Entidades ambientais pedem adiamento da votação do ‘PL da Devastação’ na Câmara
Por: Ana Cláudia Leocádio
11 de julho de 2025
BRASÍLIA (DF) – A presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, deputada Socorro Neri (PP-AC), prometeu levar ao presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), o pedido de entidades ambientais para adiar, por 90 dias, a votação do Projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental (PL 2159/2021), que está previsto para ser apreciado pelo plenário, na próxima semana, última antes do recesso parlamentar do meio do ano.
Apelidado pelos ambientalistas como “PL da Devastação”, a proposta tramita há 15 anos no Congresso Nacional e passou quatro em análise no Senado, onde recebeu 32 emendas. As alterações dos senadores deverão ser analisadas pelos deputados federais, que podem aprová-las ou rejeitá-las. O texto enfrenta resistência do setor ambiental por flexibilizar regras importantes do licenciamento, mas recebe apoio do setor produtivo, que considera o PL fundamental para destravar o desenvolvimento do País.

O pedido de adiamento partiu do diretor-presidente do instituto Ethos de empresas e responsabilidade social, Caio Magri, durante participação, nesta quinta-feira, de audiência pública realizada na comissão para discutir os impactos e riscos do projeto do licenciamento. Magri disse que enviará a solicitação ao presidente da Casa, Hugo Morra (Republicanos-PB), para que seja dado pelo menos 90 dias para se debater as alterações feitas no Senado, que não foram devidamente discutidas com a sociedade.
Designado relator da matéria, o deputado Zé Vitor (PL-MG) já emitiu o parecer preliminar, cuja principal mudança foi a rejeição à emenda dos senadores que suprimia o dispositivo que previa obediência às regras definidas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para licenciamento de empreendimentos de mineração de grande porte. No texto aprovado pela Câmara, os deputados já haviam retirado a mineração do projeto.

Ao propor o adiamento, Caio Magri expôs pelo menos sete motivos. Dentre eles, a necessidade de maior tempo para debater as mudanças aprovadas no Senado, que resultarão em impactos diretos nos biomas brasileiros, além da ameaça aos compromissos internacionais firmados pelo Brasil na área do meio ambiente, muitos deles em debate na 30ª Conferência das Nações Unidas para a Mudança do Clima (COP30), a ser realizada em novembro, em Belém.
Ao encerrar a audiência pública, que contou com vários representantes da sociedade civil, assim como do Ministério de Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Socorro Neri disse que fará todos os esforços para tentar o adiamento junto a Hugo Motta, embora saiba que a missão é difícil, diante da definição da pauta pelo colégio de líderes.
Segundo informações da Agência Câmara, o líder do governo na Casa, deputado José Guimarães (PT-CE), afirmou que o Poder Executivo vai negociar pontos de consenso para aprovar o texto em sintonia com as orientações da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

“Isso vai forçar a gente a trabalhar para um acordo. Estamos conversando com a ministra Marina e nada vai ser votado sem o aval dela. Vamos conversar, vamos buscar compatibilizar com o relator, deputado Zé Vitor, que está com boa vontade para negociar e as negociações já avançaram bastante”, afirmou Guimarães.
Mais de 20 anos em tramitação
O PL 2159/2021 foi originalmente protocolado sob o número 3729, em 2004, e foi arquivado e desarquivado três vezes pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, sendo a última em 2019. A matéria só foi aprovada pelo plenário no dia 13 de maio de 2021, com 290 votos favoráveis e 115 contrários, e foi encaminhada ao Senado.
O novo texto com 32 emendas chegou de volta à Câmara no dia 26 de maio deste ano. Dois dias depois, a deputada Socorro Neri apresentou o requerimento para a realização da audiência pública na Comissão de Meio Ambiente, que só ocorreu nesta quinta-feira, 10, já depois do relatório apresentado por Zé Vitor.
A proposta teve regime de urgência aprovado, o que permite que seja analisado diretamente no plenário, o que deve acontecer na próxima semana, segundo decisão tomada pelo colégio de líderes.
Governo em extrema preocupação
Na audiência pública desta quinta-feira, os representantes do governo federal manifestaram extrema preocupação com o texto que será votado na Câmara e apontam danos irremediáveis que devem motivar a judicialização do PL do Licenciamento.
Um dos representantes que apontou os problemas foi o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), João Paulo Capobianco. Ele indicou 40 pontos do projeto que precisam ser reparados pelos deputados.
“Temos vários dispositivos que vão precisar de correção para evitar o que seria um dano irremediável ao sistema de proteção ambiental. Estamos trabalhando intensamente no governo, liderados pela Casa Civil e diretamente pelo ministro Rui Costa, para que a gente possa ter algo que não seja tão impactante e tão danoso para o sistema ambiental brasileiro”, disse.
Capobianco destacou, por exemplo, os riscos de enfraquecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e a aplicação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que instituirá o autolicenciamento, com fiscalização por amostragem, e que avança para empreendimentos de médio porte, que hoje devem obedecer ao modelo trifásico de licenciamento ambiental (licenças prévia, de instalação e de operação).
Há também a preocupação com a fragilização do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, da Lei da Mata Atlântica, uma conquista para a proteção do bioma, e a exclusão da consulta prévia aos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais nos processos de licenciamento que afetam seus territórios.
O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, disse que tramitam no órgão atualmente 4.140 processos de licenciamento ambiental nas áreas de transportes, mineração, linhas de transmissão, hidrelétricas e empreendimentos de petróleo e gás. Segundo o dirigente, o texto que está em plenário não tem condições de ser corrigido, porque serão analisadas apenas as emendas do Senado e isso eleva o risco de judicialização do tema, se aprovado, porque licenciamento ambiental é matéria constitucional.
Leia mais: ‘PL da Devastação’ elevará gastos com impactos ambientais, diz secretário do MMA