Com avanço da pandemia nas aldeias, STF pauta liminar para conter mortalidade de indígenas

Os dados foram divulgados nesta terça-feira, 20, à REVISTA CENARIUM (Divulgação/ Internet)

Jarleson Lima – Da Revista Cenarium

MANAUS – O Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá nessa segunda-feira, 3, se confirma ou rejeita a liminar proposta pelo ministro Luís Roberto Barroso para conter a mortalidade de indígenas nas aldeias do Brasil. O julgamento tem início previsto para às 15h e será transmitido nas redes sociais. Se aprovada, a decisão obrigará o governo a criar em até 30 dias um plano de estratégias para enfrentamento da Covid-19 em terras indígenas.

O debate vem à tona no momento em que o País presencia mais uma dizimação dos povos tradicionais, a medida em que o novo Coronavírus avança nas aldeias.

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De acordo com levantamento feito pelo Comitê Nacional de Vida e Memória Indígena da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a taxa de mortalidade dos povos indígenas supera a média nacional: São 66,6 mortes por 100 mil habitantes só nas aldeias, contra 43 por 100 mil em todo o território brasileiro.

Ainda segundo o levantamento da Apib, cerca de 600 indígenas morreram e 21 mil foram infectados pela Covid-19 até o fim de julho. Os dados mostram que, apesar de o Brasil começar a vivenciar um aparente recuo do vírus, os índices de contaminados entre os povos originários disparou. Se antes 118 etnias haviam sido atingidas pela pandemia, agora elas já somam 143. Entre junho e julho, o número de casos entre indígenas subiram 54% e as vítimas chegaram a 115% de aumento .

Leia também: Governo federal admite falhas na implantação de oito barreiras sanitárias em terras indígenas

Os povos indígenas, assim como outras comunidades tradicionais, são naturalmente mais vulneráveis ao novo Coronavírus. O modo de vida dessa população não permite o isolamento total entre os indivíduos que dela fazem parte. São casas coletivas, utensílios compartilhados e saúde mais frágil, como explicou a Apib em comunicado.

O superintendente-geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), em entrevista à RFI, pontuou outros motivos que levariam à vulnerabilidade: “Os povos indígenas são os mais afetados pela pandemia, em conjunto com os povos tradicionais, quilombolas, caboclos, entre outros. Por um motivo simples, eles são os que dispõem de um sistema de saúde mais precário e estão mais isolados. A logística de transporte é difícil, para levar medicamentos, cestas básicas e equipes de saúde”, relatou.

O Plano

Apesar de melhorias, plano possui controvérsias (Reuters)

Depois de uma ação movida pela Apib no início de julho, Barroso determinou a elaboração de um plano que busca criar estratégias de combate ao novo Coronavírus em aldeias indígenas brasileiras, inclusive para construir barreiras de proteção sanitárias nos territórios de grupos tradicionais.

Cabe lembrar que a Apib pedia também a retirada de invasores de áreas epicentros da doença: as Terras Karipuna e Uru-Eu-Wau-Wau em Rondonia; Kayapó, Munduruku e Trincheira Bacajá no Pará; Araribóia no Maranhão; e Yanomami no Amazonas e Roraima. O ponto foi o único negado pelo ministro.

Outras cláusulas do projeto, que ainda se encontra em elaboração, sofreram críticas por parte de especialistas e lideranças indígenas. Segundo nota da Apib, locais estratégicos para a proteção de territórios foram ignorados e bases da Fundação Nacional do Índio (Funai), alguma desativadas, foram classificadas a priori como barreiras, mesmo sem equipamentos e protocolos implantados.

Confira as medidas estabelecidas na liminar:

  • Instalação de grupo de trabalho, com participação de representantes do governo e dos indígenas, para acompanhar o andamento das ações gerais de combate à pandemia;
  • Instalação de sala de situação para a gestão de ações para os povos indígenas em isolamento e de recente contato;
  • No prazo de 10 dias contados a partir da notificação da decisão, o governo deve criar barreiras sanitárias em terras de povos isolados;
  • Em 30 dias a partir da notificação da decisão, o governo deve elaborar um Plano de Enfrentamento da Covid-19;
  • Estabelecer, no âmbito do Plano de Enfrentamento, medidas de contenção e isolamento de invasores em relação a terras indígenas;
  • Garantir que indígenas em aldeias tenham acesso ao Subsistema Indígena de Saúde, independente da fase de demarcação da TI;
  • Indígenas não aldeados (urbanos) também devem acessar o subsistema de Saúde Indígena caso não haja oferta no SUS;

O que dizem os indígenas

Advogado da Apib, Eloy Terena fará defesa na sessão virtual do pleno do STF (Reprodução/Internet)

O doutor em antropologia pela UFRJ e advogado da Apib, Luiz Henrique Eloy, em entrevista ao Metrópoles nesse domingo, 2, sinalizou que é preciso usar a palavra genocídio para chamar a devida atenção para a gravidade da situação: “Quando falamos em genocídio, não estamos exagerando. Temos comunidades que, se o vírus entrar, desaparece. Temos grupamentos indígenas com menos de 100 pessoas. Eles correm risco de genocídio acompanhado de etnocídio, que é o desaparecimento da cultura e da língua”, defendeu.

Além disso, Eloy, que é da etnia Terena, lembrou a importância de proteger as áreas dos povos tradicionais: “O índice de invasões está aumentando em pleno contexto de pandemia. Os isolados estão expostos. Para proteger a vida dos povos indígenas, é preciso proteger seus territórios”, disse.

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