BR-319 pode impactar área da Amazônia maior que Estado de São Paulo

A conclusão faz parte de um estudo desenvolvido pelo CPI (Climate Policy Initiative/PUC-Rio), junto ao projeto Amazônia 20 (Dnit/Ministério da Infraestrutura)
Com informações da Folhapress

SÃO PAULO – A pavimentação da rodovia BR-319, que liga Porto Velho (RO) a Manaus (AM) pode gerar impacto – incluindo risco de desmatamento – em mais de 300 mil quilômetros quadrados da Amazônia. Isso representa uma área maior que todo o Estado de São Paulo.

A conclusão faz parte de um estudo desenvolvido pelo CPI (Climate Policy Initiative)/PUC-Rio, junto ao projeto Amazônia 2030, uma iniciativa de cientistas brasileiros em busca de planos de desenvolvimento sustentável para a região. Os resultados do estudo foram apresentados em um evento na Universidade Princeton (EUA) no fim da última semana.

Veja também: Estudo aponta que abertura de ramais na BR-319 destrói Unidades de Conservação e Terras Indígenas

Segundo os pesquisadores, a rodovia deve causar impacto em nove municípios do Amazonas, que, juntos, possuem população superior a 320 mil habitantes. Sob a área de influência da BR-319 estão também 49 Terras Indígenas, 49 Unidades de Conservação e 140 mil km² de florestas públicas não destinadas – terras públicas que não receberam destinação (como se tornar uma Unidade de Conservação, por exemplo) e que costumam ser focos de desmate e grilagem na Amazônia.

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Amazônia

Em geral, estudos de impacto ambiental se baseiam em distâncias físicas para avaliar a área de influência de uma construção, o que é importante para determinar medidas de compensação, mitigação e consultas a populações afetadas (como indígenas). Ou seja, para uma rodovia ou ferrovia, por exemplo, pessoas, animais e terras, em até determinado número de quilômetros, serão afetados.

A distância a ser considerada em cada caso, porém, varia. “A maneira como isso é definido é um tanto arbitrário”, afirma Arthur Bragança, coordenador de avaliação de política pública do CPI/PUC-Rio.
Por isso, o estudo utilizou uma abordagem diferente para apontar a possível área de influência das obras: acesso a mercado. Ou seja, foram considerados os impactos econômicos que o projeto vai causar na região em que se encontra, explica Bragança.

Os 900km da BR-319 são a única rodovia que liga Manaus ao resto do País. Construída, pavimentada e inaugurada, em 1976, durante a ditadura militar, acabou perdendo o pavimento. Desde a década de 1990, obras de melhoria foram realizadas em diversas áreas da rodovia, mas um trecho central, com cerca de 400km de extensão, é tema de controvérsia exatamente pelo seu possível impacto.

O MPF (Ministério Público Federal) tem questionado a realização de audiências públicas sobre o licenciamento desse trecho por, segundo o órgão, não haver estudos de impactos ambientais completos até o momento.

A preocupação é ainda maior porque as estradas costumam levar a um aumento do desmatamento – o Amazonas é o Estado com as áreas mais intocadas de floresta no País. Para Bragança, asfaltar esse trecho muda a acessibilidade a algumas regiões, o que altera a dinâmica econômica do local. “Em particular, para quem tem um pedaço de terra, você muda a decisão de abrir [derrubar] a floresta”, diz ele.

Esse tipo de metodologia de acesso a mercado – já utilizada internacionalmente para projetos de transporte em cidades e comércio internacional – leva em conta os custos em toda a malha de transportes da região (no caso de estradas, sejam elas asfaltadas ou não). Com isso, é possível ver quais áreas devem sofrer maior influência da rodovia.

Veja também: Novo índice atesta que 20% das bacias na Amazônia sofrem alto impacto de atividades humanas

Traçada a área de influência (o que já pode ser feito logo após se ter um desenho da obra), é possível olhar para as áreas impactadas e observar, em cada local, quais são os riscos envolvidos, afirma o pesquisador.

“O objetivo é efetuar infraestrutura de uma forma que não agrida tanto o meio ambiente”, afirma Bragança. “Quase a totalidade dos projetos de construção de rodovias, na Amazônia, historicamente, estão ligados a impactos socioambientais grandes”.

Outros estudos já apontavam que a BR teria uma área de influência equivalente às áreas da Alemanha e Holanda juntos, segundo uma pesquisa do Idesam (Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia).

Nota

Uma nota técnica feita pelo Observatório da BR-319, em abril deste ano, aponta a abertura de cerca de 4.752km de ramais (estradas menores não oficiais), a partir da rodovia, em quatro municípios (Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá), ao sul da estrada.

O Deter, programa do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), apontou em abril uma concentração de áreas de derrubada de floresta ao redor da BR-319. Um levantamento do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) já tinha apontado uma explosão do desmatamento em terras públicas sob o Governo Jair Bolsonaro (PL). A reportagem procurou o Ministério da Infraestrutura, que não respondeu até a publicação desta reportagem.

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