Após polêmica de livro LGBTQI+ para crianças, psicólogos debatem sobre diversidade na educação

Debate sobre tema LGBTQI+ na educação brasileira promete ainda muitos capítulos entre 'contrários e a favoráveis' (Reprodução/Internet)

Mencius Melo – da Revista Cenarium

MANAUS – Um amplo debate sobre diversidade LGBTQI+ na educação infantil ganhou repercussão local após um parlamentar da Câmara Municipal de Manaus (CMM), usar a tribuna da Casa para repudiar iniciativa da apresentadora Xuxa Meneghel, que pretende lançar um livro com temática para crianças.

O vereador Fred Mota (Republicanos-AM) protocolou uma moção de repúdio à apresentadora, conhecida como rainha dos baixinhos. “Não podemos deixar que nossas crianças sejam doutrinadas dessa forma. Deixo registrado o meu repúdio contra qualquer tipo de afronta aos nossos pequenos!”, exclamou.

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Presentes nas manifestações e paradas de orgulho LGBTQI+, as crianças estão no centro do debate educacional brasileiro sobre diversidade (Reprodução/Internet)

Para aprofundar conhecimentos acerca da temática, a REVISTA CENARIUM resolveu entrevistar psicólogos com posicionamentos divergentes. A psicóloga Neyla Siqueira tem visão diferente do vereador, e acredita que existe um tabu ao se tratar da diversidade no Brasil.

“Podemos partir basicamente do preconceito, no sentido mais real da palavra. O medo do novo, medo do diferente ao que é padronizado, é algo que assusta e quando se trata de qualquer temática relacionada a sexualidade, principalmente relacionada ao LGBT. Esse comportamento toma uma proporção muito maior. O que é uma hipocrisia porque LGBTQI+ existe desde que o mundo é mundo”, enfatizou.

Hipocrisia verde amarela

Para a profissional, o “movimento conservador” está na raiz da sociedade brasileira. “No Brasil essa hipocrisia ganha ares ainda maiores. Nós temos uma parada gay mundialmente reconhecida. Nós somos o país que mais consome pornografia com pessoas trans, além de ser a nação que mais mata essas pessoas, e ainda temos a audácia de espalhar fake news de kit gay em escola que nunca existiu”, disparou.

Ela defende que esse comportamento é oriundo justamente da postura de líderes religiosos, como é o caso do vereador, que também pastor. “O que estiver fora disso, é pecado”, sentenciou Neyla.

“O uso da repressão sexual por vertentes religiosas data de muito tempo. É algo histórico que é usado como instrumento de controle social, para dizer o que é certo e o que é errado. Usa-se isso para se garantir a procriação, para se garantir instituição da família nuclear, para a retenção de riqueza via casamentos”, explicou.

Personagem amado por milhões de crianças, Bob Esponja foi recentemente ‘assumido’ como um personagem LGBTQI+, pelos estúdios Nickelodeon (Reprodução/Internet)

Desnecessário

Já o psicólogo Sérgio Cavalcante vê a matéria com outros olhos. “Eu não acho necessário nossas crianças serem submetidas a um tema tão complexo, onde até mesmo a ciência não tem a resposta, e até mesmo a sociedade ainda não está totalmente convencida sobre isso”, descartou.

Para Sérgio Cavalcante, o tema LGBTQI+ é confuso e não acrescenta no debate educacional brasileiro (Reprodução/Arquivo Pessoal)

Para ele a complexidade do tema o torna inviável para o debate educacional. “Então são várias situações onde não há uma coerência na totalidade, e com isso não acredito que seja a melhor opção dentro do estudo, abordar o tema LGBTQI+. Mesmo porque nossas crianças são esponjas, eles estão recebendo tudo”, declarou.

“Por essa razão elas despertam pra tudo que que elas ouvem e veem. Então acredito que ainda não há maturidade psicológica para uma criança ser educada com tema dessa natureza”, asseverou.

Ainda segundo ele, o tema não é oportuno. “Eu não acho necessário para o Brasil a educação sexual na questão LGBTQI+ para nossas crianças”, afirmou.

Discordância

Neyla Siqueira discorda do colega. “Piaget* fala que é a partir dos cinco anos que a criança começa a ter noções, consciência e valores morais. A partir daí ela segue o que é ‘certo e errado’, de acordo com o que é ensinado para ela, o pensamento próprio minimamente crítico, só a partir dos 11, 12 anos”, observou.

Para a psicóloga Neyla Siqueira, o debate LGBTQI+ é necessário, seu colega Sérgio Cavalcante pensa ao contrário (Reprodução/Internet)

Por isso ela acredita que o debate é necessário. “Quando falamos de sociedade, não podemos esquecer a influência que o outro tem sobre nós, e uma criança que cresce ouvindo o que LGBTQI+ é errado, ela está sendo doutrinada, essa é a influência do meio que é muito forte”, destacou.

Para Neyla é perigoso não educar as crianças brasileiras, dentro de uma agenda mínima sobre o tema. “Criança não tem pensamento moral constituído, a reação dela será uma reprodução do que for ensinado. Ela não consegue entender ou ter juízo moral particular, mas, se for colocado na cabeça dela que isso é errado, que ela tem que discriminar, que ela tem que combater, que isso é pecado, é muito ruim para a sociedade”, lamentou.

Ela finaliza afirmando que “essas ideias podem ser colocadas na cabeça de uma criança muito antes dela ter um tecido minimamente crítico. Inclusive com um discurso rico advindo da família, da escola, da igreja, dos amigos…”, finalizou a especialista.

*Jean Piaget foi foi um biólogo, psicólogo e epistemólogo suiço, considerado um dos mais importantes pensadores do século XX. Defendeu uma abordagem interdisciplinar para a investigação epistemológica e fundou a Epistemologia Genética, teoria do conhecimento com base no estudo da gênese psicológica do pensamento humano.

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