Homem combatendo o fogo em Lábrea, Amazonas (Ana Jaguatirica/Cenarium)
Imagine ver o fogo se aproximando, ameaçando destruir tudo o que você conhece como lar: sua casa, sua fonte de alimento, o território que define quem você é e faz de você parte do seu povo. A fumaça sufoca anciãos e crianças, enquanto você e os seus, sozinhos, armados apenas com baldes de água e galhos, tentam conter um paredão de chamas.
Essa cena foi retratada em dezenas de fotos de queimadas em Terras Indígenas (TIs) e territórios de outros povos tradicionais neste ano. A cada imagem, penso no desespero e no abandono desses povos, celebrados como “guardiões da floresta”, mas frequentemente esquecidos, quase sem apoio, em uma luta solitária pela preservação e pela sobrevivência, enfrentando ainda os efeitos da crise climática. É nesse cenário que encontramos a matéria-prima de nossa reportagem de capa.
De janeiro a agosto de 2024, o número de focos de queimadas em Territórios Indígenas já havia aumentado 80% em comparação ao ano passado, segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). Nesse período, já haviam sido queimados 3 milhões de hectares, o equivalente a 27% dos mais de 11 milhões de hectares de área queimada em todo o Brasil.
Os números são alarmantes, porque, historicamente, os Territórios Indígenas funcionam como oásis de preservação. Segundo dados do MapBiomas, as Terras Indígenas haviam perdido menos de 1% de sua vegetação nativa entre 1985 e 2022. Nas áreas privadas, a devastação no mesmo período foi de 17%.
Esses dados confirmam que, por seu modo de vida, os povos originários garantem a existência da natureza viva em seus territórios, a exemplo do que ocorre também com os quilombolas.
Mesmo assim, em muitos territórios afetados pelo fogo neste ano, os indígenas e outros povos tradicionais se viram com pouco ou nenhum suporte para combater as queimadas. Esse foi o caso da Terra Indígena Caititu, em Lábrea, no sul do Amazonas, uma das regiões com maior ocorrência de fogo. No território, há apenas uma brigada composta por 23 indígenas, que trabalham sem receber remuneração. Eles dispõem de equipamentos de segurança insuficientes, quatro bolsas de água de 20 litros, um triciclo e, acima de tudo, muita determinação e coragem. Essa realidade reflete o que ocorre em outras TIs do País. O Estado investe na formação de brigadas, formadas em sua maioria por indígenas e quilombolas, mas elas ainda são insuficientes.
Os indígenas e outros povos tradicionais têm o direito de simplesmente viver e serem livres à sua maneira, mas são forçados a lutarem pela sobrevivência. Nem consigo imaginar o peso das dores que carregam.
Capa da edição 53 da Revista Cenarium – “Na Linha de Frente” (Fotos por Joédson Alves/Agência Brasil e Ana Jaguatirica/CENARIUM | Design por Hugo Moura/CENARIUM)
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