Bacias do Educandos e São Raimundo têm péssimos índices de qualidade da água
06 de fevereiro de 2023
Apesar de estar circundada por água, a capital tem muitas bacias impróprias para consumo ou lazer (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
Ívina Garcia – Da Revista Cenarium
MANAUS — Rodeada pelas águas dos Rios Negro, Solimões e Amazonas, Manaus tem a hidrovia como um dos principais meios de turismo e deslocamento. A hidrografia da cidade conta com quatro principais bacias: Educandos, São Raimundo, Tarumã e Puraquequara.
Entrecortada por igarapés e pequenos lagos, a cidade mistura peças urbanas e prédios modernos, com igarapés, pontes e portos. Apesar de estar circundada por água, muitas das bacias são impróprias para consumo ou lazer.
Conforme os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas, o acesso à água potável é um dos principais fatores que ajudam a diminuir desigualdades e garantir uma vida melhor, com acesso à saúde e qualidade de vida.
Vista da cidade de Manaus (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
A partir disso, um estudo pioneiro da Universidade Estadual do Amazonas (UEA) mapeou os principais pontos das bacias do Educandos e do São Raimundo ao longo de dois anos, entre fevereiro de 2020 e janeiro de 2022, para colocar em prática o projeto de mapeamento ambiental que verifica a qualidade das águas.
Ao todo, 14 pontos foram coletados na Bacia do Educandos e 31 na Bacia do São Raimundo, consideradas as principais da capital, para gerar o Índice de Qualidade da Água (IQA), com uma série de parâmetros utilizados em pesquisas internacionais.
A princípio, o estudo cruzou os dados obtidos com números utilizados em São Paulo e no Rio Grande do Sul. No entanto, os pesquisadores notaram que a bacia Amazônica apresentava diferenças que não poderiam ser medidas por parâmetros não regionalizados.
Conforme o pesquisador e coordenador do estudo, Dr. Sergio Duvoisin Junior, os números obtidos nas pesquisas ainda são imprecisos, pois uma vez que os parâmetros desconsideram a esfera regional, os dados não refletem a verdadeira qualidade da água de Manaus.
Pesquisadores coletam materiais para pesquisa (Divulgação/UEA)
“Enquanto não temos esse índice [regional] por aqui, usamos o mapeado em São Paulo e no Rio Grande do Sul. São águas completamente diferentes, então, às vezes, a gente pode estar inferindo resultados que não são exatamente aquilo que deveriam ser“, explica Junior.
O próximo passo, segundo o pesquisador, é gerar o IQA amazonense, utilizando as especificidades da região, considerando as químicas próprias e acidez das bacias. Campanhas com equipes de pesquisadores já iniciaram as visitas em locais sem ação humana para começar a definição do índice no Estado.
“A partir desse projeto a gente viu que aqui, no Amazonas, não tinha um índice de qualidade de água que caracterizasse a água daqui sem ter ação humana. Então, isso foi o motivador até dos projetos que vieram depois, da gente começar a monitorar a água em locais longe da cidade, para montar um IQA que realmente representasse as águas da região“, relata.
Dr. Sergio Duvoisin Junior, coordenador da pesquisa (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
O coordenador exemplifica que o IQA de São Paulo, por exemplo, considera que o pH (potencial hidrogeniônico) considerado ótimo está em torno de 7 pontos, diferente do observado no Rio Negro, onde a média fica abaixo dos 5 pontos.
“Se a gente fosse comparar os dados daqui, que ficam entre quatro e pouco e cinco pontos, com a tabela de São Paulo, a água estaria ruim, mas isso não é verdade, porque a água do Rio Negro tem o pH em torno de quatro e cinco. Por isso, os ajustes no IQA precisam ser feitos para a região“, pontua Júnior.
Além de mapear a qualidade da água, o projeto funciona como um monitoramento de despejos. Parte da pesquisa coletou água em locais próximos a fábricas do Distrito Industrial.
“São as duas principais bacias mais impactadas em Manaus. É extremamente importante fazer o monitoramento porque elas passam por regiões onde tem grande população ou no Polo Industrial, então podemos ter ali despejo de coisas que não sejam domésticas“, ressalta o coordenador da pesquisa, que diz estar em tratativas para reativar o projeto de monitoramento junto à Unidade Gestora de Projetos Especiais (UGPE).
Resultados
Os resultados obtidos pela pesquisa estão disponíveis para consulta no site do Grupo de Pesquisa Química Aplicada à Tecnologia, da Universidade Estadual do Amazonas (UEA). A pesquisa está disponível para que a população tenha acesso à informação sobre a qualidade das águas nos locais onde vivem.
Conforme o pesquisador, os resultados já eram esperados pelo grupo. “Acho que qualquer um que passe nessas bacias e olhe para elas sabe que a qualidade não está lá essas coisas, o negócio é que o projeto acabou pontuando aquilo que realmente tava acontecendo”, afirma.
Veja tabela do IQA utilizada no Brasil:
Arte: Mateus Moura/Revista Cenarium
Cada parâmetro possui uma cor, sendo azul para ótima; verde para boa; amarelo para razoável; vermelho para ruim e preto para péssima. A pesquisa nas bacias do Educandos e São Raimundo consideraram as duas faixas, nos quais em ambos o IQA registrado foi, em média, 30, com avaliação “ruim” para ambas.
A Bacia do Educandos teve média de 31, com quatro pontos pretos, de qualidade péssima; 68 pontos vermelhos, com qualidade ruim; 24 pontos amarelos, com qualidade razoável; dois pontos verdes, com qualidade boa e nenhum ponto azul, com qualidade ótima.
Bacia do Educandos (Reprodução/UEA)
“Isso reflete essa distorção que a gente tem do IQA para a região, necessitando um índice que realmente nos identifique como qualidade de água dessa macro bacia que são essas águas negras“, avalia o pesquisador, que pontua que além do IQA, foi realizada a classificação com base nos parâmetros do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), dividido por classes de um a quatro, na qual a bacia do Educandos está dentro da classe quatro, a pior de todas.
Já na Bacia do São Raimundo, que não é afluente industrial e possui mais resíduos domésticos, o IQA registrado também apresentou dados ruins. Com média de 32, a bacia apresentou sete pontos pretos, com qualidade péssima, 130 pontos vermelhos, com qualidade ruim; 69 pontos amarelos, com qualidade razoável; 11 pontos verdes, com qualidade boa e nenhum ponto azul, com qualidade ótima.
Bacia do São Raimundo (Reprodução/UEA)
“A Bacia do São Raimundo também está comprometida da mesma maneira que a do Educandos, e classificada como classe 4 no Conama. Isso mostra que ambas as bacias estão muito comprometidas“, avalia.
Para o coordenador, a pesquisa é um importante passo para o monitoramento ambiental e serve como ferramenta para os gestores, tanto ambientais como do Estado, para gerar melhorias para a população.
“Hoje o gestor publico tem uma ferramenta gigantesca na mão, pela qual ele pode saber exatamente em que ponto estamos fazendo despejo inadequado, porque esse projeto a gente acabou fazendo de quilômetro em quilômetro nas duas bacias, mapeando muito bem o que está errado“, frisa.
Segundo Sérgio, as bacias estão muito comprometidas e agora que já se conhece a extensão do problema, é possível agir para corrigir. “Agora, é utilizar essa ferramenta e realmente tentar resolver. Essa parte passa muito pela gestão, a gente mostra o problema, e agora cabe a gestão pública dar uma solução“, finaliza Sérgio.
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