Chineses em trabalho análogo à escravidão são resgatados na BYD da Bahia
Por: Cenarium*
24 de dezembro de 2024
Área externa de alojamento de empresa terceirizada que atua nas obras da BYD (MPT/Divulgação)
SALVADOR (BA) – Uma força-tarefa de órgãos federais afirmou ter identificado a presença de 163 operários trabalhando em condições análogas à escravidão em empresas terceirizadas que atuam nas obras de construção da fábrica da BYD (Build Your Dreams), montadora de carros elétricos chinesa, em Camaçari (50 km de Salvador).
O resultado parcial das inspeções foi apresentado nessa segunda-feira, 23, pelo Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Defensoria Pública da União, Polícia Rodoviária Federal, Ministério Público Federal e Polícia Federal. A força-tarefa determinou a interdição de alojamentos e trechos do canteiro de obras.
Em nota, a BYD Auto do Brasil afirmou que não tolera desrespeito à lei brasileira e à dignidade humana e informou que decidiu encerrar imediatamente o contrato com a empreiteira Jinjiang Construction Brazil, que fazia parte da obra da fábrica em Camaçari.
Segundo a investigação, foi feito o resgate de 163 trabalhadores, todos chineses, que estavam trabalhando em condições degradantes, com jornadas extenuantes e restrições à liberdade. Todos os operários foram ouvidos individualmente, dizem os órgãos. Eles eram funcionários da empresa Jinjiang Group, uma das empreiteiras contratadas para realizar a obra, de acordo com a força-tarefa.
Também foi constatada superlotação nos alojamentos dos trabalhadores da empresa terceirizada Jinjang, que não tinham colchões, nem condições adequadas de higiene.
Os operários estavam distribuídos em cinco alojamentos em Camaçari. Em apenas um deles, destinado a trabalhadores administrativos, não houve resgate de trabalhadores.
Em um dos alojamentos, os operários dormiam em camas sem colchões e não tinham armários para seus pertences pessoais, que ficavam misturados com materiais de alimentação. Havia apenas um banheiro para cada 31 trabalhadores, o que os forçava a acordar às 4h para conseguir se preparar para sair para trabalho às 5h30.
Além de insuficientes, segundo a investigação, os banheiros não eram separados por sexo e apresentavam condições precárias de higiene. Sem local apropriado para lavar roupas, os trabalhadores usavam próprios banheiros para esta finalidade.
Os operários também entraram no País de forma irregular, na avaliação dos auditores. Eles usavam vistos temporários de assistência técnica, voltados para trabalhadores especialistas. Ao menos 107 chineses tiveram seus passaportes retidos pela empresa e parte deles só podia sair dos alojamentos com autorização, segundo os auditores.
Área externa de alojamento de empresa terceirizada que atua nas obras da BYD (MPT/Divulgação)
Reportagem da Agência Pública publicada em novembro revelou que trabalhadores chineses de empresas terceirizadas que atuam na construção da fábrica estariam sendo submetidos a rotinas de trabalho de até 12 horas por dia, sem folga semanal e sem equipamentos de proteção.
Em nota divulgada na noite desta segunda-feira, a BYD disse que vai garantir que todos os direitos dos funcionários da terceirizada sejam assegurados e determinou que os 163 trabalhadores sejam transferidos para hotéis da região.
A montadora chinesa afirmou ainda que já vinha realizando uma revisão detalhada das condições de trabalho e moradia de todos os funcionários das construtoras terceirizadas responsáveis pela obra, notificando as empresas e promovendo os ajustes.
“A BYD Auto do Brasil reitera seu compromisso com o cumprimento integral da legislação brasileira, em especial no que se refere à proteção dos direitos dos trabalhadores. Por isso, está colaborando com os órgãos competentes desde o primeiro momento e decidiu romper o contrato com a construtora Jinjiang“, afirmou Alexandre Baldy, vice-presidente sênior da BYD Brasil.
A montadora lançou a pedra fundamental para construção da fábrica em outubro em 2023, em cerimônia com a presença de executivos da empresa, do governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT) e do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB).
A BYD assumiu o parque industrial que era da Ford, montadora norte-americana que atuou na Bahia entre 2001 e 2021. O complexo industrial será composto por três fábricas, com investimento previsto de R$ 5,5 bilhões e capacidade inicial de produção de 150 mil carros elétricos e híbridos por ano.
O procedimento de investigação foi instaurado pelo MPT a partir de uma denúncia anônima recebida no dia 30 de setembro. Uma inspeção foi realizada dia 11 de novembro na área onde a empresa está construindo sua linha de montagem.
A BYD informou, à época, que foram identificadas inconformidades em relação aos trabalhadores em Camaçari e que exigiu que as prestadoras responsáveis pelas obras agissem imediatamente. A empresa também afirmou que permanece comprometida em colaborar com o MPT e que reforçou a fiscalização da obra para assegurar o cumprimento da legislação e o respeito a todos os profissionais que nela atuam.
“A companhia opera há dez anos no Brasil, sempre seguindo rigorosamente as leis locais e mantendo o compromisso com a ética, respeito e a dignidade humana“, disse a BYD.
Stella Li, CEO da BYD Américas, e o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, durante o lançamento da montadora chinesa BYD na Bahia (Divulgação/Governo da Bahia)
Uma audiência virtual conjunta do Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho foi marcada para a próxima quinta-feira, 26, para que a BYD e a Jinjang apresentem as providências para garantir condições mínimas de trabalho e alojamento.
A investigação prosseguirá com análise de documentos e não está descartada a necessidade de novas inspeções nos alojamentos e canteiros de obras.
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