Especialistas comentam como alinhamento ideológico tem pautado as relações sociais

Desde as eleições de 2014 muitas pessoas têm cortado relações com amigos e familiares por questões políticas.(Juca Varella/Agência Brasil)

Carolina Givoni – Da Revista Cenarium

MANAUS – O espaço utilizado nas redes sociais ampliou a participação popular nos processos decisórios dentro dos três poderes da República, possibilitando o debate aberto sobre conceitos e maior alinhamento ideológico entre os vários espectros políticos. Por conta da inclusão digital, agora três em cada quatro brasileiros acessam a internet, equivalente a 134 milhões de pessoas, segundo informações da pesquisa TIC Domicílios 2019.

Desde as eleições de 2014 e do Impeachment da presidente Dilma Roussef (PT) em 2016, muitas pessoas têm cortado relações com amigos e familiares por questões políticas. É o caso de Clara Vinente, 28, executiva de vendas.

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“Percebemos que as pessoas têm ficado cada vez mais intolerantes e adotado discursos de ódio, como se fossem opiniões. Ninguém precisa defender cegamente um líder de Estado. Deixei de seguir amigos, parentes e conhecidos que concordam com absurdos ditos pelo presidente. Humanidade e empatia sempre devem estar presentes em qualquer debate”, explica.

Para o administrador de empresa Marcos Paulo, 39, o presidente tem sofrido boicotes, e precisar ser apoiado pela população que o elegeu.

“Ninguém vai admitir novamente um petista no poder. O Bolsonaro é diferente, um pouco polêmico, mas é um cara que preza pelos valores tradicionais. Ele precisa de apoio, pois é diariamente tripudiado. Ele ainda tem mais dois anos de mandato, vamos avalia-lo por completo. Eu acredito que muitas pessoas distorcem o que ele fala, para justamente criar manobras para ataques pessoas, e ele à altura responde”, defende.

Polarização

Segundo o cientista social e professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Gilson Gil, desde 1964, não se via uma polarização tão grande.

“Naquela época, o acirramento das posições diluiu o PSD, centro, e acabamos no golpe militar. Durante uns 40 anos, vivemos sob um certo ‘consenso democrático’, cuja maior prova é a constituição de 1988 e seu projeto cidadão de bem- estar social. Desde 2018, ou até antes, em 2016, vimos o centro se diluir no impedimento de Dilma, na posse de temer e no crescimento de Bolsonaro”, pondera.

Gil ainda afirma que os extremos devem manter a distinção de valores e ideias que tomaram o centro das redes sociais, levando a polarização para temáticas variados.

“A radicalização não diminuiu desde então, atingindo todas as áreas da sociedade e do cotidiano. Pelo nível dos debates políticos, que incluem acusações policiais e ofensas pessoais, não vejo que em curto prazo esse clima de animosidade diminuirá”, conclui.

Esquerda x Direita

Para compreender melhor os conceitos de esquerda e direita significam, o jornal Estado de São Paulo conversou com os cientistas políticos Claudio Couto, professor e coordenador do Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo; e Leonardo Avritzer, professor titular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Claudio Couto diz que essas distinções remontam à época Revolução Francesa. “Na assembleia Nacional, os que defendiam as mudanças e o fim das desigualdades entre nobres e plebeus sentavam à esquerda do presidente da Assembleia, e os que defendiam a manutenção das coisas como estavam e, consequentemente, a monarquia e a ordem estabelecida – que era de desigualdade entre estamentos – sentavam à direita. Daí surgiu essa terminologia, com a esquerda significando a defesa da igualdade e das ações necessárias para buscá-la, e a direita se opondo a isso”, detalha.

Couto ainda explica que a noção de esquerda e direita varia historicamente. “Certas origens, que se opunham liberais a conservadores ou reacionários; depois passou a opor socialistas a liberais e conservadores; depois, comunistas, socialistas e socialdemocratas a liberais, conservadores e fascistas, e assim por diante. Quem é de centro se situa a meio caminho entre essas posições, podendo também ser de centro-direita ou centro-esquerda, assim como há os de extrema-direita ou extrema-esquerda, ou os simplesmente de direita e esquerda”, compara.

Leonardo Avritzer declara que na política, pode se dizer que a esquerda está mais preocupada com alguns valores morais, especialmente ligados à proteção social, e tem menos problemas com um papel ativo do Estado do que a direita. “A direita, por outro lado, é mais conservadora em questões morais como, por exemplo, pena de morte, redução da maioridade penal. Estas questões são pautas da direita. Ao mesmo tempo, ela tem uma preocupação maior com o tipo de papel que o Estado pode ter na política”.

Quando cita o centro, Leonard dia que na verdade, é necessário pesquisar as nuances de cada temática para definir o referencial de cada pessoa. “Quando fazemos pesquisas, o que a gente tenta é perguntar para uma série de pessoas como elas se identificam e classifica numa tabela de um a dez. Quem fica no meio dessa classificação é de centro. Uma pessoa que a princípio é a favor da proteção social, mas menos a favor de um papel ativo do Estado, por exemplo”, finaliza.

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