Especialistas apontam ‘racismo’ e ‘xenofobia’ em fiscalização da Prefeitura de Manaus
Por: Ana Pastana
14 de fevereiro de 2025
MANAUS (AM) – Mulher, negra, imigrante haitiana e vendedora de frutas e legumes, Nerosiane Desir foi alvo de racismo e xenofobia por fiscais da Prefeitura de Manaus no Centro da capital amazonense. É o que apontam especialistas sobre a ação dos servidores municipais, que apreenderam um carrinho e os produtos da comerciante na Avenida Eduardo Ribeiro. A ação repercutiu nas redes sociais nessa quinta-feira, 13.
A advogada, especialista em Africanidades e Cultura Afro-brasileira e ativista do movimento negro Luciana Santos afirma que a ação truculenta dos agentes municipais tem duas linhas: racismo e xenofobia. “Nesse caso há uma intersecção, racismo e xenofobia. Ela é uma mulher preta, pobre e imigrante”, explica.
Luciana afirma que o ato de discriminar não acontece somente nas palavras proferidas pelo agressor. A advogada ressalta que a inação da população, que passa no local no momento da ação, também é um exemplo de discriminação. “A forma violenta como jogam os produtos retrata essa ojeriza. Vale ressaltar ainda que a gente não viu ninguém interceder por ela naquele momento, as pessoas apenas olham e seguem seu caminho. É como se aquele corpo não tivesse valor. Não há empatia”, afirma.

O vídeo, gravado por uma pessoa que presenciou o momento da ação, mostra seis agentes da Secretaria Municipal de Agricultura, Abastecimento, Centro e Comércio Informal (Semacc) jogando verduras dentro da caçamba de uma caminhonete de modelo Hilux, na cor branca, e em seguida, também jogam o carrinho com alimentos. Um agente da Guarda Municipal de Manaus tenta impedir a mulher que tenta parar a ação dos funcionários. A identificação dos servidores não foi divulgada.
Abuso de autoridade
O professor Caupolican Padilha Jr., membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Amazonas (OAB-AM), afirma que os funcionários da Prefeitura de Manaus cometeram abuso de autoridade e que o órgão não assume as responsabilidades cabíveis para a instituição.
“Eles cometeram abuso de autoridade. O Ministério Público deveria agir, mas eu não acredito que façam alguma coisa. Não me surpreende esse tipo de desumanidade por parte de agentes municipais. Em recentes deslizamentos de terra na cidade, prefeito [David Almeida] e vice-prefeito [Renato Junior], resolveram culpar as vítimas ao invés de assumirem suas responsabilidades”, disse o advogado.

Prefeito justifica
Em um evento na manhã desta sexta-feira, 14, o prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), afirmou para o portal Radar Amazônico que essa é uma “ação da prefeitura” mas, pediu desculpas pela atitude dos agentes. “Peço desculpas. É o procedimento da prefeitura, portanto, eu preciso ordenar o Centro. Sabe quantas abordagens foram feitas? De segunda [feira] para cá? Mais de 60 abordagens. A gente tem conversado, a gente tem tentado ordenar o espaço público para que dessa forma a gente possa da condições para os lojistas e para os consumidores. Portanto, é dessa forma que a prefeitura age”, disse.
Em nota, a Prefeitura de Manaus justificou a agressão afirmando que “a insistência em violar as normas municipais resultariam em apreensão que apenas quem insistiu nas irregularidades foi alvo de apreensão”.
A CENARIUM solicitou informações da gestão municipal sobre como os feirantes que estão em situação irregular podem se regularizar. Até o fechamento desta reportagem, não houve retorno.