MANAUS (AM) – Nessa segunda-feira, 20 de janeiro, Donald Trump tomou posse como o 47º presidente dos Estados Unidos. Em sua trajetória política, ele continua a defender uma agenda marcada pelo negacionismo climático e por políticas antiambientais, alinhadas ao que tem sido replicado por setores da extrema direita em diferentes partes do mundo. Essa postura também foi evidenciada durante o governo do ex-presidente brasileiro e hoje inelegível, Jair Bolsonaro, conforme apontado no periódico científico Environmental Conservation.
Trump anunciou planos catastróficos para o clima global, incluindo a intensificação da exploração de petróleo e gás nos Estados Unidos e a suspensão de acordos ambientais já estabelecidos, medidas que colocam em risco os esforços para mitigar os impactos da crise climáticas. Sua estratégia anti-ambiental se alinha a outros objetivos, como a proposta de anexação da Groenlândia. A justificativa estaria ligada tanto aos vastos recursos naturais do território, como petróleo, quanto à possibilidade de explorar novas rotas comerciais. O derretimento acelerado do gelo ártico, causado pelas mudanças climáticas, ampliou a navegabilidade na região. Enquanto no passado o tráfego de navios era possível por apenas 20 dias durante o verão, hoje esse período se estende por até quatro meses, favorecendo o comércio marítimo. Dessa forma, Trump enxerga na crise climática uma oportunidade estratégica para os Estados Unidos expandirem suas rotas comerciais, em detrimento dos custos e danos climáticos impostos ao restante do mundo.
Durante o discurso de posse, Trump declarou: “A crise da inflação foi causada por gastos excessivos, e por isso, hoje, eu também declararei uma emergência energética nacional. Vamos perfurar e explorar. A América será novamente uma nação produtora, e temos algo que nenhuma outra nação possui: as maiores reservas de petróleo e gás. E vamos utilizá-las.”
Além da Groenlândia, Trump afirmou que pretende anexar o México, o Canadá e o Canal do Panamá. Este último é considerado uma rota estratégica para o comércio global, conectando os oceanos Atlântico e Pacífico. Sob domínio norte-americano, essas áreas consolidariam um controle significativo sobre as principais rotas comerciais do mundo. Entretanto, os governos desses territórios já expressaram veementemente que não têm interesse em serem incorporados aos Estados Unidos.
Reeleito com o slogan que reflete a percepção de declínio no país, “Make America Great Again”, Trump prometeu inaugurar uma nova “Era de Ouro”. Entre suas propostas, destacou a construção de um muro na fronteira com o México, o endurecimento das políticas contra imigrantes e a revisão de alianças internacionais, incluindo o aumento da “taxa de proteção” para países aliados, que passaria de 2% para 5% do PIB.
No domingo, 19 de janeiro, durante um comício em Washington, Trump alertou sobre o risco iminente de uma Terceira Guerra Mundial. Ele afirmou: “Eu vou acabar com a guerra na Ucrânia, vou controlar o caos no Oriente Médio e vou impedir que a Terceira Guerra Mundial aconteça. Vocês não fazem ideia de quão perto estamos disso.”
Os conflitos por territórios como a Groenlândia, Canadá, México e o Canal do Panamá têm o potencial de desencadear uma sequência de novas guerras, afetando regiões até então geopoliticamente estáveis. Esse cenário sugere que, embora não admita publicamente, Trump reconhece a gravidade da crise climática, pois ela pode ser utilizada estrategicamente para avançar seus planos megalomaníacos de expandir o imperialismo americano sobre outras nações. Ele provavelmente está considerando um panorama ainda mais amplo: o avanço das mudanças climáticas, intensificadas por suas políticas, pode expor partes dos Estados Unidos a impactos climáticos extremos, como o aumento do número de refugiados climáticos, a perda de áreas agrícolas e a degradação de outros recursos naturais. Isso reforçaria a necessidade de buscar novos territórios com condições climáticas mais estáveis, justificando, em sua perspectiva, a expansão territorial americana sobre países como Canadá e México.
Além disso, a ampliação da exploração de petróleo e gás compromete seriamente as chances de mitigar a crise climática. Estudos recentes publicados nos Proceedings of the National Academy of Sciences (Anais da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos) indicam que várias regiões do planeta estão prestes a enfrentar ondas de calor letais devido ao avanço das mudanças climáticas, incluindo a Amazônia central. Para cidades como Manaus, isso representa um cenário de contagem regressiva até que a região atinja condições que podem torná-la inóspita para a vida humana. Entretanto, o aumento da temperatura pode transformar, no futuro, os territórios atualmente congelados em regiões com climas semelhantes aos das zonas temperadas, como já foram no passado.
Como já destaquei em publicações no periódico Nature, nunca foi tão crucial que o Brasil assuma a liderança em uma verdadeira transição energética, abandonando a exploração petrolífera em favor de energias mais limpas, como a eólica e a solar. O avanço das mudanças climáticas não só aumenta a prevalência de patógenos conhecidos, como também interfere nos ciclos de patógenos que estavam adormecidos em áreas amazônicas ainda pouco exploradas. Um exemplo é a emergência de uma nova linhagem do vírus Oropouche na região afetada pela rodovia BR-319, conforme destacado no periódico científico Nature Medicine. Seu ciclo é influenciado pela crise climática, que intensifica eventos extremos como inundações severas e secas relacionadas ao El Niño e La Niña, alterando a distribuição e abundância dos vetores, favorecendo sua reprodução e ampliando a exposição humana — um tema já abordado na revista Cenarium.
Além disso, o degelo no Ártico também está expondo camadas de solo e formas de vida preservadas por mais de 12 mil anos sob a camada de gelo. Um artigo científico publicado na Environmental Sustainability destaca que ambientes permanentemente congelados, como geleiras e permafrost, atuam como reservatórios naturais de uma imensa quantidade de micro-organismos, em sua maioria inativos, incluindo patógenos humanos. Com o aquecimento global e o aumento do derretimento do gelo, estima-se que aproximadamente quatro sextilhões (4 × 10²¹) de micro-organismos sejam liberados anualmente de suas barreiras congeladas, entrando nos ecossistemas naturais e aproximando-se de assentamentos humanos. O estudo da Proceedings of the National Academy of Sciences (Anais da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos) também aponta que as áreas sob a camada de gelo nos territórios da Groenlândia e do Canadá estão entre as mais afetadas pelo aumento da temperatura nas últimas décadas. Isso levanta a questão: estaria Trump interessado em explorar esses territórios cobertos por gelo, possivelmente em busca de recursos como petróleo?
Essa liberação massiva de micro-organismos potencialmente patogênicos, muitos dos quais desapareceram da Terra há milhares ou até milhões de anos, pode desencadear epidemias e novas pandemias. Casos recentes, como os surtos de antraz na Sibéria e a identificação de patógenos bacterianos e virais em geleiras ao redor do mundo, corroboram essa hipótese. Assim, é plausível imaginar que, o futuro próximo, seja marcado pelo avanço da crise climática, aumento de conflitos globais e novos surtos epidêmicos.
(*) Lucas Ferrante é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal) e possui Mestrado e Doutorado em Biologia (Ecologia) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Ferrante é o pesquisador brasileiro com o maior número de publicações como primeiro autor nas duas principais revistas científicas do mundo, Science e Nature. Atualmente, atua como pesquisador na Universidade de São Paulo (USP) e na Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
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