Câmara aprova em 2° turno texto-base da ‘PEC Kamikaze’ que permite benefícios em ano eleitoral
13 de julho de 2022
Plenário da Câmara dos Deputados (Elaine Menke/Câmara dos Deputados)
Com informações da FolhaPress
BRASÍLIA – Em uma vitória do governo, os deputados mantiveram a expressão “estado de emergência” no texto da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que cria um vale para caminhoneiros e taxistas, dobra o valor do Auxílio Gás e amplia o Auxílio Brasil para R$ 600 até o fim do ano, a um custo estimado em R$ 41,25 bilhões.
A expressão foi a solução encontrada para permitir que o presidente Jair Bolsonaro (PL) fure o teto de gastos e crie novos benefícios sociais a poucos meses da votação para a Presidência, sem ferir a lei eleitoral.
No primeiro turno, o texto-base foi aprovado na noite de terça-feira, 12, por 393 a 14 — eram necessários ao menos 308 votos. Nesta quarta-feira, 13, os deputados rejeitaram, por 361 votos a 142, o destaque para suprimir a expressão “estado de emergência” do texto.
Na votação em segundo turno, o texto-base foi aprovado por 469 a 17 — precisava, de novo, de ao menos 308 votos. Como não houve mudança de mérito em relação ao Senado, a PEC segue para promulgação — o que deve ocorrer nos próximos dias.
Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chega ao Congresso (Gabriela Biló/FolhaPress)
Ao final da votação, o ministro Ciro Nogueira (Casa Civil) foi à Câmara cumprimentar Lira. Ele afirmou que a aprovação já era esperada. “Sabia que a oposição ía tentar retardar, mas não tem como você votar contra isso”, disse.
Ele rebateu ainda as críticas de que a PEC é eleitoreira e afirmou que o objetivo é “ajudar a pessoas”. “Uma medida que foi votada quase que por unanimidade no Congresso quem pode ser contra?”
A PEC é uma das apostas de Bolsonaro para tentar melhorar seu desempenho nas pesquisas de intenção de voto. Atualmente, ele aparece em segundo lugar, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A votação ocorreu um dia após Lira suspender a sessão por causa de falhas na internet e inconsistências no sistema de votação da Câmara dos Deputados. A Polícia Federal abriu investigação preliminar para apurar os problemas técnicos.
Nesta quarta-feira, Lira baixou um ato da mesa diretora para retomar as sessões virtuais para tentar finalizar a votação da PEC. Até então, os deputados precisavam vir a Brasília e usavam a impressão digital para registrar presença. Depois, poderiam usar o aplicativo Infoleg para votar remotamente na sessão daquele dia.
Com a sessão virtual, os deputados podem marcar presença com uma senha no plenário digital, sem precisar estar fisicamente em Brasília. A manobra assegurou quórum maior para a votação da PEC, diminuindo risco de derrota do governo em pontos importantes, como uma eventual supressão do estado de emergência do texto.
Na justificativa, Lira disse que manteria a regra para as sessões e reuniões convocadas para as segundas e sextas-feiras até 31 de julho de 2022, “de modo a otimizar os trabalhos da Casa, revelando-se medida ágil, prática e moderna para a finalidade a que se propõe, a par de viabilizar a conciliação dos trabalhos desenvolvidos pelos parlamentares no processo legislativo e em suas bases”.
O anúncio da sessão virtual foi feito por Lira pouco após a retomada da sessão, por volta de 11h. A reunião que transcorria foi encerrada para que a nova, virtual, pudesse ser iniciada.
A oposição reclamou da mudança na regra. “Nós mudarmos a regra do jogo durante o jogo não é um bom sinal, não é um bom precedente”, criticou o deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ). “É como o juiz de futebol no intervalo de um jogo definir que passa a valer gol de mão no segundo tempo. É mais ou menos o que nós estamos vivendo”.
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) qualificou a alteração como “uma ilegalidade flagrante”. “O que temos, agora, é o regimento de Lira. Ontem [terça-feira] a regra era uma, mas, para se garantir a quantidade de votos, mudou-se a regra. Aí, se mudou a regra de novo, suspendendo-se a sessão, que não seria mais por 1 hora, poderia ser no dia seguinte”, afirmou.
