CARTA AOS ARTISTAS – ‘Caso Lei Aldir Blanc’: o Jornalismo no combate à desigualdade

Aos artistas contemplados e não contemplados pela Lei Aldir Blanc do Amazonas

A REVISTA CENARIUM é um veículo de comunicação online e impresso que tem como principais diretrizes o respeito à pluralidade de pensamento e o combate à desigualdade em todos os âmbitos, considerando que todos, sem exceção, são iguais perante a Constituição Federal. Todos estão passíveis de investigação pelos órgãos de controle e isso inclui artistas, jornalistas, empresários, servidores públicos, políticos com mandato eletivo ou não.

Para nós, não há “intocáveis” e isso foi provado nas matérias sobre a última operação da Polícia Federal (PF) que apurou denúncias na Saúde, envolvendo o chefe do Executivo Estadual. Foi comprovado ainda com as matérias publicadas pela revista, com exclusividade, que levaram os órgãos de controle a debater a questão polêmica sobre a segunda dose dos “fura-filas” da imunização da Covid-19, inserindo o prefeito de Manaus.

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Com audiência nacional e tendo como fontes cientistas, professores, mestres e membros de órgãos de fiscalização, a CENARIUM possui uma equipe de 27 profissionais técnicos em diversas áreas, além de 11 jornalistas. As decisões tomadas pela revista são levadas a um conselho interno que debate e avalia seu conteúdo, considerando a grande responsabilidade social e abrangência que o veículo possui.

Dessa forma, procedeu-se com a matéria  Lei Aldir Blanc em Manaus: filha de Amazonino recebeu R$ 60 mil e R$ 4 milhões a 30 artistas; não contemplados precisam de ajuda publicada na última sexta-feira, 19, e que rendeu polêmica entre os artistas contemplados e não contemplados pela Prefeitura de Manaus.

Após a publicação dessa matéria-matriz, a revista recebeu dezenas de outras informações sobre novas peculiaridades dos contemplados pela lei que disponibilizou mais de R$ 40 milhões a profissionais das artes pelo município e governo do Amazonas, via Secretaria de Estado de Cultura (SEC).

Informações essas que foram parar nas mãos de membros dos órgãos de controle nas esferas estadual e federal e nos permitirá dar continuidade ao assunto nas próximas semanas. Para início, vamos citar uma parte dos dados nesta Carta Aberta aos Artistas do Amazonas.

Vulnerabilidade social

Em sua origem, a Lei Aldir Blanc (14.017/2020), debatida no Congresso Nacional, teve caráter social e humanitário, conforme reiterado no Artigo 2º., Inciso I, assim descrito: 

Art. 2º A União entregará aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, em parcela única, no exercício de 2020, o valor de R$ 3.000.000.000,00 (três bilhões de reais) para aplicação, pelos Poderes Executivos locais, em ações emergenciais de apoio ao setor cultural por meio de:

I – renda emergencial mensal aos trabalhadores e trabalhadoras da cultura;

Diferentemente de outros projetos e programas culturais já em andamento, a verba (federal) da Lei Aldir Blanc tinha caráter emergencial, voltada a auxiliar artistas afetados pela pandemia e que não tinham outra renda, além daquela obtida pela sua arte.

Art. 1º. Esta Lei dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo no. 6, de 20 de março de 2020.

Legalidade e moralidade

Nos editais do município e do governo, o caráter humanitário do destino da verba foi citado, mas não norteado pelos seus responsáveis e o resultado foi um DERRAME de recursos públicos concentrados nas mãos de (alguns) artistas considerados de “elite” por ligações familiares com políticos e gestores públicos ou pela “influência” que possuem no meio social e/ou ainda pela disponibilidade de números de registros no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJs).

Poderíamos parar em um único exemplo nesta carta que coloca sob suspeita todo o processo da verba municipal, em tese, fiscalizada pelo Conselho Municipal de Cultura (Concultura), que concedeu, em novembro do ano passado, R$ 20 milhões, sendo R$ 14 milhões em verba federal.  

Um dos conselheiros do Concultura, Ian Carvalho, participou do processo de seleção de entidades ligadas ao próprio pai, Dudson Carvalho, presidente do  Grupo de Acesso Oficial da Cultura Popular (Gao). Do Grupo de Acesso, os grêmios recreativos escola de samba Unidos do Alvorada e Unidos da Cidade Nova receberam, juntos, R$ 200 mil da prefeitura.

Ian Carvalho e Dudson Carvalho: filho, pai e a verba da Lei Aldir Blanc (Facebook)

Além de haver uma comissão com apenas três pessoas, o processo de avaliação passava por todos os membros do conselho na etapa final. A ligação de parentesco de pai e filho é considerada ilegal pelo edital da Lei Aldir Blanc da prefeitura de Manaus.

