‘Bicos’ de trabalho se tornam preferência no Brasil por flexibilização no horário e melhoria de renda

Entre o segundo trimestre de 2019 e o segundo deste ano, aumentou em mais de 2 milhões o número de brasileiros trabalhando sem carteira assinada. (Rovena Rosa/ Agência Brasil)
Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS – A informalidade ou os “bicos” entre a População Ocupada (PO) no Brasil têm crescido vertiginosamente nos dois últimos dois anos, retrato de uma crise econômica instaurada pela pandemia da Covid-19. Entre o segundo trimestre de 2019 e o segundo deste ano, aumentou em mais de 2 milhões o número de brasileiros trabalhando sem carteira assinada. A perda de empregos e a alta da inflação — com previsão de subir de 9,17% para 9,33% em 2021 — levam a população a buscar alternativas para alinhar os ganhos financeiros com a alta dos preços de produtos básicos para sobrevivência.

Por definição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma pessoa é “ocupada” quando exerce atividade profissional (formal ou informal, remunerada ou não) durante pelo menos uma hora completa, na semana de referência da pesquisa. Já os “informais” são aqueles que trabalham sem vínculos registrados na carteira de trabalho ou documentação equivalente. Atualmente, no Brasil, esse grupo soma mais de 25 milhões de pessoas ou 28,3% dos ocupados.

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Apesar de desprovido de benefícios como remuneração fixa e férias pagas, muitos trabalhadores têm escolhido se tornarem “informais” em busca das melhores condições financeiras e da possibilidade de cumprir horário próprio de trabalho. Essa foi a decisão tomada pela diarista Aguileia Augusta de Souza, que trabalhou por dois anos e meio com carteira assinada em uma concessionária de veículos em Manaus. Antes, o salário bruto era de R$ 1,1 mil. Hoje, cumprindo pelo menos quatro diárias na semana, chega a ganhar entre R$ 1,6 mil e R$ 1,8 mil mensalmente.

“Ganhava pouco e nem tão pouco cobria a despesa. Tenho um filho com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e precisa de atenção médica periodicamente. Agora já consigo pagar as contas em dia e alimentação também”, conta Aguileia, enfatizando ainda que “a informalidade está pagando mais que a formalidade”.

Quanto aos benefícios perdidos na informalidade, como a contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e futura aposentadoria por tempo de serviço, Aguileia explica que já busca fazer inscrição do contribuinte facultativo.

Precarização

O aumento da informalidade preocupa especialistas devido à relação com a precarização das relações de trabalho. A automatização de processos e serviços, a situação econômica e a pandemia da Covid-19 contribuem para o aumento do desemprego e, consequentemente, o aumento da informalidade e do subemprego.

“É natural compreendemos que a urgência na busca de renda leva muitas vezes a aceitar quaisquer condições de trabalho, principalmente trabalhando informalmente”, destaca a economista e vice-presidente da Conselho Federal de Economia (Cofecon), Denise Kassama.

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“Empregados domésticos e avulsos muitas vezes até preferem a informalidade para não terem descontos no salário. Em um horizonte onde a criação de empregos formais não cresce na mesma proporção que o aumento da população economicamente ativa, a tendência será o aumento dessas relações, informais, onde o trabalhador precisa, muitas vezes, se sujeitar a uma jornada de trabalho cada vez maior para garantir uma renda mínima necessária”, pontua ainda.

Desemprego

No dia 27 de outubro deste ano, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) correspondente a agosto revelou que o desemprego alcançou o patamar de 13,2% no trimestre móvel encerrado naquele mês (contra 13,4% no trimestre móvel encerrado em julho).

Segundo o IDados, o resultado pode ser visto como positivo, já que se situou abaixo da expectativa mediana de analistas (13,5%) e das projeções da própria consultoria (13,4%). O dado da PNADC também se mostrou positivo para a taxa de participação, que vem registrando contínuo aumento desde o 2º trimestre deste ano, e alcançou o nível de 58,6% no trimestre encerrado em agosto.

Este nível, entretanto, ainda se situa muito abaixo do observado no pré-pandemia (61,7%, no trimestre encerrado em janeiro de 2020). Os números da PNADC também revelaram um forte crescimento de 4,0% na População Ocupada (PO), na variação do trimestre móvel terminado em agosto em relação ao trimestre móvel encerrado em maio.

Para o ano de 2022, a IDados reitera “um quadro de elevadas incertezas tanto no campo inflacionário quanto no quadro político-eleitoral”, que poderão levar a um nível mais elevado de juros e a uma redução do nível de atividade e emprego, comprometendo a trajetória de recuperação do mercado de trabalho.

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