Eleição de Alcolumbre cria expectativas sobre pautas da Amazônia
Por: Ana Cláudia Leocádio
02 de fevereiro de 2025
BRASÍLIA (DF) – A eleição do senador Davi Alcolumbre (União) para a presidência do Senado gera expectativas para pautas que atingem diretamente os interesses dos Estados da Amazônia, pelo fato de ser um representante do Estado do Amapá, que integra a região formada por nove Estados. Eleito nesse sábado, 1º, com 73 votos dos 81 senadores, o amapaense assumiu seu segundo mandato no comando da Câmara Alta do Legislativo.
Concorreram à presidência do Senado, os senadores Marcos Pontes (PL-SP) e o candidato do Novo-CE, Eduardo Girão. Cada um recebeu quatro votos. Os senadores Soraya Thronicke (MS) e Marcos do Val (ES), do Podemos, desistiram de concorrer.
Quando foi eleito para o primeiro mandato, em 2019, Alcolumbre venceu por um voto de diferença, obtendo 42 sufrágios. A vitória fragorosa desse sábado eleva a responsabilidade do senador diante dos interesses das bancadas no Senado, uma vez que foi apoiado por dez partidos, do PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Entre as pautas destacadas por parlamentares, um ministro da região e pelo governador do Amazonas, Wilson Lima (União), estão propostas que pretendem colocar na Constituição o Marco Temporal na demarcação de terras indígenas, os próximos pontos de regulamentação da Reforma Tributária, a repavimentação do Trecho do Meio da BR-319 (que liga Manaus-AM a Porto Velho-RO) e temas de desenvolvimento sustentável.
Para o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), a defesa e a proteção da Amazônia é uma prioridade do governo federal com o “reconhecimento e o desenvolvimento sustentável de sua gente”. Para o parlamentar, a agenda do presidente Lula é voltar-se para a reconstrução nacional, incluindo a defesa dos povos indígenas e combate aos efeitos do aquecimento global.
“Desenvolver com sustentabilidade não significa que os interesses que os povos da Amazônia querem e defendem para o seu desenvolvimento não são da agenda do governo. A nossa agenda para a Amazônia vai ser voltada a isso, ao desenvolvimento de sustentabilidade e com a defesa dos povos da floresta”, afirmou.

O senador Marcos Rogério (PL), da bancada de Rondônia, disse acreditar que a nova configuração política, construída para a eleição de Davi Alcolumbre, dará protagonismo à oposição, a partir de 2025 no Senado, principalmente porque vai presidir duas comissões estratégicas: de Infraestrutura e de Segurança Pública. No mandato de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a oposição ficou de fora das comissões mais cobiçadas. Essa nova configuração, reiterou o parlamentar, ajudará a encaminhar pautas prioritárias importantes também para a região amazônica.
“Acho que ali [na Amazônia] nós temos diversas ações, a política do desenvolvimento regional. Ela precisa ser revista nesse momento com muito cuidado”, afirmou Marcos Rogério.
Outra preocupação, é com a Reforma Tributária, pois ele sustenta que o texto sancionado tira dos Estados o estímulo ao desenvolvimento regional, reduzindo a competividade. Dois outros projetos que regulamentam o novo sistema tributário do País entrarão em análise no Senado, neste ano.
Rogério também defende pavimentação do Trecho do Meio da BR-319, assim como a regularização fundiária na Amazônia, condição para a proteção do meio ambiente.

“A BR-319 é uma promessa que não sai do papel, no governo anterior isso começou a avançar. A primeira etapa dessa obra saiu e, de lá para cá, entraves ambientais, entraves jurídicos não permitem”, disse. Para o senador, a estrada não é um luxo, é um corredor logístico necessário para integrar os Estados do Norte ao Brasil.
Sobre os projetos que afetam os povos originários, a quem Rogério chama de “índios”, ele opina que essa discussão é importante, mas que precisa de equilíbrio no debate, olhando para todos os povos, sem se dissociar da sociedade como um todo.