Trecho do edital de seleção da Prefeitura de Manaus para a Lei Aldir Blanc (DOM)
Lista de conselheiros municipais de Cultura (DOM)

Atualmente, está sendo investigado se a inserção do Grêmio Unidos da Cidade Nova desclassificou o Grupo Auto de Natal das Pastorinhas, do artista Otávio Rodrigues da Silva, que envolve 40 brincantes e ajuda no sustento de 100 famílias em vulnerabilidade social.

A reportagem tentou ouvir Ian e Dudson Carvalho com mensagens em aplicativos de conversa e ligações celulares. As mensagens foram visualizadas, mas não foram respondidas, e as ligações não atendidas.

Diário Oficial do Município com o Grupo das Pastorinhas contemplado (DOM)
Nova publicação exclui o Grupo das Pastorinhas e insere os grêmios recreativos de escola de Samba (DOM)

Projeto de resgate

Procurado pela CENARIUM, Otávio, que tem mais de 45 anos dedicados à cultura do Amazonas, disse que se sentiu injustiçado. “O projeto foi contemplado em um dia e depois foi excluído. Eu tive mais pontos que muitos contemplados, não entendi nada. Foi uma grande injustiça”, disse.  

Otávio Di Borba: representante do Grupo das Pastorinhas foi excluído pelo Concultura e não soube o motivo (Secom)

Otávio Di Borba, como é conhecido, faz um belo trabalho no resgate da história folclórica do Amazonas, mas pode – objeto de investigação – ter sido barrado por sua falta de influência política.

Na bela matéria do Site Amazônia Real, a escritora Elvira Eliza França conta um pouco da história do Grupo das Pastorinhas, que já serviu de pauta positiva para o Amazonas no programa Fantástico da Rede Globo.

Os invulneráveis 

Assim como Otávio Di Borba, outros artistas – e representantes de instituições culturais – sem parentesco com membros do Conselho de Cultura, sem laços familiares com políticos, sem cargos comissionados e/ou sem capital de giro, amargaram a reprovação de projetos seja por falta de lobby seja por falta de recursos para custear uma equipe técnica para a elaboração das propostas.

Isso não aconteceu com o presidente do Casarão de Ideias, João Fernandes, que com dois CNPJs, arrematou mais de R$ 830 mil do governo e prefeitura, no ano passado, pela Lei Aldir Blanc. Hoje, ele pleiteia ainda uma emenda parlamentar municipal de R$ 570 mil, totalizando um montante de R$ 1,4 milhão para sua instituição em menos de quatro meses.

Em direito de resposta à REVISTA CENARIUM, João diz que não é obrigado a prestar contas à sociedade no site oficial de sua instituição, onde ele também não informa quantas pessoas emprega em cada projeto e como as produções chegam à população, independentemente, da classe social.

Presidente da Associação Casarão de Ideias, João Fernandes (Reprodução/Facebook)

Também beneficiado pela Lei Aldir Blanc estadual no ano passado, Márcio Braz dos Santos Santana era diretor da Fundação Municipal de Cultura (ManausCult) e recebia um salário de R$ 9 mil. Ele foi contemplado com R$ 200 mil.

Márcio Braz até o 31 de dezembro de 2020 foi diretor da Manauscult (Facebook)

Confrontado pela primeira matéria, Márcio desejou “morte social” à REVISTA CENARIUM. Procurado pela reportagem, ele não enviou resposta.

Post de Márcio Braz no Facebook
Nomeação de Márcio Braz para Manauscult (DOM)
Verba liberada para o então diretor de Cultura da Manauscult em novembro do ano passado (DOE)

Outro contemplado pela Lei Aldir Blanc que pediu a “morte” da CENARIUM – empresa que emprega quase 30 pessoas e produz, diariamente, dezenas de matérias de cunho social, ambiental – foi Douglas Rodrigues, responsável pela Estação Arte&Fato.

(Post de Douglas Rodrigues no Facebook)

Ele recebeu R$ 70 mil para escrever o livro “Triologia: o outro entre nós – A estrada flecha borboleta e casa d’água”. Procurado, Douglas não respondeu se prestou contas do dinheiro público.

Verba municipal para Douglas Rodrigues (DOM)
Verba estadual para Douglas Rodrigues (DOE)
Douglas Rodrigues (Facebook)
Douglas Rodrigues em viagens internacionais (Facebook)

A revista lamenta que representantes da arte no Amazonas usem palavras de POBREZA CONCEITUAL para demonstrar sua insatisfação com uma matéria jornalística ao invés de buscar meios legais para se manifestarem.

Grécia e alto escalão

Já artista circense Lis Nobre, radicada na Grécia, recebeu um total de R$ 150 mil pela Lei Aldir Blanc, sendo R$ 100 mil de verba estadual para o projeto “Montagem, Espetáculo Sisma – Uma realização Intercultural em Circo Contemporâneo.”

