Degradação da Amazônia pode gerar duas pandemias por década, diz climatologista


Por: Fred Santana

18 de novembro de 2025
Degradação da Amazônia pode gerar duas pandemias por década, diz climatologista
As advertências de Carlos Nobre ecoaram o apelo do presidente Lula para construir um roteiro internacional capaz de deter o desmatamento até 2030 (Fred Santana/CENARIUM)

BELÉM (PA) – O climatologista Carlos Nobre afirmou, nesta terça-feira, 18, à CENARIUM, que a degradação da Amazônia pode gerar até duas pandemias em uma década na região. Durante coletiva na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém (PA), o especialista também alertou que a Amazônia pode perder até 70% de sua cobertura florestal nas próximas décadas caso o aquecimento global ultrapasse 2°C, cenário que, segundo ele, aumentaria significativamente o risco de novos surtos pandêmicos em escala global.

Na ocasião, foram apresentados os fundamentos científicos por trás do apelo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por um roteiro global para deter o desmatamento e reverter a devastação florestal até 2030. A proposta retoma e amplia compromissos assumidos na COP28, em Dubai, mas ainda gera dúvidas sobre como será implementada.

“Estamos vivendo uma emergência. A temperatura global está próxima de ultrapassar 1,5°C. Se chegarmos a 2°C, não haverá como preservar a Amazônia”, afirmou. Segundo Carlos Nobre, os extremos climáticos já matam mais de 150 mil pessoas por ano no mundo. “Ondas de calor, secas históricas, incêndios e chuvas extremas estão explodindo em todo o planeta”, disse.

Nobre reforçou que a floresta está perigosamente próxima de um ponto de não retorno. “Se ultrapassarmos entre 26% e 25% de desmatamento, perderemos a floresta. Já estamos em 18%”, alertou. Ele lembrou que os impactos vão muito além da Amazônia.

Carlos Nobre alertou que extremos climáticos já matam mais de 150 mil pessoas por ano no mundo (Fred Santana/CENARIUM)

A degradação florestal pode liberar mais de 250 bilhões de toneladas de carbono e criar condições propícias para epidemias e pandemias em larga escala”, explicou. Para o cientista, mudanças profundas são urgentes: “Precisamos zerar o desmatamento de todos os biomas e reduzir 75% das emissões de combustíveis fósseis”, afirmou.

Pressão por um roteiro global contra o desmatamento

As advertências de Nobre ecoaram o apelo do presidente Lula para construir um roteiro internacional capaz de deter o desmatamento até 2030, compromisso que ganhou novo fôlego na COP30, realizada em Belém. Durante a coletiva, os três especialistas – Carlos Nobre, Kirsten Schuijt e Carolina Pasquali – reforçaram a necessidade de alinhar ciência, políticas públicas e financiamento para enfrentar a crise climática que ameaça os maiores biomas do planeta.

A diretora-geral do WWF Internacional, Kirsten Schuijt, destacou que o mundo caminha para a perda irreversível de suas florestas mais importantes. “Estamos chegando a pontos de inflexão perigosos. Não estamos apenas perdendo florestas e biodiversidade, mas arriscando perder completamente os serviços ecossistêmicos que elas prestam ao planeta”, disse.

Para ela, o acordo de Paris não pode ser cumprido sem proteger florestas tropicais. “A ciência é clara: a maior parte do desmatamento profundo ocorre nas florestas tropicais, essenciais para mitigar e adaptar o clima”, afirmou.

Schuijt também ressaltou a força da mobilização indígena em Belém. “Esta é a maior participação indígena que já vi. Eles estão pedindo o fim do desmatamento e exigindo restauração. Precisamos ouvir essas vozes, ouvir Lula e ouvir a ciência”, comentou. A dirigente defendeu que a COP30 gere dois grandes acordos: “Queremos fazer história com um roteiro para transição dos fósseis e um roteiro florestal com ações reais para reverter a perda das florestas”, declarou.

Indígenas pressionam por ação real

A diretora-executiva do Greenpeace Brasil, Carolina Pasquali, reforçou que a COP30 não pode terminar sem resultados concretos. “Esta conferência precisa entregar resultados reais. Lula pediu dois roteiros globais – um para sair dos combustíveis fósseis e outro para zerar o desmatamento até 2030”, disse.

Pasquali enfatizou que a mobilização indígena tem pressionado governos e gerado avanços. “Ontem foram anunciadas dez demarcações e hoje quatro homologações, incluindo uma com mais de dois milhões de hectares no Pará. Isso é resultado direto da mobilização indígena”, afirmou.

Pasquali defendeu que os países assumam um roteiro global de ação para as florestas, e não apenas planos nacionais. “Se não for aqui e agora, quando será?”, questionou. Para ela, o documento precisa incluir diretrizes para NDCs, garantia de direitos territoriais, acesso direto a financiamento e sistemas de transparência.

Carolina Pasquali é diretora-executiva do Greenpeace Brasil (Reprodução/Redes Sociais)

“O que temos hoje na mesa é preocupante. Precisamos ir além”, explicou. A dirigente concluiu reforçando a urgência de medidas concretas: “As ruas de Belém gritaram ‘precisamos de ação, não de palavras’. Não podemos sair desta COP com notas de intenção enquanto a Amazônia está perto do ponto de não retorno”, afirmou.

Ciência reforça alertas

Um dos estudos mais consistentes sobre o ponto de não retorno da Amazônia é Critical transitions in the Amazon forest system, publicado em 2024 na revista Nature. A pesquisa mostra que uma parcela significativa da floresta já apresenta sinais acelerados de perda de resiliência, aproximando o bioma de uma mudança abrupta e irreversível para um estado de vegetação degradada.

No campo sanitário, o relatório Climate change is creating ‘new vulnerabilities’ for disease pandemics”, publicado em 2023 pela plataforma Carbon Brief, mostra que a mudança climática aumenta o risco de zoonoses e facilita condições para o surgimento de novas epidemias e pandemias.

O material descreve como o aquecimento global, a pressão sobre os habitats e a redistribuição de espécies aumentam o contato entre animais e humanos, ampliando as oportunidades de salto de patógenos, aumentando o risco epidemiológico associado ao colapso ambiental.

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Editado por Jadson Lima

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