Concessão do Governo do Pará para reflorestamento de APA gera alerta
Por: Fabyo Cruz
28 de março de 2025
BELÉM (PA) – O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), oficializou no dia 28 de março, a escolha da empresa responsável pela primeira concessão para reflorestamento do Brasil. A concessão, no entanto, despertou a atenção de especialistas, que dizem ser necessária uma consulta pública antes das atividades da empresa que venceu o certame do governo, para observar os impactos da ação ao meio ambiente e cobram diálogo com o governo estadual.
A empresa vencedora foi a Systemica, empresa ligada ao banco BTG Pactual, que apresentou a única proposta durante a sessão pública de licitação realizada na sede da Bolsa de Valores de São Paulo. O projeto, denominado Unidade de Recuperação Triunfo do Xingu (URTX), prevê a recuperação de mais de 10 mil hectares de floresta na Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, no Sudeste do Estado, e o sequestro de 3,7 milhões de toneladas de carbono equivalente.

Apesar do ineditismo do projeto, especialistas apontam lacunas na condução do processo. Para Carlos Augusto Pantoja Ramos, engenheiro florestal e doutorando na Universidade Federal do Pará (UFPA), há dúvidas sobre a transparência da concessão e seus efeitos sociais e ambientais.
“Precisamos lembrar que a APA Triunfo do Xingu, enquanto área de proteção ambiental, é uma das unidades de conservação mais frágeis do ponto de vista fundiário”, alerta o especialista. Ele explica que, diferentemente de outras modalidades, como reservas extrativistas ou de desenvolvimento sustentável, a APA não possui destinação de uso claramente definida para as comunidades locais.

Carlos questiona como foi feita a destinação da área pública para a concessão e quais critérios foram estabelecidos para garantir os direitos das populações que habitam o local. “Essa delegação de ações precisa ter parâmetros claros. Onde está o debate público sobre a concessão? Passou pela Comissão Estadual de Florestas?”, indaga.
Outro ponto levantado pelo engenheiro florestal é a falta de clareza sobre as espécies que serão plantadas na recuperação da área. Pantoja questiona se o projeto contempla a recuperação da biodiversidade original ou se haverá o risco de implantação de monocultivos, como eucalipto, que não refletem a riqueza florística da região.
“O reflorestamento precisa garantir a diversidade de espécies, buscando aproximar-se da composição original da floresta. No entanto, não há informações suficientes sobre os critérios de biodiversidade que serão adotados pela empresa concessionária”, alerta.
Investimentos
Com um prazo de concessão de até 40 anos, a iniciativa estima um investimento privado de R$ 258 milhões e a criação de aproximadamente dois mil empregos na região, além de gerar uma receita total de R$ 869 milhões a partir de serviços ambientais, como créditos de carbono.
A Systemica se comprometeu a pagar uma outorga fixa de R$ 150 mil na assinatura do contrato e uma outorga variável de 6% sobre a Receita Operacional Bruta anual da concessão. A arrecadação do estado pode ultrapassar R$ 46 milhões, dependendo da valorização dos créditos de carbono no mercado.
Créditos de carbono
O especialista também levanta preocupações quanto à precificação dos créditos de carbono gerados pelo projeto. Segundo ele, há risco de que o valor seja definido por instituições estrangeiras, como já ocorreu anteriormente com o REDD+ jurisdicional, que estabeleceu o preço de 15 dólares por tonelada de carbono. Para o engenheiro florestal, é fundamental que o Pará tenha protagonismo na definição desses valores para garantir maior retorno financeiro à sociedade local.
Alternativas comunitárias
Para Carlos Ramos, projetos de reflorestamento poderiam priorizar parcerias com cooperativas comunitárias e técnicas locais, promovendo maior distribuição de renda e participação social. Ele cita como exemplo positivo o projeto da Caixa Econômica Federal, que apoia associações comunitárias na produção de mudas, em contraste com parcerias público-privadas que, segundo ele, tendem a favorecer mais o setor privado.
“Precisamos acreditar mais na sociedade local e dar a ela as condições para promover o reflorestamento. Parcerias público-privadas costumam ser mais privadas do que públicas. Por que não fomentar o protagonismo de comunidades e técnicos locais?”, conclui.