Cientistas analisam retomada do Programa Mais Médicos
Por: Alessandra Leite
06 de outubro de 2023
Programa propõe remuneração em forma de bolsa com carga horária de 44 horas semanais (Reprodução)
Alessandra Leite – Especial para Revista Cenarium Amazônia
SÃO PAULO (SP) – Até o final de 2023, pelo menos 28 mil profissionais do Programa Mais Médicos estarão atuando em todo o Brasil, especialmente nas regiões mais remotas e afetadas pela pobreza. Com uma redução de 36% no número de médicos no programa, entre os anos de 2018 e 2023, o agravamento dos vazios assistenciais na atenção primária afeta mais de 96 milhões de brasileiros.
Com a reformulação do programa, pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), emitiram uma nota de conjuntura, publicada nesta sexta-feira, 6, na revista “Trabalho, Educação e Saúde”, com o intuito de chamar a atenção para a prioridade que deve ser dada à alocação de médicos na Estratégia Saúde da Família, cujo propósito é manter equipes multidisciplinares atuando na atenção básica.
Na avaliação da pesquisadora da Escola Politécnica da Fiocruz e uma das autoras do documento, Angélica Ferreira Fonseca, o problema dos vazios assistenciais e a falta de acesso a médicos é histórico, atingindo não somente regiões remotas como também as áreas periféricas das grandes cidades. “Isso gera consequências importantes para a saúde da população, sobretudo a mais vulnerável. Por conta disso é preciso que o problema seja continuamente enfrentado por meio de políticas públicas que visem a fixação de profissionais de saúde e médicos, em particular na atenção primária”, destaca.
Retomada do Programa Mais Médicos ocorre em todo o Brasil em 2023 Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Para Angélica Ferreira, que também é sanitarista e doutora em Saúde Pública, a retomada do “Mais Médicos” e sua ampliação é necessária e adequada, pois trata-se de um compromisso do SUS com a equidade em saúde. “O Programa tem se caracterizado por uma agilidade, tanto no prazo de formulação pelo governo quanto na tramitação no Congresso. E agora na gestão do programa. Quando fechamos o estudo haviam sido publicados 14 editais e hoje são 18. Isso demonstra o caráter de urgência que tem sido conferido a essa política”, ressalta.
No formato atual, o programa propõe uma remuneração em forma de bolsa com uma carga horária de 44 horas semanais, sendo 36 de atividades essenciais e oito horas de formação. “Trata-se de um contrato temporário e isso traz alguns problemas, porque não gera vínculo e não tem os mesmos direitos que a carteira assinada oferece. Mas toda política pública precisa ser continuamente avaliada para se entender seus pontos críticos e corrigir seus rumos”, pondera a pesquisadora.
Os autores do documento chamam a atenção para a capacidade da fixação profissional, a qualidade da formação e os efeitos da modalidade de contratação por bolsa. “Em relação à qualidade da formação, preocupa-nos a real disponibilidade de tempo para essa formação e o quanto os esquemas de tutoria e supervisão são suficientes para proporcionar um aprendizado consistente. No que se refere à contratação por bolsa, indiscutivelmente é uma forma de precarização. E a precarização do trabalho repercute no SUS em geral e sobre a atenção primária”, pontua.
Nova versão do “Mais Médicos” atende preocupações urgentes (Reprodução)
Apesar desse ponto, a autora do documento ressalta a boa adesão dos profissionais percebida pela resposta positiva aos editais lançados. Ferreira assina o documento junto com o professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Geraldo Cunha Cury.
Os pesquisadores ressaltam que esta versão do “Mais Médicos” atende a preocupações urgentes, como pavimento e fixação de profissionais em áreas desassistidas, além do processo de formação profissional. “Essas são as novidades mais significativas do programa a partir de 2023, pois investe fortemente na formação dos médicos, com possibilidade de titulação”, elogia Fonseca.
Para os especialistas, a alternância de médicos é prejudicial para a qualidade da atenção primária em saúde. A nova versão do programa estendeu o tempo de permanência para quatro anos. Ao final, o médico poderá obter três títulos: especialista lato sensu, mestrado profissional e especialista em Medicina de Saúde da Família e Comunidade, que exige a aprovação em um exame.
O “Mais Médicos”
O Programa Mais Médicos foi criado em 2013 para fortalecer o atendimento à população em regiões com poucos profissionais e retomado em 2023.
Podem se inscrever no programa médicos brasileiros formados no país, médicos brasileiros com atuação no exterior e registro profissional no Brasil ou no exterior ou médicos estrangeiros com registro profissional, também no Brasil ou no país de origem.
Entre abril e agosto de 2023, 14 editais foram lançados e a procura foi alta, de acordo com a nota dos pesquisadores. “É inegável que o Mais Médicos esteve no centro de disputas políticas nos últimos governos, mas também é inegável que ele está endereçado a um problema grave no país, que é o acesso à saúde. Uma das consequências desse cenário é a precarização das condições de trabalho dos médicos”, diz Fonseca. Os autores registram que a atual versão do programa avança em relação à experiência anterior frente ao desafio de manter profissionais na Amazônia e, em particular, em territórios indígenas, tanto que houve um edital específico com mil vagas para a região.
Angélica Ferreira ressalta que a recomposição da atenção primária faz parte desse suporte à região amazônica e suas peculiaridades. “A atenção primária está presente no cotidiano das comunidades, no território. É fundamental para caracterizar causas, processos e suas consequências sobre a saúde e o ambiente, além de evidentemente intervir. O ‘Mais Médicos’ não se restringe a prover médicos. Há de ser um meio que, somado a outras ações, seja capaz de prover o fortalecimento da Estratégia Saúde da Família e, desse modo, da atenção primária à saúde”, finaliza.
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