Entidades indígenas e quilombolas repudiam ‘discurso racista’ de Helder Barbalho na COP29


Por: Ana Pastana

14 de novembro de 2024
Governador do Pará, Helder Barbalho (Composição: Luiz Paulo Dultra/Revista Cenarium)
Governador do Pará, Helder Barbalho (Composição: Luiz Paulo Dultra/Revista Cenarium)

MANAUS (AM) – Organizações indígenas e quilombolas da Amazônia repudiaram nesta quarta-feira, 13, uma declaração do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), sobre a regulamentação do mercado de carbono, que poderia fazer com que os indígenas não precisassem bater na porta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). A fala ocorreu durante a abertura de um estande, na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2024, a COP29. O evento é realizado em Baku, no Azerbaijão.

De acordo com nota divulgada à imprensa, as organizações afirmaram que a declaração do governador Helder Barbalho é uma fala preconceituosa e desinformada ao se referir que os povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos dependem do mercado de carbono para garantir sustento e dignidade. “Os povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos do Pará e da Amazônia têm um modo de vida que não depende de projetos de mercado de carbono ou de subsídios governamentais para sobreviver”, diz um trecho.

Durante o discurso, Barbalho também disse que o carbono oriundo de áreas indígenas poderia permitir que os povos indígenas pudessem ter qualidade de vida. Ao todo, 25 associações e organizações indígenas e quilombolas assinaram a nota de repúdio que classificou as falas do governador como “racistas”.

A nota conjunta pontuou, ainda, que a fala de Barbalho impõe uma dependência dos povos originários a políticas de governo e reforçam uma “visão reducionista e colonialista sobre nossas comunidades”. As organizações também destacaram que o mercado de carbono não pode pode ser imposto como única solução de desenvolvimento “para as comunidades tradicionais, sem que haja consulta prévia, livre e informada”. As entidades citam a Convenção 169 da OIT.

A fala do governador reforça uma visão reducionista e colonialista sobre nossas comunidades, tratando-nos como se fôssemos meros dependentes de políticas de governo, ao invés de reconhecer nossa autonomia, saberes e práticas sustentáveis. O mercado de carbono, ao contrário do que foi afirmado, não pode ser imposto como única solução de desenvolvimento para as comunidades tradicionais, sem que haja consulta prévia, livre e informada, em respeito à Convenção 169 da OIT”, disse em outro trecho.

A nota também defende que as comunidades indígenas e quilombolas devem ter autonomia sobre os territórios e que a imposição de projetos sem a discussão necessária “desrespeita a história” e coloca em “risco o direito ao território das futuras gerações”.

As comunidades e povos precisam continuar mantendo sua autonomia na gestão de seus territórios, pois é isso que tem garantido um futuro sustentável com respeito à biodiversidade existente na Amazônia. A imposição de tais projetos, sem diálogo e sem respeito aos direitos constitucionais das comunidades, desrespeita nossa história, nossa luta por autonomia e coloca em risco o direito ao território das futuras gerações“, afirmou.

Comercialização da natureza

Para as organizações, o mercado de carbono é uma forma de comercializar a natureza. A nota também destacou que o apoio do governador do Pará ao modelo visa atender aos interesses do capital internacional e desconsidera os direitos e a autonomia dos povos amazônicos.

“Acrescentamos ainda que o crédito de carbono, na modalidade REDD+, representa a comercialização da natureza, um processo financiado por empresas e governos estrangeiros que, assim, continuarão a lançar gás carbônico na atmosfera. Trata-se de comercializar a natureza para garantir a continuidade de lucros”. Com seu apoio a essa iniciativa, o governador do Pará se dispõe a servir aos interesses do capital internacional, desconsiderando os direitos e a autonomia dos povos amazônicos”, declarou.

A nota é assinada por 25 entidades como a Comissão Pastoral da Terra – Regional Pará; Rede de Mulheres das Marés e das Águas do Litoral do Pará; Quilombo Gibrié de São Lourenço; Comitê Chico Mendes; Casa Preta Amazônia; dentre outros.

Leia, na íntegra, o posicionamento do Governo do Pará

O Governo do Pará informa que atua de forma intensiva para recuperar e ampliar os direitos e costumes dos povos indígenas e tradicionais, ameaçados nos últimos tempos por iniciativas diversas. Para isto, está construindo há dois anos, o sistema de geração de créditos de carbono com a participação ativa de indígenas, quilombolas, extrativistas e comunidades tradicionais.

Nos próximos meses, a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) inicia uma nova fase de diálogo com essas populações sobre a destinação de quase R$ 1 bilhão de reais da venda de créditos de carbono, realizada no último mês de setembro, junto à Coalizão LEAF (parceria público-privada) para preservação e recuperação do meio ambiente.

O objetivo do Estado é que, com essa ação, estas populações sejam, devidamente, remuneradas pelos serviços já prestados na preservação do bioma amazônico. O Governo do Pará compreende que a devida remuneração destes serviços prestados historicamente por estes povos é um passo importante dos países poluentes rumo à uma correção histórica.

Veja a nota na íntegra;
Editado por Jadson Lima

O que você achou deste conteúdo?

VOLTAR PARA O TOPO