Economista diz que incentivos sem exigências podem limitar impacto de Zona Franca no PA
Por: Fabyo Cruz
23 de setembro de 2025
BELÉM (PA) – O economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia dos Estados do Pará e Amapá (Corecon PA/AP), Nélio Bordalo Filho, afirmou à CENARIUM que os incentivos fiscais, previstos em uma proposta de criação da Zona Franca da Bioeconomia em Belém, têm potencial para estimular a criação de novos negócios, atrair investimentos e gerar empregos, condicionados à existência de contrapartidas estruturadas. Por outro lado, o especialista destacou que, sem exigências de conteúdo local, cláusulas de pesquisa e desenvolvimento e programas de qualificação profissional, o modelo pode resultar na instalação de projetos de montagem, com impacto econômico reduzido.
A criação do modelo econômico no Pará está em tramitação na Câmara dos Deputados. Na última quarta-feira, 17, a Comissão de Desenvolvimento Econômico da Casa Legislativa aprovou o projeto que prevê incentivos fiscais a empresas que atuem com desenvolvimento sustentável e de baixo carbono. Entre eles estão isenção de Imposto de Importação (II), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Exportação (IE) para produtos e insumos ligados à bioeconomia, com validade de cinco anos.

“Incentivos fiscais são fortes atrativos, mas sem exigências de conteúdo local, cláusulas de pesquisa e desenvolvimento e programas de qualificação profissional, há risco de que o modelo atraia apenas projetos de montagem, com baixo impacto econômico”, disse o economista.
Ele ressaltou que a bioeconomia tem potencial de diversificação econômica, importante para Belém, cuja economia é hoje centrada no comércio e serviços. “A bioeconomia envolve alimentos, insumos farmacêuticos, cosméticos, bioprodutos e serviços de inovação. Para gerar valor real, é preciso integrar pesquisa científica, pequenos produtores e indústria local. Sem isso, há risco de exportação apenas de matérias-primas, sem agregação de valor”, afirmou Nélio Bordalo Filho.
O economista alertou, ainda, sobre o risco de empresas utilizarem a bandeira da sustentabilidade para garantir benefícios fiscais. “Esse risco é real. É preciso monitoramento robusto, com regras claras, metas mensuráveis e fiscalização em campo, além de participação efetiva das comunidades tradicionais”, explicou.
Lições de Manaus e desafios
O especialista destacou que o modelo pode incluir pequenos produtores e fortalecer a economia local, desde que sejam estabelecidos mecanismos de participação, linhas de crédito diferenciadas e políticas de compra local. “Zonas francas tendem a favorecer empresas com acesso a capital e cadeias internacionais. Mas é possível criar incentivos para pequenos produtores, cooperativas e centros de incubação, garantindo inclusão e benefícios distribuídos de forma equitativa”, afirmou o economista.

Bordalo citou a experiência da Zona Franca de Manaus, criada em 1957, como referência para Belém. “Sem estratégia de conteúdo local e inovação, parte do sistema vira montagem de produtos de baixo valor agregado. Governança, revisão periódica e integração com políticas de educação, infraestrutura e logística são fundamentais para o sucesso do modelo”, disse.
Ele também criticou o prazo de cinco anos previsto para os incentivos. “Cinco anos podem atrair projetos pilotos, mas a consolidação de um polo de bioeconomia exige pelo menos dez anos de horizonte. É preciso planejamento de longo prazo e políticas de acompanhamento”, destacou.
Apesar dos desafios, Bordalo enxerga potencial estratégico em Belém. “A cidade reúne condições favoráveis, como institutos de pesquisa, universidades, porto e aeroporto. Mas ainda precisa de investimentos em infraestrutura industrial, parques tecnológicos e capacitação técnica. Se bem estruturado, o modelo pode reduzir desigualdades sociais, estimular a contratação local, apoiar pequenos produtores e reconhecer o papel dos povos tradicionais na bioeconomia”, concluiu.
Proposta na Câmara
O substitutivo aprovado na comissão da Câmara dos Deputados foi apresentado pelo deputado Alexandre Guimarães (MDB-TO) ao Projeto de Lei 4958/23, de autoria da deputada Elcione Barbalho (MDB-PA). O projeto de lei dota definição de bioeconomia alinhada à Estratégia Nacional de Bioeconomia (Decreto 12.044/24) e inclui critérios mais rigorosos de sustentabilidade, ética, inclusão e uso responsável da biodiversidade.
A proposta ainda será analisada pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Para virar lei, precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.