Verba municipal para a artista da Grécia, Lis Nobre (DOM)
Verba estadual para a artista da Grécia, Lis Nobre (DOE)

Procurada pela reportagem, ela ressaltou o legado dela para a cultura do Amazonas. Veja a reposta aqui.

O delegado Pontes Filho, da Polícia Civil do Amazonas, também, foi contemplado pela Lei Aldir Blanc estadual com um recurso de R$ 100 mil. Ele se inscreveu com o projeto literário “Livro-Ebook e Oficina de Formação Sociocultural da Amazônia Colonial”.

Verba estadual para o delegado Pontes Filho (DOE)

Para a reportagem, o delegado disse que o processo seguiu os trâmites legais e que o valor tem um desconto de imposto de renda de 27,5%. Veja a resposta.

Verba para lives

Personagem da primeira matéria sobre o tema, a artista Anália Nogueira recebeu R$ 150 mil pela Lei Aldir Blanc municipal para produzir videoclipes culturais, mas por conta da pandemia, organizou lives. Veja a justificativa dela aqui.

Verba municipal para Anália Nogueira (DOM)
As lives de Anália Nogueira foram transmitidas no perfil Neon do Norte que tem 362 seguidores (Instagram)

A cantora Márcia Novo, também citada na matéria anterior da REVISTA CENARIUM por ter recebido R$ 130 mil para produzir lives, procurou a revista para fazer esclarecimentos à sociedade, conforme direito de resposta.

Mesmo não citada pela CENARIUM, a Federação de Teatro do Amazonas (Fetam) se posicionou em favor dos artistas beneficiados pela Lei Aldir Blanc no Amazonas em nota de repúdio à revista. A Fetam, que recebeu R$ 80 mil de verba municipal pela lei, não esclarece informações sobre prestação de contas.

Prestação de Contas

A reportagem entrou em contato com o Conselho Municipal de Cultura em Manaus e foi informada que 58% dos contemplados pela Lei Aldir Blanc prestaram contas de seus trabalhos.

Os artistas que receberam entre R$ 5 mil e R$ 150 mil de verba pública do município tinham até o dia 31 de dezembro do ano passado para prestarem contas.

Procurado, o Concultura colocou-se à disposição para prestar os esclarecimentos necessários, informando que ainda avalia os processos aprovados pela gestão passada.

Ofensas e intimidação

Filha do ex-governador Amazonino Mendes e ex-secretária da Manauscult, Lívia Mendes, que recebeu R$ 60 mil, da Manauscult, por meio do Conselho de Cultura, fez um esclarecimento em suas redes sociais.

Após a publicação da primeira matéria sobre o assunto e dando a Lívia Mendes o direito de resposta, o jornalista Fabrício Nunes (que se identificou para a revista como assessor de imprensa de Lívia) passou a publicar ofensas de baixo calão aos colaboradores da CENARIUM nos perfis pessoais dos funcionários da revista.

Palavras ofensivas publicadas por Fabrício Nunes aos jornalistas da REVISTA CENARIUM (Instagram)

O jornalista recebeu um total de R$ 60 mil da prefeitura de Manaus pela Lei Aldir Blanc para dois projetos: “Elas cantam samba – É coisa de Deus” e para o livro “Zezinho Corrêa: Eu quero é tic tic tac”.  

Verba municipal para Fabrício Nunes (DOM)
Verba estadual para Fabrício Nunes (DOE)

Por ter publicado ofensas e sem fazer qualquer abordagem técnica em defesa de sua assessorada ou de si próprio, Fabrício Nunes será denunciado por difamação e calúnia e responderá em processo criminal.  

O verdadeiro Jornalismo

A REVISTA CENARIUM ressalta que nem ofensas nem o proselitismo farão parar seu trabalho de Jornalismo Investigativo e reafirma seu compromisso com a sociedade e não com grupos que usam de meios sórdidos para intimidar jornalistas no exercício de sua função. Cabe, agora, aos órgãos de controle, como Controladoria-Geral da União (CGU), Ministério Público Federal (MPF) e Polícia Federal (PF) investigarem.

Desserviço ao Jornalismo e à população fazem aqueles que acobertam suspeitas e tornam o País pior em distribuição de renda, concentrando nas mãos de poucos abastados recursos que poderiam ser redistribuídos de forma mais justa, um cenário tão bem representado pelos próprios artistas em crônicas e músicas.

Manaus (AM), 21 de fevereiro de 2020

Paula Litaiff | REVISTA CENARIUM

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Contemplados pela Lei Aldir Blanc no AM

Esfera Municipal | Manaus

Esfera Estadual

Observações gerais:

1) Contribuíram na Carta aos Artistas, o repórter Gabriel Abreu, o designer Samuelknf e a revisora Gracy Oliveira.

2) O adiamento da publicação se deu a pedido dos artistas citados, que solicitaram tempo para elaborarem seus direitos de respostas.

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