Crônicas do Cotidiano: uma história edificante
Por: Walmir de Albuquerque Barbosa
23 de novembro de 2025Certo pai de família modesto, gente da roça, como se dizia antigamente, tinha muitos filhos, também como era usual, mas um deles não se contentava com o modo de vida da família e sonhava alto, pretendia, assim que lhe fosse possível, migrar para a cidade, deixar de ser “jeca” e tornar-se pessoa de sucesso. Ambicioso, atirado na vida, bem diferente dos irmão mais obedientes, apegados à vida do campo, imitando pai. Moço feito, insistiu para pegar seus dotes antecipadamente feito o filho pródigo do Evangelho.
Depois de muita insistência, o pai vendeu uma dezena de novilhos gordos, que guardava para os tempos de necessidade, fez um enxoval e mandou o filho para estudar na capital e tornar-se doutor. Sempre que podia, mandava uma mesada e, em retribuição, o filho pródigo, em missivas, falava de coisas maravilhosas que andava fazendo, da cidade grande cheia de oportunidades e do progresso pessoal; atrevia-se até falar da política do país, como uma pessoa importante. Passaram-se uns tempos e o pai, já combalido das finanças e pela idade, cobrou um retorno do filho, pelo menos para visitar a família.
A visita foi agendada e, para recebê-lo, os pais programaram um banquete e convidaram os vizinhos e familiares mais próximos. Durante o almoço, o pai, com semblante inebriado e, ao mesmo tempo, desconfiado porque o filho não mostrava uma prova cabal de seu desempenho escolar, incentivou-o a falar alguma coisa em Francês, como todos os doutores daquela época, para mostrar que era culto e demonstrar certa sabedoria. O filho fez pose e diante dos convivas, acreditando que engabelaria a todos, não se fez de rogado:
– Mon irmoês, passuês o pratuês de arrozês pra cazês!
Os convivas entreolhavam-se, uns até felizes por ouvir de alguém tão culto coisas simples, que já sabiam em sua própria língua e, na ocasião, em uma “língua estrangeira”. Mas, o pai entendeu tudo e confirmava ali as suas suspeitas. O filho dilapidou tudo em vagabundagem e estava ali a enganar a todos. Olhou nos olhos do mesmo, pediu silêncio dos convidados e não se conteve:
– Ah! Seu cachorrês, voltarês pro caboês da enxadês tra vêz!
Conheci essa estória por meio da minha avó, a quem devo os créditos, ainda nos idos dos anos cinquenta do século passado, e serviu-me de lição, lá na cidadezinha onde nasci. Jamais imaginei que poderia recordá-la no momento político em que vivemos, quando um menino mimado, treinado nos maus exemplos do pai que, como se sabe, nunca foi “flor que se cheire”, mas que teve sucesso em seu “métier”, deixa o seu país, arranca parte dos trocados do genitor, conquistados via pix dos seus admiradores, e vai para o “primeiro mundo” tornar-se doutor em política de extrema direita, e consegue provocar a maior tragédia da nossa contemporaneidade; além do mais, usando um passaporte diplomático e um inglês de baixo calão a serviço dos cegos da “Disneylândia Tupiniquim”.
As semelhanças entre fatos narrados no parágrafo anterior e neste são mera coincidência! Entretanto, é de se pensar: como larga fração do povo pode ser enganada por um salafrário coadjuvado por tantos que pululam covardemente ao seu redor? O “caboêz da enxadêz” talvez seja pouco. A justiça precisa ser mais severa que a de um pai que prima pelo lema fascista de “Deus, Pátria e Família”. Creio que depois disso até os convivas ficariam espantados e não se atreveriam a engrossar o cortejo que o receberia na Rodoviária ou no Aeroporto, se voltasse ao país!
O Brasil já viu muita coisa: um menino de 14 anos virar Imperador em meio a uma conflagração geral da Nação; um ancião decrépito, com suas insígnias pregadas ao peito, montado a cavalo, proclamar, sem o povo, uma República de cartas marcadas; um “Napoleão de Circo” prometendo acabar com os “marajás”; e, agora, um fedelho político armando tamanho escarcéu!