Covid-19 tirou a vida de um em cada 17 idosos com 90 anos ou mais no Brasil

Dessas vítimas, 2,5 mil eram pessoas centenárias, segundo os dados dos cartórios (WILL OLIVER/EFE/EPA)
Com informações do UOL

MANAUS — O Brasil atingiu nessa quarta-feira, 2, a triste (mas esperada) marca de 650 mil mortos pela Covid-19. Em dois anos de pandemia no País, a doença causada pelo SARS-CoV-2 deixou uma sequela cruel especialmente entre os mais idosos.

A coluna levantou os dados do Portal da Transparência dos cartórios de registro civil. Até nessa quarta-feira, 2, foram registrados 43.910 óbitos de pessoas de 90 anos ou mais. O alto número se torna ainda mais assustador quando se compara com a população estimada no Brasil nessa faixa etária em 2019 (último ano antes da pandemia): segundo o IBGE, eram 774.304 idosos 90+.

Em cálculo simplório, sem pretensão científica, vemos que os óbitos pela Covid-19 representam 5,6% desses idosos que viviam no Brasil no antes da pandemia.

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Dessas vítimas, 2,5 mil eram pessoas centenárias, segundo os dados dos cartórios. Aqui uma ressalva: não há dados atuais de pessoas com 100 anos ou mais morando no Brasil, segundo informou o IBGE à coluna. “Esse grupo etário é muito rarefeito e somente pode ser captado nos censos demográficos”, disse o órgão. No Censo de 2010, a população centenária medida foi de 23.760 pessoas no país.

Somente este ano, a Covid-19 já vitimou 4.600 idosos com 90 anos ou mais no País. Com o avanço da vacinação, como o UOL mostrou, os idosos com mais de 70 passaram a responder por 63% de todos os óbitos pela Covid-19 no País. Isso ocorre porque esse grupo etário tem maior fragilidade, e a Covid-19 pode causar problemas graves.

“O coronavírus não é mais aquele grande vilão causador da insuficiência respiratória, mas sim um agente que vai descompensar outros problemas. Isso não é só com os idosos, mas com adultos que tenham uma comorbidade, uma criança com uma doença cerebral. Essas pessoas têm uma fragilidade e estão em um ponto de equilíbrio tênue da saúde”, disse o geriatra Marco Polo Dias Freitas, doutor em saúde coletiva pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e membro da Comissão de Políticas Públicas da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG).

Vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a sanitarista Bernadete Perez, afirma que era esperado que a pandemia atingisse mais essa faixa etária no Brasil, como ocorreu em todo o mundo. “A doença é mais grave na população mais idosa. Quanto mais idade, maior é o risco, maior a letalidade”, conta.

Entretanto, ela afirma que o País cometeu erros e omissões que poderiam ter ajudado a salvar vidas.

“Precisaríamos ter enfrentado a pandemia com rede de atenção, vigilância epidemiológica, comunicação social, estratégias de proteção social para estas pessoas mais vulnerabilizadas, especialmente as mais idosas. Idade avançada não é comorbidade, é uma condição natural que precisa ser cuidada. É nossa memória, cultura, história, o que temos de mais valor”, reforça. Bernadete Perez, da Abrasco.

Ela diz ainda que o número de mortes nessa terceira onda não foi mais mortal por causa da vacinação. “Nosso problema é que a vacinação foi tardia, e hoje temos a necessidade da busca ativa. Isso é vinculado à atenção primária necessária para que a gente consiga cobrir 100% da população — ou perto disso— das pessoas com 90 anos e mais. É a forma de proteção mais efetiva”, completa.

Movimento para proteção

Durante a pandemia, para proteger os idosos, um grupo criou o movimento nacional “Vidas Idosas Importam” —que hoje existe em todos os Estados. “Ele defende a diversidade do envelhecimento —porque ninguém envelhece da mesma forma”, conta o gerontólogo e fundador do movimento, Crismedio Costa.

Ele afirma que a crise humanitária provocada pelo coronavírus ainda causa muitos danos, como o medo da morte por causa da alta letalidade da doença nessa faixa. “O pavor teve um impacto forte e negativo na vida dessas pessoas, então muitas chegaram a ficar atordoadas e levou a um isolamento por conta do medo”, diz.

Para ele, o preconceito é outro fator danoso. O chamado etarismo (a discriminação por idade) foi um dos fatores. “O fato dessas pessoas terem fragilidade na saúde, terem sido contaminadas com a Covid-19, serem internadas e irem a óbito fez com que a sociedade os isolasse”, relata.

“O Brasil caminha para ter a 6ª maior população do planeta de idosos, mas não criou ainda políticas efetivas para a dignidade no cuidado a essas pessoas. E a palavra de ordem é cuidado, segurança, dignidade ao envelhecer”, explica Crismedio Costa.

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