Crise climática aumenta desafios da população LGBTQIAPN+ em Belém

Pessoas em ação social em Belém, no Pará (Edielson Shinohera/Agência Belém)
Raisa de Araújo – Da Cenarium

BELÉM (PA) – A crise climática e as catástrofes recentes no Sul do Brasil têm revelado um cenário caótico para muitas comunidades, forçadas ao deslocamento, mas especialmente mulheres e pessoas LGBTQIAPN+, que ficam ainda mais vulneráveis à violência de gênero ou sexual. Para entender esse novo cenário, que é influenciado pelas mudanças climáticas, a Red Dot Foundation – Safecity, em parceria com a Fábrica dos Sonhos e a ONG Olivia lançaram, neste Mês do Orgulho, uma pesquisa para entender o impacto dessas mudanças e a insegurança em áreas urbanas, incluindo a perspectiva LGBTQIAPN+. 

A gestora da Red Dot Foundation, Camila Gomide, explica que a violência facilitada pelo clima é um tipo ou uma nova categoria de violência de gênero que está relacionada como o clima afeta pessoas de maneiras diferentes. “Então, quando a gente fala sobre minorias de gênero como mulheres, pessoas da comunidade LGBTQIA+, com relação ao clima a gente quer dizer que as pessoas elas são afetadas por mudanças climáticas, por crises climáticas de uma maneira mais específica. A maioria dessas vítimas acabam sendo meninas, mulheres e como eu disse pessoas da comunidade LGBT”, afirmou.

Se reerguer depois de uma enchente, por exemplo, não é tarefa fácil para ninguém, mas para pessoas LGBTQIAPN+ esse pode ser um problema ainda pior. O integrante da ONG Olivia Marcos Melo ressalta que, numa situação como essa, fica mais evidente como as políticas públicas não chegam da mesma forma para todo mundo. “Sabemos que numa catástrofe todo mundo sofre as consequências, mas é claro que será muito mais difícil para quem já está numa situação de vulnerabilidade em vários aspectos. Se você já vive sempre no limite de tudo, de dinheiro, de alimentação, de saúde mental, como você conseguirá ter forças para se reconstruir?”, questiona.

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Um casal homoafetivo dá as mãos com a bandeira LGBTQIAPN+ ao fundo (Reprodução/Getty Images)

A complexidade desse tema envolve muitos fatores, que vão desde a falta de saneamento básico até o desemprego e, para Marcos, essa pesquisa é importante para que a atenção não só da sociedade, mas principalmente das autoridades, se volte para uma problemática que não é do futuro, é do agora.  

“Então, se você não consegue concluir o ensino médio para ter um bom emprego e ter uma moradia digna, você vai parar numa invasão, sem a mínima condição de ser habitada, com inúmeros riscos para a sua saúde. São questões que se ligam uma a outra, tornando o problema muito maior. E essa é uma realidade presente na vida de muitas pessoas LGBTQIA”, destaca Marcos. 

Pesquisa de segurança pública para o G20

No formulário, são feitos questionamentos relacionados ao cotidiano dos participantes, como idade, gênero, local de residência, tipos de transporte e modo de deslocamento, motivos de insegurança em cenários normais ou em temporadas de climas extremos, além de outras perguntas. A expectativa é recolher em torno de 1.500 a 2.000 respostas de participantes de Belém, Belo Horizonte, Manaus, Recife e Sul de Minas. 

Após todo o processo de apuração, os coletivos pretendem debater o tema em um fórum, com a participação dos personagens que participaram do questionário, para que juntos eles possam propor intervenções e alternativas sociopolíticas, com o objetivo de apresentar essas propostas em eventos globais como o G20 e a COP30.

A gestora da Red Dot Foundation, Camila Gomide, revelou que os dados coletados até o momento já comprovam que o clima afeta pessoas e grupos da sociedade de maneira diferente, influenciando a locomoção e o senso de segurança. Um dado importante é que o nível de insegurança não aumenta em condições climáticas extremas, pois mulheres e LGBTQIAPN+ já se sentem inseguras diariamente, o que não significa que a vulnerabilidade aumentará em caso de evento climático extremo. 

“Descobrimos que as regiões mais afetadas pelo clima, como áreas propensas a deslizamentos e alagamentos, são onde há maior fluxo de pessoas, que se deslocam para trabalho ou estudo. Essas regiões têm fluxo alto de pessoas vulneráveis. Notamos também que o senso de segurança na cidade é baixo, com muitas pessoas sentindo-se inseguras no transporte público lotado, temendo toques indesejados, perseguições ou assaltos”, explica a gestora.

Membros da ONG Olivia (Divulgação)

Para entender esses dados e a relação dele com as mudanças climáticas, é preciso compreender que o LGBQIA+ é uma população muito diversa. São homens, mulheres, cis, trans, pessoas não binárias e com diferentes orientações sexuais. Para Marcos Melo, essa diversidade faz com que diferentes preconceitos os atravessem, indo muito além da LGBTfobia, incluindo também o machismo e o racismo.  Ele explica, ainda, que por diversos fatores, dentro do contexto do grupo, a população de pessoas trans e travestis tende a ser a mais vulnerável à violência, principalmente mulheres trans e travestis. 

“Essas pessoas são expulsas de casa desde os 15 anos, tem uma expectativa de vida de cerca de 35 anos, não conseguem estudar, pois sofrem preconceito nos espaços de educação, não são aceitas no mercado de trabalho e boa parte acaba trabalhando como profissional do sexo. Essa ausência de oportunidades leva qualquer pessoa à exaustão. E daí você imagina de que forma essa pessoa vai ter uma vida de qualidade sem um lar, sem a certeza de que vai ter um prato de comida, sem beber água”, conclui o ativista.

Leia mais: Na Câmara, indígenas afirmam que demarcação é solução para barrar crise climática
Editado por Adrisa De Góes
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