ESPECIAL | O presidente no Tribunal de Haia – ‘Kit Covid’ (ainda) é prescrito em Manaus

Entrada da UBS José Amazonas Palhano, no bairro São José, na Zona Leste de Manaus (Ricardo Oliveira/Cenarium)

Marcela Leiros – Da Cenarium

MANAUS – Dois meses depois de a CENARIUM mostrar, na edição de agosto, que medicamentos do chamado “Kit Covid”, comprovadamente ineficazes contra a Covid-19 e com risco de efeitos colaterais graves, ainda eram prescritos em unidades de saúde públicas municipais de Manaus, a reportagem foi, novamente, a algumas unidades e constatou que o tratamento precoce segue sendo prescrito. Em alguns casos, a prescrição é feita antes mesmo da confirmação da infecção pelo novo coronavírus.

No dia 22 de setembro, duas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) foram visitadas. A primeira foi a José Amazonas Palhano, no bairro São José 2, Zona Leste da capital amazonense. Ao chegar à unidade foi constatado que não havia médico na especialidade clínico-geral para atender pacientes com síndromes respiratórias. Na pandemia da Covid-19, profissionais foram disponibilizados especialmente para atender à população com sintomas da doença.

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Fachada da Unidade de Saúde da Família (USF) Maria Leonor
Brilhante, bairro Tancredo Neves, Zona Leste de Manaus (Ricardo Oliveira/Cenarium)

A orientação dada na recepção do local foi que seria possível fazer o teste RT-PCR – que identifica o vírus e confirma a infecção – mas, não havia atendimento para prescrição de receituário médico ou emissão de atestado. Ainda segundo o profissional que estava na recepção, o médico não comparece à unidade às quartas-feiras.

Na Unidade de Saúde da Família (USF) Maria Leonor Brilhante, bairro Tancredo Neves, também na Zona Leste de Manaus, foi constatado o atendimento para pacientes com suspeita de Covid-19 e a prescrição de medicamentos sem eficácia comprovada, como azitromicina, por exemplo. Essa prescrição é feita antes mesmo do resultado do teste RT-PCR confirmar ou descartar a infecção pela doença. O receituário médico já impresso traz a lista pronta de medicamentos a serem receitados ao paciente: azitromicina, ivermectina, amoxicilina, xarope guaco, loratadina, prednisona, prednisolona, paracetamol e dipirona.

As visitas a unidades de saúde municipais realizadas para esta reportagem foram feitas nos mesmos moldes das que embasaram matéria publicada na edição de agosto. Na época, também, dois locais foram visitados e, em ambos, foi constatada a prescrição dos medicamentos sem eficácia comprovada.

No Morro da Liberdade, na Zona Sul da capital, além da longa espera de duas horas para concluir o atendimento ao paciente – entre o atendimento com o clínico-geral até o resultado do teste RT-PC a reportagem verificou que idosos receberam receitas com os medicamentos do tratamento precoce.

Em outra unidade de saúde, a UBS Enfª Ivone Lima dos Santos, bairro Coroado, Zona Leste da capital, também foi detectada a prescrição de medicamentos sem a realização do teste RT-PCR. Assim como na outra unidade, um receituário também já estava impresso, mas este continha ainda o medicamento hidroxicloroquina.

Ineficácia dos medicamentos

Em julho deste ano, após mais de um ano do início da pandemia e de várias políticas públicas do governo federal incentivarem o uso do “Kit Covid” no tratamento precoce da Covid-19 – como o lançamento do aplicativo TrateCov em Manaus – o Ministério da Saúde reconheceu a ineficácia dos medicamentos mencionados.

Em documentos enviados à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, a pasta admitiu que a hidroxicloroquina, cloroquina, azitromicina, lopinavir/ritonavir, e a ivermectina, “não possuem evidência que justifique seu uso em pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados nessa população”.

Receita entregue à reportagem em uma
Unidade de Saúde da Família de Manaus,
com itens do chamado ‘Kit Covid’ (Ricardo Oliveira/Cenarium)

Respostas

Questionada sobre os receituários nas unidades de saúde de Manaus, a prefeitura da capital não respondeu à solicitação de respostas. O Ministério Público Federal do Amazonas (MPF) também foi questionado sobre quais procedimentos foram instaurados para investigar o tratamento precoce nos serviços de saúde da capital. Em resposta, informou que o assunto é objeto de ação de improbidade administrativa ajuizada pelo órgão. “A ação passou a tramitar em sigilo, por decisão da Justiça Federal, por isso não é possível repassar outras informações”, diz ainda nota encaminhada à CENARIUM.

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