“Hoje, para garantir o voto dos seus aliados que estão não sei aonde, muda-se a regra novamente, e tudo pode ser feito de maneira virtual. O que está acontecendo aqui é um descalabro, um absurdo, com o presidente da Câmara, autoritário, fazendo um regimento dele e não o da Câmara.”
Apesar das críticas ao texto, a oposição orientou, favoravelmente, nos dois turnos de votação. Somente o Novo orientou e votou contra a PEC.
A PEC teve a tramitação acelerada por Lira, aliado de Bolsonaro. Em vez de seguir o rito regimental de ter a admissibilidade analisada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) para, só então, ser encaminhado a uma comissão especial para análise do mérito, o texto foi apensado ao da PEC de Biocombustíveis, que já tinha passado pela etapa inicial e estava em comissão especial.
A PEC dos benefícios sociais foi apensada à PEC 15, que acrescenta uma garantia de situação tributária vantajosa para os combustíveis não poluentes ao artigo da Constituição que trata sobre o direito de todos os brasileiros a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
O texto não estabelece exatamente as alíquotas dos tributos que devem incidir sobre os biocombustíveis. Esses percentuais devem ser estabelecidos por meio de lei complementar.
A PEC que amplia benefícios sociais, por sua vez, tem um custo total de R$ 41,25 bilhões — maior que os R$ 38,75 bilhões acertados originalmente.
O custo da ampliação do Auxílio Brasil é estimado em R$ 26 bilhões, de agosto a dezembro. Para dobrar o valor do Auxílio Gás, o custo é de R$ 1,05 bilhão.
A proposta prevê um auxílio financeiro de R$ 2 bilhões a taxistas, concedido entre 1° de julho e 31 de dezembro. A PEC também destina R$ 5,4 bilhões para a criação de um auxílio de R$ 1.000 a caminhoneiros autônomos com vigência entre 1° de julho e 31 de dezembro.
O texto aumenta em R$ 500 milhões a suplementação do programa Alimenta Brasil, que financia a aquisição de alimentos para doação a famílias de baixa renda. Há ainda R$ 2,5 bilhões em transferência para Estados e municípios subsidiarem seus sistemas de transportes públicos.
Medidas da ‘PEC Kamikaze’
Auxílio Brasil vai aumentar para R$ 600
Ampliação de R$ 400 para R$ 600 neste ano; governo também promete zerar a fila;
Custo total de R$ 26 bilhões.
Caminhoneiros terão auxílio de R$ 1.000
Benefício mensal de R$ 1.000 será pago a caminhoneiros autônomos cadastrados na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) até 31 de maio;
Custo de R$ 5,4 bilhões.
Auxílio para taxistas
Auxílio até 31 de dezembro de 2022, aos motoristas de táxi devidamente registrados até 31 de maio de 2022. PEC não traz valor do benefício;
Custo de até R$ 2 bilhões.
Auxílio gás de R$ 120
O valor do benefício pago a cada dois meses vai dobrar para cerca de R$ 120 por bimestre;
Atualmente, o benefício é de 50% do valor médio do botijão de 13kg (considerando a média dos últimos seis meses);
Custo de R$ 1,05 bilhão.
Verba para o transporte gratuito para idosos
Autorizar repasse de verba para bancar gratuidade para idosos no transporte público municipal e intermunicipal, em regiões metropolitanas. Gratuidade prevista em lei já está em vigor, atualmente;
Custo de R$ 2,5 bilhões.
Repasse de verba para o setor do etanol
Repasse a Estados para compensar cortes em alíquotas de tributos sobre o etanol e manter a competitividade do combustível na comparação com a gasolina;
Custo de R$ 3,8 bilhões.
Suplementação para o Programa Alimenta Brasil
Repassará mais recursos ao programa, antes chamado de Programa de Aquisição de Alimentos;
Custo de R$ 500 milhões.
Decretação de Estado de Emergência
Possibilita o pagamento de novos benefícios como o auxílio para caminhoneiros, mesmo em ano de eleição;
Estado de emergência visa proteger o governo em casos de questionamentos jurídicos por infração à legislação eleitoral.
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