Calor e poluição matam mais de 63 mil brasileiros por ano, aponta The Lancet
Por: Fred Santana
31 de outubro de 2025
MANAUS (AM) – A combinação entre aquecimento global e dependência de combustíveis fósseis está custando caro à saúde, à economia e ao futuro dos brasileiros. O novo relatório The Lancet Countdown on Health and Climate Change 2025 mostra que mais de 63 mil pessoas morrem anualmente no Brasil em razão da poluição atmosférica, sendo 24 mil mortes diretamente ligadas à queima de carvão, petróleo e gás.
Segundo o estudo, divulgado na última terça-feira, 28, o País vive uma crise silenciosa em que o clima e a saúde se entrelaçam de forma cada vez mais perigosa. “O levantamento deste ano traça um retrato sombrio e inegável dos danos à saúde em todo o mundo, com recordes de calor, eventos extremos e fumaça de incêndios florestais ceifando milhões de vidas”, afirmou Marina Romanello, diretora-executiva do Lancet Countdown na University College London.
Romanello alertou que a destruição de vidas e meios de subsistência continuará a crescer enquanto não for superada a dependência dos combustíveis fósseis e não houver aceleração nas medidas de adaptação.

Secas e calor extremo: o Brasil em alerta
Os dados da publicação indicam que 72% do território brasileiro enfrenta, atualmente, ao menos um mês de seca severa por ano, um aumento quase dez vezes maior em relação à década de 1950. Além disso, o País tem registrado crescimento acelerado das mortes e perdas econômicas ligadas ao calor extremo.
Em 2024, 6,7 bilhões de horas de trabalho foram perdidas devido às altas temperaturas, principalmente nos setores de agricultura e construção, o que resultou em R$ 91 bilhões (US$ 17,7 bilhões) em prejuízos – valor equivalente a quase 1% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Entre 2012 e 2021, o Brasil registrou 3,6 mil mortes anuais relacionadas ao calor, número 4,4 vezes maior do que o observado entre 1990 e 1999.
“Já temos as ferramentas necessárias para evitar uma catástrofe climática, e comunidades e governos locais em todo o mundo estão provando que o progresso é possível”, destacou Romanello. A diretora-executiva ressaltou que é preciso manter o ritmo, pois encerrar rapidamente o uso de combustíveis fósseis continua sendo a alavanca mais poderosa para desacelerar o aquecimento e proteger vidas.
O relatório aponta que a fumaça de queimadas causa 7.700 mortes anuais no País e que o risco de incêndios florestais aumentou 10% na última década. A temperatura da superfície do mar na costa brasileira está 0,65 °C acima da média de 1981 a 2010, o que ameaça ecossistemas e cadeias pesqueiras.

Transição energética e custo humano
O atraso na transição energética tem produzido impactos severos. Em 2023, o Brasil apresentou receita líquida negativa de carbono, gastando R$ 24 bilhões (US$ 4,6 bilhões) em subsídios para combustíveis fósseis, valor superior ao arrecadado com políticas de precificação de carbono.
Embora as emissões de CO₂ da queima de combustíveis fósseis tenham caído 1,5% entre 2016 e 2022, 77% da energia usada no transporte ainda vêm dessas fontes, e a eletrificação da frota segue em estágio inicial.
“O aumento da acessibilidade e da competitividade da energia limpa é uma oportunidade para reduzir os danos à saúde causados pelos combustíveis fósseis e redirecionar subsídios para um futuro mais saudável”, afirmou Romanello.
O documento também aponta a ampliação de riscos sanitários. O potencial de transmissão de dengue por mosquitos Aedes aegypti aumentou 30% desde os anos 1950, e 1,08 milhão de brasileiros vivem a menos de um metro acima do nível do mar, em áreas suscetíveis à elevação oceânica.
“Estamos vendo impactos múltiplos que se somam e geram uma cascata de danos que enfraquecem as bases sociais e econômicas da saúde. Esses prejuízos são o preço da omissão prolongada dos líderes globais – pago de forma mais severa por países vulneráveis que menos contribuíram para a crise”, resumiu o cenário com um alerta severo a diretora do Lancet Countdown Latin America, Stella Hartinger.
O relatório conclui que os custos humanos e econômicos da inação climática estão cada vez mais evidentes e que investir em energias limpas, agricultura sustentável e adaptação urbana é essencial para salvar vidas e fortalecer a economia.