‘Estou apreensivo, mas não vou parar’, diz fotojornalista ameaçado por divulgar queimadas no AM

O fotojornalista Edmar Barros (Reprodução/ Sandro Pereira)

Priscilla Peixoto – Da Cenarium

MANAUS (AM) – “Estou apreensivo, mas medo mesmo eu não tenho e não vou deixar de fazer as coisas por causa disso”. Esse é o sentimento que o fotojornalista Edmar Barros compartilhou com a CENARIUM sobre a ameaça de morte que recebeu, na última segunda-feira, 23, ao divulgar imagens de queimadas que estavam acontecendo no município de Lábrea, no Sul do Amazonas.

“É muito triste você ser ameaçado porque está fazendo um trabalho que mostra a verdade. Um país onde a gente não tem garantia se vai continuar fazendo o nosso trabalho”, pontuou ainda. Após a mensagem recebida via WhatsApp, Edmar divulgou o print do conteúdo nas redes sociais e logo o caso ganhou repercussão nacional.

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“Eu nem queria que essa repercussão fosse em relação a mim, claro que essa ameaça tem que ser investigada, divulgada amplamente. Mas eu queria mesmo é que repercutisse o que está acontecendo no Sul do Amazonas, uma situação deplorável. Hoje, Lábrea é a cidade do Brasil que mais tem queimadas”, ressalta o profissional.

Com um trabalho intenso de dez dias na região de Lábrea, Edmar e seu parceiro de trabalho Sandro Pereira percorreram o total de 2.400 quilômetros registrando a realidade do lugar. Segundo Edmar, durante estadia no município, não constataram nenhum órgão de fiscalização no local. “Posso dizer, com propriedade, que não vimos durante todo o quilômetro percorrido e tempo que estivemos lá nenhum fiscal ambiental, bombeiro, brigadista muito menos um policial federal, absolutamente nada. Uma oportunidade pra desmatador tacar fogo na BR-319 inteira”, revela o fotojornalista.

Ameaça recebida pelo fotojornalista, na segunda-feira, 23, por meio de um aplicativo de mensagem (Reprodução/Whatsapp)

Repúdio

Além dos colegas de profissão, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) publicou nota condenando a tentativa de intimidação do fotojornalista e solicitou que a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas e o governador Wilson Lima (PSC) garantam a investigação dos fatos. Esse é o terceiro caso de algum tipo de violência ou intimidação contra jornalistas no Amazonas nos últimos dois meses. No final de junho e no começo de julho, a Abraji denunciou agressões a profissionais da Rede Amazônica”, informou o texto.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Amazonas (SJP/AM) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) também se pronunciaram sobre o caso e pediram que os responsáveis sejam identificados e punidos. Os órgãos finalizaram expressando solidariedade e apoio ao profissional. À Barros nossa Solidariedade e apoio (inclusive jurídico) por honrar a profissão que escolheu no difícil e perigoso ofício de revelar por imagens a verdade à sociedade”, finaliza.

Notas de repúdio ao ocorrido com o fotojornalista (Reprodução/ internet)

“Infantaria do jornalismo”

O profissional reconhece que os trabalhos voltados às temáticas de desmatamento e queimadas oferecem perigo para aqueles que abordam e denunciam problema. Pela experiência obtida ao longos dos anos de profissão, Edmar toma medidas de segurança.

“Eu sempre digo que o fotojornalismo é a infantaria do jornalismo, pois é ele quem chega primeiro, mostra imagens e, por meio daquela imagem, textos são desenvolvidos, ainda que a imagem fale por si. É um trabalho genuinamente perigoso, principalmente para os que fazem o trabalho na essência e lidar com essas questões é mais perigoso, porque aí tem os grileiros, madeireiros, garimpeiros, fazendeiros e muitos não são da região, vêm de outros Estados para cometer crimes”, explica.

Queimadas

Lábrea teve o maior número de focos de queimadas entre os dias 1º de janeiro e 8 de agosto de 2021, segundo dados disponibilizados pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), do Amazonas. Em conjunto, é possível identificar também o município de Apuí como um dos locais com mais focos de calor. Lábrea acumula 761 focos, enquanto Apuí, o segundo município no ranking, acumulava 736, de acordo com boletim divulgado pela secretaria no último dia 10.

No total, foram registrados 3.223 focos de queimadas em todo o Amazonas. Mas apesar do número ser alto, ele ainda é menor que o registrado no mesmo período em 2020, quando foram 5.250 focos de incêndios. Entre os Estado da Amazônia Legal, a queda do Amazonas foi de 38,6%, sendo a maior entre os nove Estados.

