILHENA (RO) — Foi durante entrevista concedida à Jovem Pan News nessa segunda-feira, 10, que o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), atacou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, por ter suspendido uma lei que proibia o uso e o debate sobre a linguagem neutra em salas de aula das escolas públicas e particulares de Rondônia, além do emprego em concursos públicos. No entanto, Bolsonaro mal tinha certeza se a decisão foi, de fato, de Fachin, além de confundir o Estado integrante da Amazônia Legal com Santa Catarina, no Sul do País. 

“Se eu não me engano, Santa Catarina… Sim, Santa Catarina. Tem uma lei lá que foi sancionada pelo governador proibindo a linguagem neutra. O que o ministro Fachin fez? Acho que foi o Fachin. Deu uma liminar contra essa lei que estava lá em Santa Catarina (…)”, declarou o presidente. “Que País é esse? Que ministro é esse do Supremo Tribunal Federal? O que ele tem na cabeça?”, indagou Bolsonaro, em tom irônico. 

O autor do projeto, deputado estadual Eyder Brasil (PSL), à esquerda; o governador de Rondônia, Coronel Marcos Rocha (PSL), ao centro, e o ministro Edson Fachin, do STF (Guilherme Oliveira/Cenarium)

Bolsonaro se referiu à Lei Nº 5.123/2021, de autoria do deputado estadual Eyder Brasil (PSL), aprovada pela Assembleia Legislativa de Rondônia (ALE-RO) e sancionada pelo governador Coronel Marcos Rocha (PSL). O dispositivo entrou em vigor em outubro do ano passado, mas acabou suspenso no mês seguinte por Fachin. 

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Para o ministro, a lei é sinônimo de censura, pois tem o risco “imenso” de calar professores e alunos em ambiente escolar, uma vez que proibia o uso e debate sobre os termos inclusivos em instituições públicas e particulares, além de concursos públicos.

Despreparo

Na avaliação do cientista político Carlos Santiago, ouvido pela CENARIUM, o chefe do Executivo Nacional, além de ter dado uma amostra do despreparo na condução e da falta de conhecimento sobre a política e geografia do País que comanda, transbordou, uma vez mais, apenas os próprios interesses.

“A postura do presidente Bolsonaro apenas reproduz velhos preconceitos e busca ganhar votos de setores conservadores do eleitorado brasileiro. O País tem muito miserável, desempregado e atravessa a pior tragédia sanitária da sua história, pautas que deveriam ser preocupações maiores do presidente”, afirmou Santiago.

Para o cientista político Carlos Santiago, Bolsonaro reproduz velhos preconceitos e não se preocupa com pautas que abraçam tragédias sociais (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Leis distintas

Diferente da lei de Rondônia, o dispositivo aprovado em território catarinense veda “novas formas de flexão de gênero e de número das palavras da língua portuguesa, em contrariedade às regras gramaticais consolidadas”. A medida vale, também, para concursos públicos, mas se estende a documentos oficiais dos órgãos da administração estadual e das instituições de ensino, enquanto que a Lei de Eyder Brasil, no território rondoniense, visa silenciar educadores e estudantes acerca do tema.

Variação necessária

Defendida por especialistas, linguistas e ativistas da causa LGBTQIA+, a linguagem neutra é vista como avanço e necessária para a inclusão de quem não se encaixa em padrões sociais pré-estabelecidos, como os gêneros conhecidos na forma como são impostos há séculos, ou seja, masculino e feminino. 

Os termos neutros abraçam, principalmente, a quem se considera não-binárie, ou seja, nem homem e nem mulher. Daí se dá a substituição dos artigos masculinos ou femininos, em certas palavras, pelas letras ‘x’ ou ‘e’. Assim, ‘todos’ vira ‘todxs’ e ‘amigo’, se torna ‘amigue’, por exemplo.

“A linguagem não é estática. Passa por constantes mudanças no tempo, no espaço social, na interação entre pessoas e na interação entre homem e natureza. Dependendo de como ela é imposta, pode representar preconceitos, liberdade e, também, a exclusão social. A linguagem formal e institucional no Brasil não traduz as relações sociais de hoje. Por isso, a linguagem neutra é mais inclusiva e representa uma nova abordagem da linguagem”, defende Carlos Santiago.

“O Estado, a escola e a região devem promover a paz, o conhecimento e a dignidade da pessoa humana, independentemente de gênero, de classe social, de cor e de credo. Proibir a linguagem neutra não contribui com a pluralidade e a diversidade da vida social”, concluiu o cientista político. 

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