Belém opera ‘limpeza social’ com remoções forçadas às vésperas da COP30, diz MPF
Por: Fabyo Cruz
30 de julho de 2025
BELÉM (PA) – O Ministério Público Federal (MPF) denunciou a Prefeitura de Belém (PA) por omissão de informações, apresentação de dados falsos e adoção de medidas higienistas contra a população em situação de rua no contexto da preparação da cidade para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá entre os dias 10 e 21 de novembro deste ano na capital paraense. As denúncias constam de manifestação enviada à Justiça Federal no dia 25 de julho.
Na ação, que segue em tramitação na 2ª Vara Federal em Belém, o MPF diz haver indícios de que o município tem promovido uma “limpeza social” nos bairros centrais da cidade, com remoções forçadas, uso de arquitetura hostil e outras práticas que visam ocultar a presença de pessoas em situação de rua nas áreas que estarão sob os holofotes internacionais durante a conferência. O órgão cita “coação física e psicológica” para expulsar os alvos das ações “para longe das áreas centrais da cidade”. Veja trecho da manifestação:

Assinado pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão no Pará, Sadi Flores Machado, o documento enviado à Justiça menciona, por exemplo, a retirada forçada de pessoas na Travessa Quintino Bocaiuva, no centro de Belém, no dia 25 de junho deste ano. A ação, realizada com o uso de trator e sem aviso prévio, motivou uma recomendação conjunta do MPF e do Ministério Público do Estado (MP-PA) ao prefeito Igor Normando (MDB), pedindo que cesse qualquer prática de remoção compulsória, em respeito à decisão do Supremo Tribunal Federal no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 976, que proíbe esse tipo de conduta.
Além das remoções, o MPF afirma que a prefeitura apresentou informações falsas à Justiça sobre a oferta de vagas em abrigos institucionais. Embora o município alegue ter 90 vagas disponíveis, inspeções realizadas pelo MPF, MP-PA e Defensoria Pública do Estado (DPE) constataram apenas 40 – número que não atende nem 5% da população em situação de rua estimada em Belém, entre 2.500 e 3.000 pessoas.
A situação se agrava com a constatação de que parte dos equipamentos públicos, como a Casa Rua Nazareno Tourinho, está em estado crítico, com risco à segurança e sem condições mínimas de habitabilidade. Segundo parecer técnico do MPF, o local não poderia sequer funcionar como abrigo, diante da precariedade estrutural.
Pedido de multa
Para o MPF, a atuação da Prefeitura de Belém tem sido “inócua” diante da gravidade da crise social que afeta a cidade. Para o órgão, não há vagas disponíveis em abrigos, nem levantamento de espaços públicos ou privados para uso emergencial, tampouco foram apresentadas alternativas claras e objetivas para o acolhimento da população em situação de rua.
Diante do descumprimento de decisões judiciais e do agravamento da situação, o MPF pede a aplicação de multa ao município e à Fundação Papa João XXIII, no valor de pelo menos R$ 10 mil por dia, além da fixação de novo prazo de 15 dias para que apresentem medidas efetivas de acolhimento e assistência à população em situação de rua.
O que diz a prefeitura
A reportagem solicitou posicionamento à Prefeitura de Belém. Em nota, a administração de Igor Normando informou que “até o momento não foi oficialmente notificada sobre essas questões”. O comunicado afirmou, ainda, que a gestão realiza ações constantes com a população em situação de rua e que o trabalho das equipes técnicas busca “orientar, sensibilizar e encaminhar o público de acordo com a demanda de cada um”. A prefeitura também mencionou o programa “Recomeçar”, lançado na atual gestão, como uma iniciativa para fortalecer ações integradas de garantia de direitos sociais.