Apib protesta contra suspensão de homologação de TI por Mendonça
Por: Ana Cláudia Leocádio
24 de janeiro de 2025
BRASÍLIA (DF) – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) publicou uma manifestação em que protesta contra a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça, que suspendeu a demarcação da Terra Indígena (TI) Toldo Imbu, localizada no município de Abelardo Luz, em Santa Catarina. A demarcação do território, que abriga a etnia Kaingang, foi assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 4 de dezembro de 2024.
Para a organização indígena, a decisão de Mendonça “coloca vidas em risco, afeta centenas de vidas Kaingang e ameaça o futuro”. “O ministro usa como motivo para a suspensão liminar, os embargos que constam no processo do Marco Temporal que transcorre no STF. O processo é conhecido como RE do Povo Xokleng, trata do Marco Temporal e tem repercussão geral. Em setembro de 2023, o Supremo já tinha declarado a tese como inconstitucional”, afirma a Apib em suas redes sociais.
O despacho de Mendonça foi tomado, na última segunda-feira, 20, e julga o Recurso Extraordinário 971.228, do Estado de Santa Catarina, no qual pede para ser admitido como “amigo da corte” (amicus curiae) e o sobrestamento do processo administrativo demarcatório da TI Toldo Imbu.

Segundo a decisão do ministro, o pedido principal “consiste na suspensão do processo administrativo demarcatório da Terra Indígena Toldo Imbu, bem como da homologação promovida pela Funai, em dezembro do ano passado, até o julgamento final do Tema 1031 do STF e o julgamento dos Embargos de Divergência no processo”.
O Tema 1031 (RE 1.017.365) tem repercussão geral e julgou inconstitucional, em setembro de 2023, a tese do Marco Temporal, que definia o dia 5 de outubro de 1988, data da Promulgação da Constituição do Brasil, como data limite para demarcar as terras aos indígenas. Relatado pelo ministro Edson Fachin, o processo ainda não transitou em julgado porque está pendente de julgamento os embargos de declaração à decisão do Supremo.
Relatado pelo ministro Edson Fachin, o processo do Tema 1031 tem uma decisão que “determinou a suspensão nacional de ações possessórias e anulatórias de processos administrativos de demarcação, bem como de recursos vinculados a essas demandas, sem prejuízo dos direitos territoriais dos povos indígenas, até o fim da pandemia de Covid-19 ou a conclusão do julgamento do processo piloto da repercussão geral”.
O pedido de nulidade do processo administrativo 08620.001538/2011-15 da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) tem um motivo, uma vez que não sendo reconhecida a tradicionalidade da posse indígena, cai por terra a homologação do território.
Conforme o despacho de André Mendonça, o Estado de Santa Catarina alega que que a Portaria do Ministério da Justiça 793, de 2007, que entendeu como de ocupação tradicional dos indígenas Kaingang uma área de terra localizada no Município de Abelardo Luz (SC), contraria a jurisprudência do Supremo e estaria afrontando a ordem de suspensão nacional de processos determinada pelo ministro Fachin, no dia 6 de maio de 2020.
“Diante desse cenário, embora a suspensão nacional dos processos deva ser cumprida, conforme consta da decisão, ‘sem prejuízo dos direitos territoriais dos povos indígenas’, sabe-se que a medida visa proteger a segurança jurídica, evitando consolidar decisões judiciais que, após eventual definição em sentido diverso pelo Plenário da Corte, se revelem irreversíveis ou de difícil reversão”, afirma Mendonça na decisão.
Ele considera que o julgamento final do tema 1031 ”se relaciona com o mérito da disputa travada na origem, podendo a definição da Suprema Corte ser decisiva para a sorte da área ‘sub judice’, ainda está pendente de julgamento”.
Mendonça disse que decidiu sobrestar o Processo Administrativo da Funai, mesmo antes das informações da União, Funai e do Ministério Público Federal (MPF), por conta do perigo da demora e para que seja possível “formar juízo mais completo do caso vertente”.
“Ante o exposto, sem prejuízo de nova análise após regular instrução do feito, concedo a tutela provisória incidental requerida, a fim de suspender todos os efeitos do Processo Administrativo Funai no 08620.001538/2011-15, da Portaria MJ no 793, de 2007, e do Decreto no 12.289, de 2024, em relação à Terra Indígena Toldo Imbu, até o julgamento de mérito do feito”, concluiu o ministro.
Funai demarcou 13 TIs em dois anos
A Terra Indígena Toldo Imbu, localizada no município de Abelardo Luz, em Santa Catarina, fez parte dos 13 territórios que foram homologados pelo presidente Lula desde que assumiu este terceiro mandato, em janeiro de 2023.
Além da terra dos Kaingang, em 4 de dezembro de 2024 foi homologada outra TI em Santa Catarina: a TI do Morro dos Cavalos, cujos indígenas do povo Guarani chegaram a receber, no último dia 11 deste mês, o registro em cartório da terra. O documento foi entregue pela presidente da Funai, Joenia Wapichana, e pela ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara.

A TI Toldo Imbu possui uma área superior a 1,9 mil hectares, no bioma Mata Atlântica. O território, do povo Kaingang, foi declarado pela Portaria nº 793, de 19 de abril de 2007. E a demarcação física foi realizada em 2010.
Marco temporal ainda em análise do STF
Além do Tema 1031, que ainda não transitou em julgado no STF, porque ainda não julgou os embargos de declaração, na Corte também tramitam ações que questionam a inconstitucionalidade e constitucionalidade da Lei 14.701, aprovada pelo Congresso Nacional em 2023.
Conhecida como “Lei do Marco Temporal”, a nova legislação foi aprovada pelos parlamentares logo após a decisão unânime do Supremo, que reconheceu a inconstitucionalidade da tese que cria a data da promulgação da Constituição Federal, como data limite para demarcação das terras indígenas.
O relator das ações, ministro Gilmar Mendes, decidiu instalar uma Comissão de Conciliação para chegar a um consenso sobre a situação. Para ele, somente decidir se considera inconstitucional ou não a referida lei não vai resolver os conflitos históricos que envolvem indígenas e não indígenas nessa questão. A comissão volta a se reunir em fevereiro deste ano para novas audiências sobre o tema.
No Senado, tramita a Proposta de Emenda à Constituição 48 (PEC), apresentada pelo senador Hiran Gonçalves (PP-RR), que pretende inserir na Constituição a tese do Marco Temporal. Com relatório favorável do senador Espiridião Amin (PP-SC), a matéria está parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e aguarda decisão do ministro Gilmar Mendes, na Comissão de Conciliação criada no STF.