Carauari é um dos interiores do Amazonas com menos contaminação por Covid-19

Até segunda-feira, 18, o município de 28 mil habitantes à beira do rio Juruá registrava 158 casos confirmados e 2 óbitos pela Covid-19. (Divulgação)

Fabiano Maisonnave / Folhapress

Semanas atrás, o prefeito de Carauari (787 km em linha reta de Manaus), Bruno Ramalho (MDB), distribuiu, via WhatsApp, o seguinte recado aos moradores: “Quanto mais vocês ficarem em casa, melhor vai ser pro município fazer esse controle. Menos morte teremos. Mas, se não quiserem ficar em casa, quiserem ficar na rua, quiserem levar a coisa na molecagem, a gente trouxe caixão também. A opção é sua, irmão”.

A ação da prefeitura de Carauari contra a Covid-19 não se resumiu à mensagem dura. Com um plano de contingência em mãos, o município adotou medidas rígidas de isolamento social, principalmente aos passageiros de barco (não há acesso rodoviário), e criou uma estrutura de média complexidade para evitar ao máximo a necessidade de remoção para Manaus, a única cidade do Amazonas com UTI.

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A estratégia tem dado certo: até segunda-feira, 18, o município de 28 mil habitantes à beira do rio Juruá registrava 158 casos confirmados e 2 óbitos pela Covid-19. A taxa de letalidade é de 1,28%, bem menor do que a média do Amazonas, de 6,85%. Os dados são da Secretaria de Saúde estadual e da prefeitura.

“Carauari chama a atenção pela baixa letalidade e pelo baixo número de casos”, afirma o infectologista Bernardino Albuquerque, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e da Fundação de Medicina Tropical (FMT). “Parece que houve uma organização maior para preparar a estrutura do atendimento, via hospital local de retaguarda. E a grande maioria está sendo atendida na atenção primária.”

O secretário de Saúde de Carauari, José Maria Santiago, afirma que, com o repasse de recursos federal e estadual, o município montou três leitos UCI (Unidade de Cuidado Intensivo) e quatro cápsulas “Vanessa” – feitas em Manaus com tubos de PVC e vinil plástico e equipadas com filtro para controle da temperatura e umidade do oxigênio.

“Criamos uma estrutura para evitar a necessidade de remoção, que só é feita quanto tem um leito disponível em Manaus, e isso não está sendo fácil”, afirma.

Por causa do tipo de avião, de pequeno porte, a viagem entre Carauari e Manaus dura três horas. Os dois pacientes que vieram a óbito foram removidos – um deles morreu durante o voo neste domingo, 17. O governo do Amazonas dispõe de seis UTIs aéreas, e cada uma realiza somente um resgate por dia.

Por causa da urgência, o transporte aéreo também leva parte dos insumos médicos. Na sexta-feira, 15, a prefeitura pagou R$ 25 mil para transportar 15 cilindros de oxigênio de Manaus. Outros 31 cilindros seguiram de balsa, uma viagem que dura sete dias.

Barcos e contágio

Na maioria dos municípios do interior do Amazonas, o acesso é principalmente fluvial. Apesar de a proibição de transporte de passageiros estar em vigor desde o final de março, barcos clandestinos continuam circulando e espalhando a doença, que hoje está em 60 das 62 cidades do estado.

Em Carauari, a prefeitura enviou equipes médicas a dois barcos com moradores que chegaram de Manaus, ambos no final de março. Um terceiro barco de passageiros, este clandestino, também trouxe infectados com coronavírus da capital.

Os cerca de cem passageiros desses três barcos passaram por um período de isolamento social, incluindo os médicos e enfermeiros embarcados, em períodos de 14 a 25 dias.

Além disso, há o toque de recolher na cidade entre 21h e 5h. A cidade cumpre o decreto estadual de fechamento do comércio não essencial.

“Na questão da prevenção, iniciaram muito cedo a quarentena longe do porto e tiveram um processo de fiscalização efetivo. O isolamento social tem funcionado bem, e isso vai redundar num número de casos bem menor”, afirma Albuquerque, que já comandou a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS) do governo estadual.

A vigilância sanitária de Carauari faz busca ativa também nas balsas de carga, que têm levado material médico. No caso mais recente, no último sábado (16), 9 dos 12 tripulantes testaram positivo. Todos estão isolados na cidade.

Futuro próximo

O infectologista afirma que é preocupante a situação do interior do Amazonas, onde os casos vêm crescendo em uma velocidade maior do que em Manaus.

Dos 20.913 casos confirmados no Amazonas até segunda, 10.253 são do interior (49%). Com relação ao número de óbitos, esses municípios registram 32% das vítimas da Covid-19.

“Os municípios não tiveram condições de se preparar para receber uma demanda que exige uma complexidade maior do atendimento”, afirma Albuquerque. “Outro problema sério é a remoção. Há municípios cujo único acesso é fluvial. Não há como deslocar paciente num barco que demora até sete dias para chegar à capital.”

Com relação, a Manaus, que tem registrado queda no número de mortes e o desafogo do sistema de saúde, Albuquerque ressalvou: “Não temos nenhum dado seguro para que nós possamos dizer que o pior já passou”.

“A informação mais segura que temos é a do número de mortos na capital. Mas precisamos analisar com certa prudência porque vimos, nas últimas, semanas, houve um investimento do governo federal, do estado, do município. Houve uma ampliação do número de leitos, respiradores. Além disso, a atenção médica melhorou bastante”, afirmou.

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