“É preciso olhar para o ‘índio’ e tem muita gente que defende o ‘índio’ da aldeia para dentro, não sabendo qual é a realidade do ‘índio’, como que vive o ‘índio’, o que que o ‘índio’ está comendo, como que o índio está vivendo. Se tem lá um módulo sanitário dentro da sua aldeia ou não, se ele está vivendo dignamente ou não”, declarou.
Ministro defende legado do Amapá
O ministro da Integração e do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes (PDT-AP), não é parlamentar no Congresso, mas esteve no Senado para acompanhar a votação para a presidência. Para ele, o fato de Alcolumbre ser do Amapá, um Estado que tem todas as suas terras indígenas demarcadas, com carbono negativo e com políticas consistentes voltadas para os indígenas, sobretudo na área de educação, prepara-o para lidar de forma equilibrada com as pautas que tramitam no Senado e que abrangem esses temas.
“Então, o Davi é filho dessa relação, filho dessa construção. Chega com muito mais maturidade para lidar com essas questões. Agora, por outro lado, também vive numa Amazônia onde milhares de pessoas precisam também de oportunidade. Nós somos defensores de que a política de mineração aconteça, respeitando o meio ambiente, os povos tradicionais”, disse Góes. O ministro diz não ver incompatibilidade, desde que feito com transparência e rastreabilidade.

Para Góes, Davi Alcolumbre não deve seguir os radicais de esquerda e de direita, porque o papel de presidente do Congresso Nacional é ser mediador. “A Amazônia tem 30 milhões de pessoas que precisam ser atendidas”, disse, acrescentando que o modelo de desenvolvimento para a região não tem dado resultados, porque seus Estados continuam sendo esmagados pelos piores indicadores sociais do Brasil.
Aziz quer regulamentar exploração de riquezas
O senador Omar Aziz, líder do PSD no Senado, enfatizou a necessidade de buscar o asfaltamento do Trecho do Meio da BR-319, porque vai trazer benefícios não apenas para o Amazonas e Rondônia, mas para o Acre e Roraima. Ele ressalta que falta vontade política dos órgãos ambientais para emitir a licença que autoriza as obras nos 400 quilômetros, que hoje estão intrafegáveis.
“Não dá para dizer que o governo não tenha competência de cuidar de uma estrada de 400 quilômetros. Se não tem condições de cuidar de uma estrada de 400 quilômetros, porque hoje com a tecnologia que existe, de satélite e um monte de coisa, ninguém vai desmatar aquela área. E mais, de um lado e de outro é várzea”, disse.
Sobre projetos que impactam a Amazônia e os direitos dos povos indígenas, Omar defende a regulamentação da exploração das riquezas porque da forma que está, o Brasil perde divisas com o roubo desses produtos, como ouro extraído ilegalmente.

“Os indígenas têm todo interesse em melhorar a qualidade de vida. Eles têm riquezas embaixo deles, que poderiam estar melhorando, sustentavelmente. Ou você faz isso de uma forma regulamentando ou daqui a pouco vai acontecer o que aconteceu em Roraima, em que os brancos entraram lá e tomaram conta daquela área e os Yanomami passaram o que passaram e todo mundo viu isso”, ressaltou o senador.
Na visão de Omar, desde a Constituição de 1988, muita coisa mudou no cenário nacional e a demarcação das terras indígenas não significa que não se pode abrir para exploração das riquezas.
“Temos que regulamentar e temos que acabar com esse negócio desse fundamentalismo de que a Amazônia não pode ser explorada sustentavelmente. Você tem crédito de carbono, tem uma série de coisas que precisam acontecer, porque a população não pode sofrer e padecer por pessoas que não defendem os interesses nacionais. Se os interesses nacionais estivessem sendo defendidos nesse momento nós não éramos dependentes de fertilizantes, estaríamos extraindo mais petróleo”, concluiu.
