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Espuma branca e densa toma conta de igarapé, em Manaus, e evidencia descaso
Ambientalista explica que espuma é formada devido a produtos químicos como detergentes e sabão em pó que são despejados por moradores das proximidades (Ricardo Oliveira/ Revista Cenarium)
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11 de novembro de 2020
Vinicius Leal – Da Revista Cenarium
MANAUS – Uma densa espuma branca vem tomando conta dos cursos d’água do igarapé do São Jorge, na Zona Centro-Oeste de Manaus, uma região que há dezenas de anos sofre com a poluição hídrica. Igarapé da Cachoeira Grande, como é conhecido, o local há muito tempo é um vetor de doenças e retrato de uma tragédia ambiental urbana e lenta, resultado do descuido da população e do poder público.
Vivendo com os dois netos, de 11 e 15 anos, há mais de 20 anos em uma palafita nas margens do igarapé, a empregada doméstica Maria das Graças da Silva, de 56 anos, natural de Boca do Acre, nunca viu limpo o Igarapé da Cachoeira. Quando ela chegou ao local para morar com o então marido na década 1990, tudo já era rodeado por lixo e entulho de todo tipo, de geladeira velha a garrafas PET.
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“Quando eu cheguei aqui, ele [igarapé] já estava contaminado, ninguém mais podia tomar banho”, lembra Maria das Graças. “Nasci na região do Purus, vim para Manaus com 11 anos. Fui mandada para cá por uma tia de consideração para ajudar ela, voltei a minha cidade e já com meu marido vim morar aqui no São Jorge, onde criei meus dois filhos. Apesar da sujeira, eu gosto daqui, por estar perto da natureza. Queria tanto que fosse limpo”.
A espuma branca que vem tomando conta da superfície do igarapé não é mais novidade. “Essa espuma aí eu não sei de onde é, se são dos apartamentos, mas tudo cai aí. As pessoas não têm coragem de pegar seu lixo e levar lá para cima, jogam tudo na água. Eu não, eu tenho meu cestinho onde acumulo meu lixo e depois vou lá em cima jogar”, lamenta Maria das Graças.
Seca dos rios expõe sujeira
Atualmente com volume baixo d’água devido ao período de seca do rio Negro, afluente de Manaus, a aparência de sujeira é ainda maior nos arredores do Igarapé da Cachoeira Grande. Além da espuma, se vê de tudo um pouco. Entretanto, o cenário é perfeito para a rotina do catador de lixo Márcio Fernandes*, de 30 anos, natural de Tefé.
Diariamente ele percorre os beiradões do igarapé do São Jorge, de ponta a ponta, recolhendo pedaços de ferro e latas para revender e conseguir dinheiro para sustentar ele e o pai idoso, que também moram numa palafita na região. A espuma e o lixo não o surpreendem. “Já vi tanta coisa aqui, tanto lixo. É comum toda essa sujeira”, disse.
Atualmente no Brasil, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 5.127.747 domicílios estão localizados em regiões como as palafitas ao redor do Igarapé do São Jorge, os chamados “aglomerados subnormais”, ocupações irregulares que incluem também favelas, invasões e loteamentos e com moradores vivendo com carência de serviços públicos e falta de saneamento.
Espuma advém de detergentes
Borbulhante e tóxica, a espuma branca no igarapé do São Jorge é resultado da poluição hídrica advinda da grande concentração de esgotos domésticos e industriais. “Em rios muito poluídos, as espumas se formam pela quantidade excessiva de detergentes, produtos químicos e outras substâncias como sabão em pó e produtos de limpeza”, explica o geógrafo e ambientalista Carlos Durigan.
E é justamente no período de seca dos rios que o trabalho de limpeza dos cursos d’água na cidade é intensificado. De janeiro a agosto deste ano, os agentes da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (Semulsp) retiraram 7.914 toneladas de resíduos de 107 igarapés, córregos, praias e orlas dos rios, ao custo de R$ 1,5 milhão por mês, segundo a Prefeitura de Manaus. Balsas, retroescavadeiras, botes, rede de contenção e trabalho manual fazem parte das atividades.
Atualmente seco, o nível das águas dos rios e igarapés de Manaus vai começar a subir a partir de dezembro, com ápice entre abril e junho, outro problema fará parte da rotina dos moradores das palafitas do Igarapé do São Jorge: os alagamentos. “É quando eu fico apreensiva com medo da água chegar no assoalho e eu não tenho para onde ir. O odor fica insuportável e aparecem cobras e jacarés”, lamenta a doméstica Maria das Graças.
(*) Nome fictício para preservar a identidade da fonte
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