Ausência dos EUA na COP30 amplia impasse financeiro sobre metas climáticas
Por: Fred Santana
17 de novembro de 2025
BELÉM (PA) – A ausência oficial dos Estados Unidos (EUA) nas negociações formais da COP30 ganhou destaque na coletiva da Rede de Ação Climática dos EUA, realizada nesta segunda-feira, 17, durante o sétimo dia do evento climático em Belém (PA). Representantes de organizações norte-americanas afirmaram que o país, mesmo sem delegação governamental presente, “lança uma sombra” sobre as discussões e agrava o bloqueio em temas centrais, como financiamento climático e perdas e danos.
Para Brandon Wu, da ActionAid USA, a obstrução histórica dos EUA no financiamento climático explica por que temas como adaptação e perdas e danos estão travados. “O país não está aqui, mas está lançando uma longa sombra sobre estas negociações”, declarou, afirmando que a postura norte-americana tem influenciado outros países desenvolvidos a evitarem compromissos financeiros firmes.
Wu afirmou que a falta de recursos é, atualmente, o maior entrave da conferência. “Sem apoio, sem financiamento, a ambição é impossível em muitas partes do mundo”, disse. Ele destacou que o novo fundo de perdas e danos, anunciado no primeiro dia da COP, conta com apenas US$ 250 milhões, enquanto as necessidades anuais dos países do Sul Global chegam a centenas de bilhões. Segundo ele, “é uma gota no oceano”, ressaltando que os países ricos “não têm entregado historicamente, não entregam agora e dão todos os sinais de que não vão entregar”.

A crítica se estende à política interna dos EUA. Wu lembrou que o “nosso governo inventou unilateralmente a meta de US$ 100 bilhões e também inventou as regras de como esse dinheiro seria contado”, apontando que os Estados Unidos “têm dito repetidamente que não há dinheiro, quando sabemos que isso não é verdade”.
Brandon citou como exemplo os US$ 200 bilhões gastos pelo país este ano em ações de deportação, contrapondo aos US$ 17 milhões destinados ao fundo de perdas e danos. “É uma piada cruel perto de onde nosso governo realmente coloca dinheiro”, afirmou.
Críticas ao legado climático e político dos EUA
Rachel Cleetus, da Union of Concerned Scientists, reforçou que a insuficiência de compromissos dos grandes emissores, incluindo os Estados Unidos, deixa o planeta perto de ultrapassar o limite de 1,5 °C. “Estamos aqui por causa da ação insuficiente dos líderes políticos, inclusive dos nossos”, explicou, defendendo que uma transição energética justa exige o fim dos combustíveis fósseis.

Gemma Carolina Gutierrez, do Youth N’ Power, avaliou que os EUA seguem ausentes não apenas fisicamente, mas moral e politicamente. “A ausência deles permanece como uma sombra política”, comentou, alegando que o país evita reconhecer danos históricos e reproduz desigualdades que recaem sobre populações negras, indígenas e migrantes. “As soluções reais não surgem de instituições que não reconhecem o dano em primeiro lugar”, afirma Gutierrez, ressaltando que movimentos comunitários desenvolvem respostas concretas dentro e fora dos EUA.
Reivindicações por reconhecimento e reparação
A ativista Cheryl Kwapong, do The Chisholm Legacy Project, enfatizou que comunidades afrodescendentes, historicamente afetadas por desigualdades ambientais, precisam ser reconhecidas como uma constituinte formal dentro da ONU.
“Afrodescendentes merecem um assento na mesa quando estamos pensando esta COP”, afirmou. Ela lembrou que “a nação dos EUA foi construída sobre a escravidão e sobre as costas de povos escravizados”, cobrando compromisso real do governo norte-americano com reparação e participação.
Kwapong ressaltou que essas populações enfrentam impactos climáticos que vão do Caribe ao Delta do Mississippi, do Amazonas à Nigéria, mas também protagonizam soluções locais. “Somos resilientes por natureza; sobrevivemos ao tráfico de escravos, ao apartheid, à opressão”, disse, afirmando que esperam sair da COP com medidas concretas, e não apenas discursos.
Fechando a coletiva, Brandon Wu sintetizou o papel dos EUA nas crises atuais. “O Acordo de Paris não está falhando; ele está fazendo exatamente o que foi projetado para fazer”, afirmou. “Quem está falhando são os governos do Norte Global, que não cumprem suas obrigações enquanto planejam novas expansões fósseis, como os Estados Unidos”, criticou. Wu concluiu dizendo que as reformas necessárias começam “em casa, nos nossos governos”, e não na arquitetura multilateral.
Ausência dos EUA amplia incertezas na COP30
Os inventários anuais da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) mostram que o país permanece, há mais de três décadas, entre os maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo, liberando entre 5,5 e 6,7 bilhões de toneladas de CO₂-equivalente por ano desde 1990.

Considerando a soma histórica desde a Revolução Industrial, pesquisas internacionais indicam que os EUA respondem por cerca de um quarto das emissões acumuladas do planeta, o que faz do país um dos principais responsáveis pelo aquecimento global observado até hoje.
Esse peso histórico foi um dos motivos que levou os EUA a apresentarem, em 2015, sua primeira contribuição nacional no âmbito do Acordo de Paris, com a meta de reduzir 26% a 28% das emissões até 2025, em comparação a 2005. À época, o compromisso era considerado peça central para a ambição global, pois o país emitia sozinho mais do que continentes inteiros.
O cenário mudou quando a administração Trump anunciou a retirada formal do Acordo, medida efetivada em 2020 e retomada em 2025, após nova vitória eleitoral, interrompendo novamente políticas climáticas federais e bloqueando iniciativas de financiamento climático internacional.

Quando retornaram ao acordo em 2021, os EUA apresentaram uma meta mais ambiciosa: reduzir 50% a 52% das emissões até 2030 e alcançar neutralidade de carbono em 2050, conforme detalhado na Estratégia de Longo Prazo do governo.
Dados oficiais mostram que o país ainda se encontra distante da trajetória necessária para cumprir esse objetivo. Em 2022, por exemplo, as emissões estavam cerca de 15% abaixo dos níveis de 2005, quando deveriam estar próximas de 30% para manter alinhamento com o limite de 1,5 °C.
