Brasil x Venezuela: entenda diferenças e semelhanças no processo eleitoral


01 de agosto de 2024
Brasil x Venezuela: entenda diferenças e semelhanças no processo eleitoral
Urnas eletrônicas do Brasil e da Venezuela (Composição de Weslley Santos/CENARIUM)
Ana Cláudia Leocádio – Da Cenarium

BRASÍLIA (DF) – A semelhança do sistema eleitoral da Venezuela com o brasileiro é o fato de ser realizado com o uso da urna eletrônica e possibilidade de auditoria dos votos registrados. A diferença é que, no venezuelano, se imprime o voto e deposita-se numa urna ao lado. Segundo a professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Carolina Pedroso, as divergências que estão acontecendo agora não se dão em relação ao depósito do voto impresso nas urnas, mas como os dados foram extraídos e contabilizados ao final da votação.

O resultado das eleições venezuelanas, que anunciou a reeleição do presidente Nicolás Maduro ao terceiro mandato, , no último domingo, 28, está sendo contestado após uma série de irregularidades apontadas pela oposição, que tinha como candidato o diplomata aposentado Edmundo González. Maduro foi declarado presidente com 51,2% dos votos, enquanto 80% dos votos foram apurados e as atas de votação não foram divulgadas.

Centro de votação na Venezuela (Reprodução/Horacio Villalobos Corbis/Corbis via Getty Images)

Uma mudança na Constituição da Venezuela instituiu o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), entre os cinco poderes da República, responsável pelos processos eleitorais, plebiscitos e referendos realizados periodicamente no P aís, onde o voto não é obrigatório. Lá, o mandato é de seis anos, sem limite para a reeleição e sem a realização de segundo turno. O pleito é realizado em apenas uma rodada de votação.

Processo de votação

No Brasil, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) faz parte do Poder Judiciário, um dos Três Poderes independentes da República, e é responsável por todo o processo eleitoral. No sistema brasileiro, o mandato é de quatro anos, com direito a apenas uma reeleição e realização de segundo turno quando não se atinge 50% mais um dos votos na primeira votação.

Urna eletrônica usada para eleições no Brasil (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

No dia da votação, ambos os países usam urna eletrônica. Na Venezuela, o eleitor deve apresentar documento de identificação, cujo número é digitado em uma máquina. Em seguida, há uma autenticação biométrica e a urna é liberada. O eleitor, então, precisa selecionar a foto do candidato que deseja votar. Aparecem várias fotos porque o sistema indica os candidatos apoiados por partidos. Após o eleitor confirmar o voto, a urna imprime um comprovante, que é dobrado e depositado em outra urna, para posterior conferência.

Na votação brasileira, o votante apresenta o título de eleitor ou documento de identidade, o mesário localiza o nome na lista e digita o número do título na máquina e libera a urna para votação. O eleitor digita o número do candidato na máquina, confere se a foto que aparece na tela condiz com o escolhido, aperta a tecla confirma ou corrige, conclui a votação, recebe o comprovante de votação e deixa a sala.

Contestações na Venezuela

É o encerramento da votação que está causando contestações na Venezuela, segundo explicou à CENARIUM a professora da Unifesp, Carolina Pedroso, porque a oposição está cobrando transparência das atas de votação, documentos que registram os votos em cada centro de votação de todo o País. No final do dia, essas atas são extraídas das urnas nos centros de votação, mas esse processo precisa ser testemunhado pelos representantes dos partidos in loco, o que, segundo a oposição, não aconteceu plenamente.

“Em centros de votação-chave, para a oposição, essas testemunhas teriam sido impedidas de verificar a extração dos dados e envio para o sistema central do Conselho Nacional Eleitoral, e surgiram também denúncias de sumiço de urnas, ou seja, criou-se uma dúvida sobre se todos os votos foram contabilizados naqueles números apresentados oficialmente e se a transmissão dos dados ocorreu de forma correta, pois o próprio governo alega que sofreram um ataque hacker como justificativa para a demora no anúncio que, em tese, não deveria ter ocorrido”, complementou Pedroso.

Cédula de papel (Reprodução/Getty Images)

Com tantas contestações, a Organização dos Estados Americanos (OEA) anunciou, nessa terça-feira, 30, não reconhecer o resultado das eleições na Venezuela. A instituição afirma que há “vícios, ilegalidades e más práticas” no processo eleitoral, considerado tendencioso e a serviço de Maduro. Afirmou, ainda, que “o regime ignora a vontade da maioria expressa nas urnas por milhões de homens e mulheres”.

Resultado é pior cenário para o Brasil

Na avaliação da professora da Unifesp Carolina Pedrosa, o resultado eleitoral na Venezuela configura-se num dos piores cenários para o Brasil, porque fica difícil respaldar a legitimidade do regime e reincorporar a Venezuela à institucionalidade regional, como o retorno do País ao bloco do Mercosul, de onde está suspensa pela cláusula democrática, desde dezembro de 2016.

“Ao mesmo tempo, há o fator de política interna na mesa, pois o tema da Venezuela polariza bastante a nossa própria população, e a base aliada do governo que é heterogênea. De um lado, parte da esquerda reconhece o processo lá e pressiona o governo a fazê-lo, de outro há uma forte contestação dos resultados que Lula tampouco pode ignorar”, analisa Pedroso.

Por outro lado, o quadro eleitoral no País vizinho também afeta a imagem do Brasil como liderança regional, reforça a professora, que já foi bastante eficaz em outros governos petistas, em mediar conflitos na região e evitar suas escaladas. “Eu tenho dito há algum tempo que a Venezuela é o maior desafio diplomático do Brasil e deve continuar sendo por um bom tempo”, afirmou.

“Ouso dizer que é um desafio que se colocou também por uma postura errática do Brasil, não de agora, mas desde, pelo menos, 2013. Nós nunca soubemos bem como lidar diplomaticamente com Maduro, nem com Dilma, nem com Temer, nem com Bolsonaro e, pelo que estamos vendo, nem com Lula novamente”, concluiu.

Leia mais: Itamaraty emite alerta para brasileiros na Venezuela após protestos
Editado por Adrisa De Góes

O que você achou deste conteúdo?

VOLTAR PARA O TOPO
Visão Geral de Privacidade

Este site usa cookies para que possamos oferecer a melhor experiência de usuário possível. As informações dos cookies são armazenadas em seu navegador e executam funções como reconhecê-lo quando você retorna ao nosso site e ajudar nossa equipe a entender quais seções do site você considera mais interessantes e úteis.