Valério focará na ZFM e BR-319
O senador Plínio Valério, que passou a ser líder do PSDB no Senado, nesse sábado, também diz que o fato de Alcolumbre ser do Amapá, pode contribuir para furar a barreira da pauta ambiental, no sentido de defender a exploração de petróleo e das riquezas naturais dos Estados amazônicos.
Para o Amazonas, o tucano disse que o interesse será as questões que envolvem a Zona Franca de Manaus (ZFM) e o asfaltamento da BR-319. Ele prefere também tocar a pauta nacional, como a proposta que fixa mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Depois de elogiar Alcolumbre, Valério não quis declarar voto no senador amapaense. “Mas vai ser a primeira vez que eu vou votar secreto, porque eu não vou revelar meu voto”.
Wilson Lima define pautas prioritárias
O governador Wilson Lima, que esteve nos últimos dias em Brasília participando das reuniões de seu partido, o União Brasil, também prestigiou a eleição da Mesa Diretora do Senado. Ele disse que há questões sensíveis ao Estado do Amazonas, como na área de infraestrutura, sobretudo a BR-319, os temas ambientais relacionadas à 30ª Conferência sobre Mudança do Clima (COP 30) e os demais projetos que regulamentam a Eeforma Tributária.
“A Reforma Tributária, as questões relacionadas à COP30, principalmente a questão da Lei do Crédito de Carbono, e de outras alterações que eventualmente precisarão ser feitas. Nós estamos vigilantes a todas as decisões que serão tomadas com relação à questão ambiental e o desenvolvimento sustentável”, disse o governador.
Levado ao plenário do Senado por Omar Aziz, Lima foi perguntado se essa aproximação seria sinal de aliança para as eleições de 2026, negou qualquer possibilidade de união e disse que a eleição ainda está longe.
“O senador Omar Aziz e o senador Braga pertencem a outro grupo político, não pertencem ao mesmo grupo político que eu. Tenho uma boa relação política, converso com o senador Omar, que é o presidente da bancada, mas meu alinhamento político é outro, todo mundo sabe disso”, enfatizou Lima, que se alinha ao ex-presidente Bolsonaro.

Wilson Lima também integra o time que acredita nas facilitações que podem surgir na gestão de Alcolumbre, pelo fato de ser um representante de um Estado amazônico, o Amapá.
“No momento em que se tem um diálogo com o presidente da Câmara, que é o Hugo Motta. No momento em que se tem um diálogo com o presidente do Senado, o Davi Alcolumbre, que inclusive é do meu partido União Brasil, é da Região Norte, é do Estado do Amapá, isso facilita muito esse entendimento e as decisões. Veja você o que foi a briga agora, na aprovação de mais uma etapa nessa questão da reforma tributária”, ressaltou.
Lima também destaca a votação da Lei dos Créditos de Carbono, que precisou de uma forte articulação para não aprovar dispositivos que prejudicassem os Estados da região. “Se não houvesse a intervenção dos governadores do consórcio da Amazônia, teríamos uma lei que seria muito danosa para os estados, inclusive para o Estado do Amazonas”, afirmou.
Sobre a BR-319, o governador disse aguardar um posicionamento do governo federal em relação ao cumprimento das condicionantes de cada ente federado, para que o pedido da licença de instalação possa ser enviado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Em dezembro de 2024, o governador e os técnicos do Amazonas participaram de uma reunião interministerial, no Palácio do Planalto, para tratar das responsabilidades de cada um nesse processo de conseguir a licença para o asfaltamento do trecho do meio da rodovia.
“Nós estamos esperando o posicionamento do governo federal, esse é um momento muito mutuado de início de governo. As questões da economia acabam consumindo muito tempo de todo mundo, de todos os ministros. Eu estou na expectativa aqui de ser chamado para a gente entender qual a competência de cada ente, o que vai fazer o Estado, o que vão fazer as prefeituras”, informou Lima.
