Estudo aponta presença de variante do coronavírus já em novembro em Manaus

Esses são os principais achados de um artigo publicado na última quarta-feira, 14, na revista Science (Clevis Massolla/Folhapress)

Com informações da Folha de S. Paulo

SÃO PAULO – A variante do coronavírus primeiramente identificada em Manaus, chamada de P.1, surgiu já em novembro de 2020, cerca de um mês antes do aumento expressivo de novos casos e óbitos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Srag) naquela cidade, que se deu a partir de dezembro.

Além disso, a variante é cerca de 1,7 a 2,4 vezes mais transmissível e evoluiu rapidamente na cidade, onde conseguiu encontrar um ambiente promissor em uma população com alta prevalência de anticorpos contra a forma original do coronavírus e que não eram eficazes na proteção contra a nova cepa.

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Esses são os principais achados de um artigo publicado na última quarta-feira, 14, na revista Science. A pesquisa é fruto de uma parceria Brasil-Reino Unido, o projeto Centro de Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (Cadde), coordenado, por aqui, pela pesquisadora Ester Sabino e, no Imperial College de Londres, por Nuno Faria, também pesquisador.

A caracterização da P.1 e seu potencial mais transmissível já haviam sido reportados previamente, mas o estudo traz nova luz quanto à origem da nova variante do Sars-CoV-2: em meados de novembro de 2020, o novo ramo divergiu da linhagem ancestral, a B.1.1.28, e passou a evoluir em uma taxa veloz, adquirindo 17 mutações únicas, sendo dez delas na proteína S do Spike (a espícula usada pelo coronavírus para entrar nas células).

Como essa evolução se deu muito rapidamente, a alta de casos de Srag já em dezembro de 2020 era um sinal de que havia algo estranho, uma vez que um estudo publicado naquele mesmo mês havia apontado uma taxa de infecção na cidade de Manaus de mais de três quartos da população (76%).

Com o sequenciamento de 184 amostras coletadas entre novembro e dezembro na capital amazonense, os pesquisadores conseguiram construir uma linha do tempo evolutiva com base em uma metodologia chamada relógio molecular: o ponto zero da mutação pode ser definido a partir do conhecimento da taxa evolutiva da linhagem, isto é, quantas vezes aquela mesma variante sofreu mutações em um determinado período.

Assim, a data, ainda que não seja possível cravar um dia exato (os pesquisadores afirmam ser por volta do dia 15 de novembro), coincide com o achado de outros estudos similares, como o da Fiocruz Amazônia, liderado pelo pesquisador Felipe Naveca, que encontrou amostras da variante datadas de dezembro de 2020 em uma análise realizada no início de janeiro.

Para analisar o potencial epidemiológico da nova variante, isto é, sua capacidade de causar uma infecção mais potente e maior transmissão, os pesquisadores fizeram modelagens matemáticas com a variante P.1 e uma forma “não P.1”.

Diferentemente da forma ancestral do vírus, em que cada indivíduo infectado pode transmitir o vírus para uma outra pessoa (na média), uma pessoa carregando a variante P.1 em seu organismo pode infectar de 1,7 a 2,4 pessoas.

“Ou seja, é o dobro, quase o triplo. Em termos de saúde pública, estamos essencialmente frente a uma variante que se espalha mais rapidamente e, possivelmente, não temos ainda certeza, causa uma infecção por um período mais longo”, explica Faria.

Ainda, de acordo com os resultados, a P.1 pode também causar reinfecção em duas pessoas e meia a cada cinco (cenário menos conservador) ou uma em cada cinco pessoas (cenário mais conservador), indicando que de 80% a 54% da população que já teve Covid tem proteção contra a nova forma.

“Em outras palavras, 21% a 46% dos casos da segunda onda em Manaus podem ter sido de reinfecções com a variante P.1. Mas esses dados precisam ainda de confirmação”, diz.

Uma das hipóteses levantadas para tentar explicar a evolução rápida da linhagem é sua capacidade de fugir dos anticorpos neutralizantes produzidos contra a forma original do vírus, o que condiz com os modelos matemáticos de reinfecção descritos acima. O pesquisador frisa, no entanto, que o intervalo de confiança desses dados é grande, e é mais provável que o cenário real esteja próximo dos 21% de reinfecção.

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