Estudante processa universidade após perda de vaga em Direito por critério de cor


01 de março de 2024
Estudante processa universidade após perda de vaga em Direito por critério de cor
Glauco Dalalio do Livramento, 17, perdeu a vaga na Faculdade de Direito da USP por não ser considerado pardo - (Leitor)
Da Revista Cenarium*

MANAUS – Um estudante aprovado por cotas raciais na Faculdade de Direito da USP entrou com uma ação judicial contra a universidade após perder a vaga por não ter sido considerado pardo. A defesa do adolescente argumenta que o procedimento de averiguação feito pela instituição é inconstitucional.

Glauco Dalalio do Livramento, 17, foi aprovado em primeira chamada pelo Provão Paulista, vestibular criado no ano passado exclusivamente para alunos da rede pública e que distribuiu 1.500 vagas da USP. O jovem concorreu pela reserva de vagas para candidatos egressos da rede pública e autodeclarados PPIs (pretos, pardos e indígenas).

O adolescente se declarou pardo, mas a comissão de heteroidentificação da USP discordou da autodeclaração. Depois de avaliarem uma fotografia e fazerem um encontro virtual de cerca de um minuto com o candidato, os integrantes da comissão decidiram que ele não pode ser considerado pardo.

“O candidato tem pele clara, boca e lábios afilados, cabelos lisos, não apresentando o conjunto de características fenotípicas de pessoa negra”, diz o parecer da comissão.

Este é mais um caso neste ano de candidato aprovado por cotas raciais em curso concorrido da USP que teve a autodeclaração de pardo rejeitada pela instituição. Conforme mostrou a Folha, um estudante teve a matrícula cancelada no curso de medicina no primeiro dia de aula.

Nas duas situações, os estudantes foram classificados pelo Provão Paulista. A USP definiu que candidatos selecionados por essa prova teriam a autodeclaração racial aferida de forma virtual. Já no caso dos aprovados pela Fuvest, vestibular próprio da universidade, a averiguação é feita presencialmente.

“Não há dúvidas de que a oitiva virtual prejudica o candidato que tem sua autodeclaração não confirmada, pois presencialmente os membros da comissão têm a real possibilidade de averiguar os aspectos fenotípicos que o tornam apto à vaga reservada pelas cotas raciais”, argumenta.

Questionada sobre o motivo de não garantir a avaliação presencial para todos os candidatos, a USP disse que “isso demandaria um calendário de bancas de heteroidentificação incompatível com o calendário dos vestibulares do Enem, das universidades paulistas e do Provão Paulista.”

Também defendeu que a averiguação online ocorre para evitar prejuízos a candidatos de fora de São Paulo. “Teríamos muitos candidatos viajando para São Paulo sem matrícula efetivada e sem uma resposta definitiva das bancas de heteroidentificação, o que acarretaria prejuízo para os candidatos”, disse em nota.

Primeiro da família a ser aprovado em uma universidade pública, Glauco diz acreditar que, se tivesse sido avaliado presencialmente, não teria tido a sua autodeclaração questionada.

“Ficamos tão felizes com a aprovação. Foi uma conquista dele, mas também foi uma conquista da nossa família, de toda a escola em que ele estudou. Nunca nos preocupamos com a possibilidade de a cor dele ser questionada”, conta Pamella Dalalio, 38, mãe do adolescente.

Glauco é de Bauru, no interior paulista, e sua aprovação na Faculdade de Direito, uma das mais tradicionais do país, virou notícia nos jornais da cidade. “As pessoas reconheciam ele na rua e vinham dar parabéns”, conta a mãe.

Segundo ela, a família sempre considerou o menino como sendo pardo. “Eu tenho a pele mais clara, mas meu marido, o pai do Glauco, tem a pele escura e traços característicos negros. Nunca houve nenhuma dúvida sobre a cor do nosso filho.”

Em nota, a USP informou que a análise de autodeclaração é “estritamente fenotípica”, ou seja, só são avaliados a “cor da pele, os cabelos e a forma da boca e do nariz” dos candidatos.

Também defendeu que o formato diferente utilizado para averiguar a autodeclaração dos candidatos não fere a isonomia do processo. “Nas versões virtuais, a banca de heteroidentificação toma todo o cuidado para que a visualização das características fenotípicas seja feita de maneira adequada, pedindo, por exemplo, para que os candidatos mudem a posição do corpo e procurem lugares com melhor iluminação. Tudo para garantir a isonomia da oitiva”, disse em nota.

Como é a análise na USP e na Unicamp?

Nas outras duas universidades estaduais paulistas, Unesp e Unicamp, o processo de averiguação das comissões de heteroidentificação é o mesmo para todos os candidatos independentemente do processo seletivo do qual participaram.

Na Unesp, um estudante só tem sua autodeclaração rejeitada após uma análise presencial.

Já na Unicamp, desde a pandemia, o processo de todos os candidatos é feito a distância, com análise de fotografia e, se necessário, com avaliação por vídeo.

(*) Com informações da Agência Brasil

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