Cartilha orienta adolescentes LGBTQIAPN+ expulsos de casa; ‘instrumento contra preconceito’


03 de setembro de 2024
Cartilha orienta adolescentes LGBTQIAPN+ expulsos de casa; ‘instrumento contra preconceito’
Imagem mostra duas pessoas reagindo a uma terceira pessoa LGBTQIAPN+ (Composição: Paulo Dutra/CENARIUM)
Gabriel Abreu – Da Cenarium

MANAUS (AM) – A rejeição familiar é uma das experiências mais dolorosas para a comunidade LGBTQIAPN+ principalmente para adolescentes que em alguns casos são expulsos de casa por conta da orientação sexual. Alguns direitos estão resguardados de acordo com o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). A cartilha foi criada pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (Tjam) e pela Universidade do estado do Amazonas (EUA) e apresenta conceitos, além de explicar alguns dos direitos garantidos a adolescentes com orientação sexual diversa que sofrem discriminação dentro da própria casa.

Todo ser humano deve ser respeitado e o artigo 17 do ECA assegura a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, identidade,
autonomia, valores, ideias e crenças.

A cartilha ‘Lar é Direito!’ elaborada pelo juiz Saulo Góes Pinto e pelo professor doutor da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) Denison Melo Aguiar tem o intuito de esclarecer os direitos desses jovens e oferecer orientações práticas sobre como buscar ajuda. A Organização Mundial da Saúde (OMS) entende que a homossexualidade, bissexualidade e outras formas de orientação sexual não constituem doença, desvio psicológico ou transtorno, sendo livres manifestações da sexualidade humana, do lado da heterossexualidade.

O juiz Saulo Góes Pinto explicou que a cartilha tem a finalidade de fazer uma educação para que não haja violações de direitos humanos relacionados à população LGBTQIAPN+, porque o desafio é fazer com que a população não normalize e nem naturalize violações de direitos humanos contra a população LGBTQIAPN+, porque é a partir daí que é percebido o quão importante são.

Juiz Saulo Góes Pinto (Reprodução)

“Tivemos relatos envolvendo a expulsão de adolescentes de casa. Nós tivemos acesso também a informações com a Casa Amiga, uma casa de acolhimento, que acolhe pessoas maiores de idade. Então nós ouvimos relatos de adolescentes expulsos de casa. Com base na orientação sexual, e vimos que era uma área que estava merecendo atenção do nosso município. Então nós compilamos informações para garantir a integridade desses jovens para que eles possam buscar ajuda na violação desses direitos humanos.”, explicou o magistrado.

Preocupação

O professor doutor Denison Aguiar destacou à CENARIUM foi um momento impar para a sua vida fazer parte da cartilha. Por meio da perspectiva da escola, dos períodos da magistratura do Amazonas e do juiz Saulo, ele percebeu que começou a haver uma sensibilidade também pela população LGBTQIAPN+, por parte do tribunal.

“Fazer parte da cartilha para mim foi um momento ímpar na minha vida, pois vejo que, por meio da perspectiva da Escola Superior da Magistratura do Amazonas e do Doutor Saulo, percebo que se consolida uma sensibilidade desta com população LGBTQIAPN+. Isso é muito importante, pois o tribunal se mostra preocupado com esta população. Como coordenador da clínica de direito LGBTQIAPN+ da UEA, vinculado à Escola do Direito, isso significa uma união entre o TJ, a ESMAM e a UEA. Eu gostaria que pudéssemos começar a pensar o estado do Amazonas e as populações vulneráveis que aqui estão de uma maneira unida. É essa união que nos fará consolidar quem somos e como nos apresentamos. Para mim, foi um momento de muita realização profissional e pessoal.”, destacou Aguiar.

A cartilha também informa que a “cura gay” ou terapia de conversão, é proibida. O Conselho Federal de Psicologia (CFP) e o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecem que a homossexualidade não é uma doença e que esses procedimentos são ilegais e ineficazes.

Para os jovens que enfrentam discriminação e expulsão, a cartilha oferece informações de contato da Defensoria Especializada em Direitos Humanos, incluindo o endereço, telefone e e-mail. Esses recursos estão disponíveis para fornecer apoio e orientação legal aos adolescentes.

A cartilha é uma realização conjunta do Tjam – por meio da Escola Superior da Magistratura (Esmam), Escola Judicial (Ejud) e Comissão de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Moral, Assédio Sexual e à Discriminação – em parceria com a Defensoria Pública Estadual (DPE) e da UEA.

Recomeço

Para quem sentiu na pele a rejeição e ter que viver na rua por conta da família não aceitar a orientação a vida mostra um caminho desafiador. Foi o caso da educadora social Bruna Assipal, ela foi expulsa de casa e teve que passar um mês na rua. Ela foi acolhida e atualmente mora na Casa Miga.

“Eu fui expulsa, sim, pela orientação sexual e também por causa de que não estava trabalhando, né? E devido à pandemia também, né? Foi bem no meio da pandemia. E eu fui para… fui morar… morar não. Vamos dizer assim. Não tinha para onde ir e fui morar na Praça dos Remédios. Em menos de um mês por lá, eu descobri que existia a Casa Miga. E hoje em dia eu trabalho nesse local que me acolheu”, relatou a educadora social.

Acolhimento

Em Manaus, a Casa Miga realiza o acolhimento de brasileiros, refugiados e imigrantes LGBTQIAPN+ expulsos de casa ou em situação de vulnerabilidade social. Fundada em 2018 é a primeira casa de apoio a a comunidade da região Norte. Cenas de violência e desrespeito dentro de casa são alguns dos fatores que levando a população a deixar as casas.

De acordo com a coordenadora operacional da Casa Miga, Iara Fernanda, o espaço tem capacidade para atender 14 pessoas. Atualmente o espaço conta com três moradores, todos os assistidos. Os novos integrantes precisam ser adultos a partir dos 18 anos. 

“A casa miga trabalha com acolhimento emergencial , apoio psicológico, social e humanitário, trabalhamos a empregabilidade e o encaminhamento para a vida fora da casa , nosso público principal é jovem , pessoas que nunca trabalharam , então nos montamos o capacita miga , onde temos uma plataforma de cursos e uma equipe que ensina essas pessoas a ingressar no mercado de trabalho“, explicou Iara.

A gestora elencou ainda que a cartilha é uma porta muito importante que se abre para que as pessoas da nossa comunidade tenha acesso a seus direitos, para que as pessoas que estão mais distantes de informações , consigam ser alcançadas e saibam que elas tem leis que as amparam.

Disposição

Para quem tiver interesse em acessar a cartilha, o documento está disponível de forma virtual segundo um dos idealizadores. “A cartilha já está disponível em formato digital, ela foi lançada e distribuída para a população em geral na Escola Superior da Magistratura do Estado do Amazonas, em parceria com a Defensoria Pública do Estado e com a Universidade do Estado do Amazonas, em formato físico, mas ela já é disponível e distribuída no formato digital para qualquer um que tiver interesse, ela está disponível”, finalizou o juiz.

Veja a íntegra da cartilha:
Leia mais: ‘Acolhimento e respeito’, diz babalorixá sobre religiões afro e questões LGBTQIAPN+
Editado por Jadson Lima

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