Queimadas no município de Lábrea, no Amazonas (Reprodução/ Edmar Barros)

Sobre Edmar Barros

Nascido em Lábrea, a 701 quilômetros de distância de Manaus, Edmar Barros, 45 anos, se mudou para Manaus ainda criança. Interessado pelo mundo da fotografia, se dedicou aos estudos fotográficos, fez curso no Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) voltado para área. Com 18 anos atuando como fotojornalista, o amazonense defende a preservação da liberdade profissional. Por este motivo, não possui vínculos empregatícios com nenhum veículo de comunicação.

Como freelancer, ele produz materiais para agências de notícias nacionais, como o Estadão e Folha de São Paulo, e já participou de grandes coberturas como Copa do Mundo, Olimpíadas e ainda cobriu tragédias como o Massacre do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em 2017, e a tragédia de Brumadinho, em 2019.

Em relação à cobertura das queimadas no Sul do Amazonas, este é o terceiro ano que Edmar registra a situação crítica do lugar. “Nunca tinha acontecido esse problema de ameaça em relação aos meus trabalhos cobrindo o desmatamento, sempre vou para Lábrea, nasci lá, inclusive. Já sofri outros tipos de ameaças em outras situações, mas de morte é a primeira vez. Mesmo assim é uma cidade que gosto de estar, pois encontro minhas raízes, é uma pena ela está nesta situação”, lamenta o fotojornalista.

Confira as notas de repúdio na íntegra:

Abraji repudia ameaça de morte a repórter fotográfico do Amazonas


Na noite de segunda-feira (23.ago.2021), o repórter fotográfico Edmar Barros, que trabalha para vários veículos do País e do exterior como freelancer para questões que envolvem a Amazônia, foi ameaçado de morte.

Edmar Barros tinha voltado de uma viagem pelo Sul do Amazonas, onde registrou áreas de queimadas, quando recebeu uma mensagem pelo celular afirmando que poderia ser assassinado se continuasse cobrindo os crimes ambientais. A intimidação veio de um número desconhecido: “Você vai queimar junto com as queimadas…vai virar churrasquinho”. Tais ameaças, além de consideradas crimes pelo Código Penal Brasileiro, violam a liberdade de expressão e restringem o direito de acesso à informação de toda a sociedade.

O jornalista afirma que constatou a ausência de autoridades (bombeiros, fiscais e forças de segurança) em áreas devastadas pelo fogo, especialmente no entorno das BRs 319 e 230 (Transamazônica), entre Humaitá e Lábrea, regiões entre as que mais registram queimadas no Brasil. Edmar viajou 2.400 quilômetros durante dez dias, ao lado de outro colega de profissão, para reportar o desmatamento e os incêndios.

A Abraji condena a tentativa de intimidação do fotojornalista e solicita que a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas e o governador Wilson Lima (PSC) garantam a devida investigação dos fatos, assim como condições seguras para o exercício da profissão no Estado.

O caso de Edmar Barros será informado às organizações internacionais com as quais a Abraji atua para que a ameaça de morte seja monitorada pelos organismos independentes. Esse é o terceiro caso de algum tipo de violência ou intimidação contra jornalistas no Amazonas nos últimos dois meses. No final de junho e no começo de julho, a Abraji denunciou agressões a profissionais da Rede Amazônica.

Diretoria da Abraji, 25 de agosto de 2021

Sindicato dos Jornalistas do AM e Fenaj repudiam ameaça a repórter-fotográfico

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Amazonas (SJP/AM) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), preocupados com a crescente onda de violência contra os jornalistas no exercício da atividade laboral, vem publicamente denunciar a ameaça de morte contra o repórter-fotográfico, Edmar Barros.

Conforme material publicado nas mídias sociais, a ameaça ainda sem autoria e realizada por meio de mensagem de aplicativo, ocorreu após divulgação das imagens de queimadas nas matas à margem da rodovia Transamazônica, Km 42 (BR 230) no município de Lábrea, distante 702 Km, a sudoeste da capital do Amazonas, Manaus.

Sabemos que pela postura do profissional, ele não se deixará intimidar e, manterá seu trabalho profissional reconhecido nacional e internacionalmente pelas agências de jornalismo no mundo, colegas de profissão e o público.

Cabe a nós, como representantes dos jornalistas brasileiros, denunciar o fato às autoridades de segurança do Estado do Amazonas a fim de ser garantido o trabalho de Edmar Barros e de todos os profissionais da comunicação envolvidos na atividade jornalística de registrar, por imagens e textos, o crescente e criminoso desmatamento que a cada ano ocorre em toda a Amazônia, sem que as autoridades, principalmente o governo federal, identifique os responsáveis para que possam ser punidos com base a legislação do setor. À Barros nossa Solidariedade e apoio (inclusive jurídico) por honrar a profissão que escolheu no difícil e perigoso ofício de revelar por imagens a verdade à sociedade.

Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Amazonas – SJP/AM
Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj

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