Conselho indígena acusa Museu Nacional do RJ de descumprir acordo sobre Manto Tupinambá
15 de julho de 2024
Manto Tupinambá estava na Dinamarca há 300 anos (Composição: Weslley Santos/Cenarium)
Marcela Leiros – Da Cenarium
MANAUS (AM) – O Conselho Indígena Tupinambá de Olivença (Cito)afirmou em nota que o Museu Nacional do Rio de Janeiro descumpriu acordos firmados com a organização a respeito da chegada do Manto Tupinambá que estava na Dinamarca há mais de 300 anos. O museu afirmou, por meio do diretor Alexander Kellner, que foi priorizada a segurança do artefato, considerando tratar-se de uma peça frágil que estava alocada em um País com condições climáticas diferentes do Brasil.
O conselho formado por indígenas do povo Tupinambá de Olivença e seus representantes alegou que em reunião no dia 8 de maio deste ano foi estabelecido que haveria uma recepção coordenada pelo povo Tupinambá ao manto, “como nossos anciões orientavam, para o bem espiritual do nosso povo e do próprio manto“. Além disso, foi acordado que nenhuma decisão seria tomada sem a consulta ao grupo.
Indígenas Tupinambá retratados em gravura feita por Theodor De Bry (1528- 1598) (Museu Nacional)
No dia 8 de julho, entretanto, o Cito foi informado, por meio de ligação via aplicativo de mensagens, que o manto já estava no País e alocado no Museu Nacional do Rio de Janeiro, e seria “inviável organizar uma recepção antes da abertura ao público“.
“O manto retornou para nós, mas ainda não foi recepcionado pelo nosso povo de acordo com nossas tradições. Este manto de mais de 300 anos é um ancião sagrado que carrega consigo a história e a cultura de nosso povo, como foi transmitido para nós por Amotara, nossa anciã“, lembrou o conselho, cobrando que o museu respeite as decisões futuras sobre o manto.
Posicionamento
O diretor do museu alegou que, desde as negociações com o Cito, ficou claro que nem todas as solicitações poderiam ser atendidas, devido a questões financeiras e, sobretudo, à fragilidade do material. “Também foi avisado que havia procedimentos que teriam que ser realizados após a chegada do manto. Finalmente, este estava há pelo menos 350 anos em um país com condições climáticas bem distintas das nossas e precisa de um período de adaptação para a sua segurança“, afirmou.
O museu declarou ainda que criou, em 2023, o Grupo de Trabalho de Acolhimento ao Manto Tupinambá (GT), com representantes do povo Tupinambá, e que cabe à direção da entidade a responsabilidade da segurança da peça. A entidade afirmou também que, para eles, ficou claro que a vontade dos povos originários de realizarem seus rituais sagrados seria respeitada antes de qualquer apresentação pública.
O manto
Com 1,80 m de altura e milhares de penas vermelhas de pássaros guarás, o Manto Tupinambá estava “guardado”, ao lado de outros quatro mantos, no Museu Nacional da Dinamarca. O item chegou a Copenhague em 1689, mas foi provavelmente produzido quase um século antes.
A expectativa é que ele seja uma das principais peças do acervo do Museu Nacional do Rio de Janeiro já a partir do ano que vem, quando está prevista a reabertura parcial do prédio destruído por um incêndio em 2018.
Gliceria Tupinambá em encontro com o manto de seus ancestrais no Museu Nacional da Dinamarca, em Copenhague, em 2022 (Renata Cursio Valente/Setor de Etnografia e Etnologia do Departamento de Antropologia do Museu Nacional)
À Folha de S. Paulo, o antropólogo e curador das exposições etnológicas do Museu Nacional, João Pacheco de Oliveira, afirmou que a “doação” da peça representa o resgate de uma memória transcendental para o povo Tupinambá.
“Nunca houve uma repatriação de um objeto etnográfico dos indígenas brasileiros dessa importância. O povo não faz essa peça há muitos séculos. Ela só aparece nas primeiras imagens dos cronistas do século 16. Depois desse período, teve todo um processo de guerra do governo português contra os Tupinambá. Muitos morreram e povoados foram destruídos. Os que sobreviveram foram obrigados a abandonar língua e hábitos culturais”, diz João Pacheco.
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