EDITORIAL – Sofrimento sem fim, por Márcia Guimarães
11 de maio de 2023
Morador da comunidade da Sharp em meio à destruição causada pela chuva na capital amazonense (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
Ano após ano, o cenário se repete no “inverno amazônico”. Começa a chover forte e, nas cidades da região, ruas alagam, casas ficam embaixo d’água, crateras se abrem, barrancos deslizam, rios invadem comunidades, milhares de famílias pobres perdem todo o pouco que tinham e vidas se perdem. É sabido que o período chuvoso, que costuma ir de novembro a abril, tem se tornado mais intenso e irregular pelas mudanças climáticas. Mas, será que a culpa dos prejuízos e mortes é somente da fúria da “mãe natureza”? Não. É preciso considerar o fator governança nesse binômio no qual o resultado costuma ser trágico.
Neste ano, temos visto impactos das chuvas e cheias dos rios em grande parte dos Estados da Amazônia Legal, principalmente no Amazonas, Pará, Acre, Maranhão, Tocantins e Rondônia. As precipitações têm registrado marcas impressionantes, como os mais de 100 milímetros acumulados em um só dia em Manaus, em março, mas, nos resultados disso, não há nada que já não tenhamos visto antes. O sofrimento da população é o mesmo, há décadas.
A verdade é que as cidades amazônicas cresceram rápido e de forma desordenada, sem planejamento urbano, habitacional e de infraestrutura, que acompanhasse tal crescimento e objetivasse o bem-estar humano. Os altos índices de déficit habitacional mostram que a população pobre foi empurrada para moradias inadequadas e em lugares onde ninguém gostaria de morar. É o que afirmam urbanistas, geógrafos, sociólogos e antropólogos ouvidos pela REVISTA CENARIUM nesta edição, na reportagem de capa, em que voltamos o olhar para a governança de risco de desastres.
Com monitoramentos e alertas de órgãos independentes e até de suas próprias pastas, o poder público sabe onde estão as áreas de risco de deslizamento e inundações, quantas famílias vivem nestes locais e conhece os índices de déficit habitacional. O que falta é planejar ações de longo prazo para evitar ou minimizar os impactos, o que levaria o gerenciamento de desastres para o campo preventivo. Por enquanto, as medidas anunciadas pelas gestões públicas têm caráter emergencial e assistencialista. E a população segue pagando o preço de um sofrimento que parece não ter fim.
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