Em Dia Internacional, secretário-geral da ONU alerta para impacto da pandemia em indígenas

A maioria dos casos em povos originários se concentra nas Américas, um dos principais epicentros do vírus (PAHO/ Karen González Abril)

Da Revista Cenarium*

MANAUS – Celebrado anualmente em 9 de agosto, o Dia Internacional dos Povos Indígenas de 2020 foi marcado por preocupações. Nesse domingo, 9, por meio de comunicado oficial, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, fez um alerta sobre o impacto da pandemia do novo Coronavírus nas populações indígenas do mundo todo.

De acordo com dados da organização, mais de 70 mil indígenas foram contaminados pela Covid-19 desde o início do surto da doença. A maioria dos casos em povos originários se concentra nas Américas, um dos principais epicentros do vírus. São, aproximadamente, 23 mil infectados só entre os 190 povos que vivem na região da bacia amazônica.

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Guterres sinalizou que as populações tradicionais geralmente desenvolvem doenças advindas de pessoas de fora das aldeias: “Na história, povos indígenas foram dizimados por doenças trazidas de outros lugares, para as quais eles não têm nenhum tipo de imunidade”, pontuou.

Além disso, segundo ele, pessoas indígenas ainda têm de enfrentar precárias iniquidades, estigmatização e discriminação. Com a pandemia, situações como acesso inadequado a sistemas básicos de saúde ou utilização de água potável são salientados e aumentam a vulnerabilidade dessa população.

É preciso ter resiliência

Povos indígenas demonstram alta resiliência no enfrentamento à Covid-19 (Mongabay/Daniel Aguilar)

Na ocasião, Guterres lembrou que, mesmo com muitos empecilhos, os povos originários demonstram alta resiliência no enfrentamento à Covid-19, inclusive com a utilização de técnicas de tratamentos tradicionais, que para ele poderiam ser usados na medicina a nível global.

Para a revista National Geographic, o indígena João Paulo Tukano, da etnia tukano no rio Tiquiê, região do Alto Rio Negro, noroeste do Amazonas, ressaltou a importância das ervas, aliadas a remédios comuns: “Nossas concepções de saúde e doença passam por outra lógica. E nossas técnicas são muito mais voltadas a partir da consideração de que o corpo é afetado por uma rede de relações com a água, a floresta e o ar. Tudo isso está em jogo quando se fala na questão da saúde. Espero que um dia as pessoas entendam isso”, defendeu.

Um dos exemplos citados pelo secretário, o povo Karen da Tailândia, se utiliza do “Kroh Yee” como medida alternativa de proteção: o ritual consiste no fechamento completo das entradas e fronteiras das comunidades, desse modo nenhum tipo de invasor ou possível portador da Covid-19 consegue adentrar nas zonas tradicionais.

Outras perdas

Líder Aritana Yawalapiti morreu em decorrência da Covid-19 no último dia 5 (Antônio Carlos Banavita)

Além do aumento contínuo do número de infectados, os povos indígenas também encaram outros prejuízos, como explicou Guterres. Muitos perderam os trabalhos, baseados especialmente na manufatura e confecção de materiais artesanais. As mulheres, provedoras de comida e sustento em grande parcela das aldeias, foram particularmente impactadas com o fechamento de mercados de artesanato.

Em entrevista à Folha de SP, o pajé Ary Tucunduva de Fari da Aldeia Lobo Velho em Suzano citou a crise econômica em decorrência da mudança de rotina: “Para evitar os riscos de contágio da doença cancelamos os nossos encontros e as vendas de artesanatos nas feiras. Com isso a situação financeira ficou bem apertada”, afirmou.

Mais do que perda econômica, há também o extermínio da história de tais povos, resultado da morte de anciões. A alta-comissária de direitos humanos da ONU, Michelle Bachelet, lamentou essa estatística: “Foram registrados números superiores a 1 mil mortes, incluindo muitos anciões com conhecimento de tradições ancestrais, como a trágica morte do líder Aritana no Brasil”, disse.

(*) Jarleson Lima, sob a supervisão de Luís Henrique Oliveira

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