Amazônia praticamente ausente do discurso
Em seus dois discursos proferidos na tribuna do Senado, um antes da eleição e outro após a vitória, em nenhum trecho a Amazônia foi citada por Davi Alcolumbre.
A única vez em que a região foi mencionada pelo novo presidente foi durante um pronunciamento à imprensa, após se confirmar sua vitória, no qual defendeu as prerrogativas dos parlamentares de proporem emendas ao Orçamento, para viabilizar recursos aos seus Estados, principalmente os periféricos “que sempre foram esquecidos do centro de poder nacional”.
“Essa é a realidade que vivemos no meu Norte, na nossa Amazônia Brasileira, mas que vive também o Nordeste, num País com dimensões continentais com vários brasis dentro de um Brasil. Quem é o legítimo representante, que pode chegar na condição como deputado e dizer para o Estado brasileiro o que será importante para desenvolver aquela região? E é por isso que eu vou reafirmar a minha defesa que eu sempre fiz da autoridade do legislativo brasileiro de construir o orçamento público do Brasil”, enfatizou.
Após vencer a eleição para a presidência do Senado, Alcolumbre disse em pronunciamento à imprensa, que sua vitória com 73 votos é a demonstração de que o Poder Legislativo está pacificado e prometeu trabalhar com todos os 81 senadores a elevarem a importância do Senado Federal, nas discussões dos projetos para o Brasil.
Em seu discurso em plenário, ele lembrou que há seis anos foi eleito com 42 votos. “Esse amplo apoio, mesmo em um contexto com várias candidaturas, demonstra que o Senado Federal está unido e sabe a direção na qual pretende caminhar”, ressaltou.

O novo presidente disse que não será “caixa de ressonância dos extremos”, porque a polarização persiste no Brasil e só atrapalhou o País. “Eu quero ser esse catalisador, no que for possível, de ouvir todos os pontos de vistas, de todas as questões, mas eu tenho um desejo, não quero que o Congresso Brasileiro seja a caixa de ressonância de extremos, não é bom para o Brasil, não está sendo bom para o Brasil essa polarização constante, de aversões constantes, que a gente vive uma eterna disputa eleitoral e que eu vou pedir para que todo mundo pense no Brasil, que deixe as disputas ideológicas, políticas e eleitorais para o ano da eleição”, disse.
O senador lembrou que as divergências entre os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), só enfraqueceram o Legislativo porque, muitas vezes, o Senado foi chamado apenas a dizer sim ou não aos projetos do governo, e deixou de instalar uma Comissão Mista de Medidas Provisórias. Segundo Alcolumbre, chegou-se ao ponto, do governo reunir-se primeiro com o presidente da Câmara para discutir que projetos enviar ao Congresso em regime de urgência.
“Nós éramos chamados nos 45 segundos do segundo tempo e era feito um apelo para que a gente votasse direto do plenário, com o relator de plenário, uma matéria muito relevante que poderia, e com certeza seria aprimorado, se o Senado da República tivesse tempo de apreciar, por exemplo, numa Comissão Mista Medida Provisória”, reclamou.
Alcolumbre declarou, ainda, que fará todos os esforços, como chefe de poder, pela harmonia entre os três poderes, mas privilegiará a autonomia e autoridade do Poder Legislativo.
Apenas Alcolumbre foi eleito por votação. Os demais membros da mesa diretora foram escolhidos por aclamação, quando não há outros concorrentes.
Demais membros:
- Primeiro vice-presidente: Eduardo Gomes (PL-TO)
- Segundo vice-presidente: Humberto Costa (PT-PE)
- Primeira Secretaria: Daniella Ribeiro (PSD-PB)
- Segunda Secretaria: Confúcio Moura (MDB-RO)
- Terceira-Secretaria: Ana Paula Lobato (PDT-MA)
- Quarta-Secretaria: Laércio Oliveira (PP-SE)