Dono da Havan foi quem mais ajuizou ações contra jornalistas, diz Abraji

O empresário Luciano Hang (Composição de Weslley Santos/CENARIUM)
Da Cenarium*

SÃO PAULO – O assédio judicial a jornalistas atingiu um pico em 2020 e tem, desde então, patamar mais alto que em anos anteriores, mostra levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). O estudo mostra o aumento do número de casos ocorridos em razão de reportagens e aponta foco na mídia tradicional, em detrimento de blogs, sites independentes ou perfis pessoais.

Ainda segundo a pesquisa, integrantes do sistema de Justiça são aqueles que menos ajuízam ações de assédio se comparados a outros atores que podem exercer pressão desproporcional contra jornalistas. Ainda assim, estão entre aqueles que mais alcançam decisões favoráveis em casos envolvendo indenizações exorbitantes.

Desenvolvido com o apoio da Unesco (braço das Nações Unidas para educação e cultura), o projeto levantou casos de assédio de 2008 a março de 2024 a partir de diferentes técnicas de coleta de dados, como denúncias, registro de casos notórios e extração de processos encontrados em acervo do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

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A entidade definiu como assédio judicial “o uso de medidas judiciais de efeitos intimidatórios contra o jornalista, em reação desproporcional à atuação jornalística lícita sobre temas de interesse público“.

Não entraram na classificação processos judiciais considerados dentro da normalidade. “É preciso que a ação seja evidentemente infundada ou que as estratégias processuais utilizadas sejam abusivas, causando exaustão à vítima e prejuízo do exercício do seu direito de defesa“, aponta o relatório.

A pesquisa levantou 654 processos contra jornalistas, distribuídos em 84 casos. Segundo o levantamento, desde 2020 há um aumento de ações se comparado ao observado a partir de 2009. Foram 54 em 2021, 52 em 2022 e 49 em 2023. Até março de 2024, foram contabilizados 5 casos. O pico foi 2020, com 261 ações. Entre 2009 e 2019, os valores variaram de 2 ações por ano (2013) a 39 (2016).

O ano de 2008 teve 98 ações, puxadas por caso emblemático envolvendo a então jornalista da Folha Elvira Lobato, processada mais de 100 vezes depois de publicar reportagem sobre o patrimônio empresarial de dirigentes da Igreja Universal do Reino de Deus.

De acordo com a Abraji, dois fatores ajudam a explicar o pico de 2020.

Um é a campanha coordenada contra o escritor e então colunista da Deutsche Welle J. P. Cuenca, processado mais de 140 vezes por pastores da Igreja Universal, e outro, a atuação do empresário Luciano Hang, que ajuizou ações contra “reportagens e colunas que o criticavam por sua atuação na pandemia em apoio à política sanitária do governo de Jair Bolsonaro“.

Hang foi identificado como quem mais ajuizou ações contra jornalistas enquadradas pelo levantamento como assédio. Ele aparece em primeiro lugar com 53 ações no período pesquisado, seguido pelo advogado Guilherme Henrique Branco de Oliveira (47) e a ONG Associação Nacional Movimento Pró Armas (17).

Também aparecem na lista o empresário Daniel Dantas (15), a deputada federal pelo PL de Santa Catarina Julia Zanatta (12), a ONG Médicos pela Vida (12), o deputado federal pela União Brasil e pré-candidato à prefeitura de São Paulo Kim Kataguiri (8) e Orlando Morando Jr. (8), prefeito de São Bernardo do Campo (SP) pelo PSDB.

O estudo identificou a mobilização de quatro tipos de poderes passíveis de desequilibrar a relação entre autor e vítima e, assim, promover o assédio contra jornalistas: o político (mobilizado por atores como autoridades do governo e lideranças partidárias), o econômico (empresários ou empresas com patrimônio significativo), o associativo (igrejas, corporações e outros grupos) e o jurídico (profissionais do direito e do sistema de Justiça).

Na divisão, o poder mais mobilizado foi o associativo (57,4% do total de processos levantados), seguido pelo político (19,8%) e econômico (13,7%). O jurídico fica em último lugar (8,1%), mas é aquele que mais consegue decisões favoráveis a indenizações exorbitantes em casos de assédio (6 a cada 10).

Leia a reportagem na íntegra neste link.

Leia mais: Juiz condena Hang a pagar R$ 85 milhões por coagir funcionários nas eleições
(*) Com informações da Folhapress
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