Coiab se posiciona contra nomes indicados para discutir Marco Temporal
Por: Letícia Misna
18 de outubro de 2024
MANAUS (AM) – A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) se posicionou contra a decisão do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) de indicar ao Supremo Tribunal Federal (STF) cinco representantes para recompor a Câmara de Conciliação que trata de pautas relacionadas ao Marco Temporal. Lideranças dos povos originários pediram o encerramento da iniciativa após não chegarem a um acordo sobre o tema.
Em nota divulgada na terça-feira, 15, a Coiab classificou o momento como “histórico e preocupante” por considerar as medidas adotadas como “enxurrada de tentativas de retrocesso que recai sobre os direitos” dos povos originários. A organização critica o MPI por falta de engajamento para não permitir que se estabeleça “mais um mecanismo de fragilização dos direitos dos povos indígenas”.

A indicação do MPI ao STF foi em decorrência de uma solicitação do ministro Gilmar Mendes em 1º de outubro, cerca de um mês após a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) decidir, em consenso com lideranças indígenas de todo o País, deixar a comissão, em 28 de agosto deste ano. A Apib alegou como principal causa da saída a intensificação da insegurança jurídica que persegue os povos indígenas.
Entre os nomes indicados pelo MPI, estão:
- Pierlangela Nascimento da Cunha, integrante da Coordenação-Geral de Políticas Educacionais Indígenas do Ministério da Educação, representando a região Norte;
- Weibe Tapeba, secretário especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, representando a região Nordeste;
- Eunice Kerexu, coordenadora do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Interior Sul, representando a região Sul;
- Douglas Krenak, coordenador regional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em Minas Gerais e Espírito Santo (CR-MGES), representando a região Sudeste;
- Eliel Benites, professor auxiliar na Faculdade Intercultural Indígena (Faind), representando a região Centro-Oeste.
Na nota divulgada, a Coiab afirmou que os nomes dos novos indicados são vinculados ao governo federal negou que eles representam os povos indígenas. “As pessoas indicadas são vinculadas ao Governo [Federal] e não representantes dos povos indígenas e do movimento indígena, não podendo, portanto, sobrepor sua legitimidade e muito menos se posicionarem ou deliberarem em nome do movimento indígena, sobretudo indicações da região Norte”.
Em declaração, o Ministério dos Povos Indígenas afirmou que “os nomes não substituem a representação da Apib, cuja vaga segue à disposição da organização nos termos da decisão do Ministro Relator”.
A Coiab considera ainda que as pessoas indicadas são ilegítimas, uma vez que a instituição reconhece somente a Apib como legítima representante. “E somente a ela, com o consenso de todas as bases, caberia a exclusividade de estar presente na mesa de conciliação enquanto representante”.

Para a Coiab, a decisão de indicar os novos integrantes fragiliza anos de luta dos povos indígenas pela autonomia e autodeterminação, o reconhecimento da própria Suprema Corte quanto à legitimidade da Apib e “passa por cima do movimento indígena e suas organizações que há anos vêm lutando pelo reconhecimento de sua representatividade coletiva”.
A Coordenação pede ainda que o MPI declare publicamente e junte ao processo o esclarecimento de que as pessoas apresentadas não falam pelos povos indígenas do Brasil, especialmente da Amazônia brasileira.
Comissão de Conciliação
A Comissão de Conciliação do Marco Temporal do STF foi criada pelo ministro Gilmar Mendes, e o primeiro encontro ocorreu em agosto de 2024. De acordo com o STF, a iniciativa tem como objetivo discutir a constitucionalidade da Lei 14.701/2023, que trata sobre demarcação de Terras Indígenas.
“Os argumentos de todos os integrantes serão considerados no material a ser elaborado pela comissão, ressaltando, inclusive, propostas em que não se tenha chegado a um consenso e eventuais posições divergentes sobre temas discutidos nas audiências”, diz o Supremo.
A composição da Comissão é formada por três integrantes da Câmara dos Deputados, três integrantes do Senado Federal, um integrante da Advocacia-Geral da União, um integrante do Ministério da Justiça, um integrante do Ministério dos Povos Originários, um integrante da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, um integrante do Fórum de Governadores.
Participam ainda um integrante do Colégio Nacional de Procuradores de Estado, um integrante da Confederação Nacional dos Municípios e Frente Nacional dos Prefeitos, cinco integrantes de autores das ações discutidas no STF, e seis integrantes da Articulação dos Povos Indígenas.
A Apib deixou o grupo em 28 de agosto deste ano. Em nota lida na segunda audiência da Comissão, a entidade se mostrou totalmente insatisfeita com a forma como essa câmara foi criada, porque para os indígenas, esse é um ponto resolvido com a decisão do Supremo, do ano passado, de considerar inconstitucional a tese do marco temporal.
Confira a nota completa abaixo: